RÉGIS BONVICINO
O voto é facultativo aos adolescentes de 16 a 17 anos, uma das maiores conquistas da incipiente democracia brasileira
Juscelino não conseguiu fazer seu sucessor e Jânio Quadros elegeu-se, renunciando meses depois, o que levou ao poder seu vice-presidente, João Goulart. Alvo antigo da direita brasileira, Jango teve dificuldades para assumir. Nesse interregno, viveu-se um período parlamentarista, sob Tancredo Neves. Todavia, pouco depois, passaria a governar com plenos poderes, o que "agregou" os Estados Unidos, preocupados com Fidel Castro (1959 no poder em Cuba), e a direita brasileira para desfechar um golpe, em 31 de março de 1964, com a implantação de uma ditadura militar que, na verdade, terminaria apenas com a eleição de Fernando Collor de Mello, em 1989, quando, aos 34 anos, fui votar pela primeira vez para presidente da República.
Lembro-me, como se fosse hoje, do ato institucional número 5, de 13 de dezembro de 1968, "medida" que veio em resposta a um discurso do deputado Moreira Alves, que pedia ao povo brasileiro que boicotasse o 7 de Setembro. O AI-5 fechou o Congresso, cassou mandatos de senadores, deputados, prefeitos e governadores, interveio no Judiciário, cassando ministros do STF, como Evandro Lins e Silva, e implantou a censura nos meios de comunicação e nas artes.
Votei pela primeira vez na vida para deputado federal e estadual, em 1974, no primeiro ano da faculdade. Ulysses Guimarães (MDB), naquele ano, fez sua memorável anticampanha para a Presidência da República, como protesto contra a ditadura. Naquela época, governadores, prefeitos de capital e de cidades "segurança nacional" eram indicados pelos ditadores. Para senador, votei no MDB, contra o arenista Carvalho Pinto, em 1978.
Para governador, votei em Franco Montoro, em 1982, que nomeou Mário Covas para prefeito de São Paulo. Antes disso, acompanhei toda a guerrilha de esquerda contra os militares, a tortura, os presos políticos e os exílios. E a volta dos exilados, muitos deles mais interessados em poder e dinheiro do que em democracia, até hoje.
Vi Fernando Henrique -o político mais preparado da história recente do Brasil (PMDB então)- perder a primeira eleição direta para prefeito de São Paulo para Jânio Quadros, em 1985. Simultaneamente, participei da campanha Diretas-Já, em 1984/85, que, todavia, levou ao poder um dos mais arcaicos políticos desse país: José Sarney. O artigo 14 da Constituição regula os direitos políticos. O voto é facultativo aos adolescentes de 16 a 17 anos.
Essa foi uma das maiores conquistas da incipiente democracia brasileira porque institui uma espécie de treinamento para a cidadania num país que passou quase metade do século 20 sob ditaduras.
Qual é esse treinamento para a cidadania? Respondo, com Celso Lafer: "A vida moral e a vida do poder dão a impressão de correr paralelas, com raras convergências. Esse desencontro entre a ética e a política incomoda e indigna a todos que querem ver e sentir a presença de virtudes na condução dos negócios públicos, e não a mentira".
Por isso, reproduzi aos estudantes dos vários colégios que percorri em meu território eleitoral fazendo palestras o cartum de El Roto, do jornal espanhol "El País": "mejor que cronometrar el tiempo, que les midan las mentiras!" (melhor que cronometrar o tempo, que meçam suas mentiras).
Cabe, portanto, aos eleitores de 16 e 17 anos alistarem-se e passarem a exercer o seu espírito crítico em relação aos políticos, medindo suas mentiras, aferindo o que propõem de consistente, para substituir o marketing pelo debate, para que a vida moral e a do poder sigam em convergência, e não em divergência - como agora.
É para isso que os chamo: medir, rigorosamente, as mentiras, para que as verdades possam vir à tona - cooperando para diminuir o "risco rua" e projetando um país mais igual, de verdade, para um futuro próximo.
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