30 março 2008

O JOVEM ELEITOR

RÉGIS BONVICINO

O voto é facultativo aos adolescentes de 16 a 17 anos, uma das maiores conquistas da incipiente democracia brasileira

Em 1955 , quando nasci em fevereiro, o Brasil teve cinco presidentes da República: Café Filho, que assumiu depois do suicídio de Getúlio Vargas, em 24 de agosto de 1954, Carlos Luz, em virtude do infarto sofrido por Filho, o golpista general Lott, Nereu Ramos e o eleito Juscelino Kubitschek, que, ao tomar posse, em 1956, construiu Brasília, símbolo de um Brasil "moderno", aberto ao capital internacional, sob um ciclo favorável da economia.
Juscelino não conseguiu fazer seu sucessor e Jânio Quadros elegeu-se, renunciando meses depois, o que levou ao poder seu vice-presidente, João Goulart. Alvo antigo da direita brasileira, Jango teve dificuldades para assumir. Nesse interregno, viveu-se um período parlamentarista, sob Tancredo Neves. Todavia, pouco depois, passaria a governar com plenos poderes, o que "agregou" os Estados Unidos, preocupados com Fidel Castro (1959 no poder em Cuba), e a direita brasileira para desfechar um golpe, em 31 de março de 1964, com a implantação de uma ditadura militar que, na verdade, terminaria apenas com a eleição de Fernando Collor de Mello, em 1989, quando, aos 34 anos, fui votar pela primeira vez para presidente da República.
Lembro-me, como se fosse hoje, do ato institucional número 5, de 13 de dezembro de 1968, "medida" que veio em resposta a um discurso do deputado Moreira Alves, que pedia ao povo brasileiro que boicotasse o 7 de Setembro. O AI-5 fechou o Congresso, cassou mandatos de senadores, deputados, prefeitos e governadores, interveio no Judiciário, cassando ministros do STF, como Evandro Lins e Silva, e implantou a censura nos meios de comunicação e nas artes.
Votei pela primeira vez na vida para deputado federal e estadual, em 1974, no primeiro ano da faculdade. Ulysses Guimarães (MDB), naquele ano, fez sua memorável anticampanha para a Presidência da República, como protesto contra a ditadura. Naquela época, governadores, prefeitos de capital e de cidades "segurança nacional" eram indicados pelos ditadores. Para senador, votei no MDB, contra o arenista Carvalho Pinto, em 1978.
Para governador, votei em Franco Montoro, em 1982, que nomeou Mário Covas para prefeito de São Paulo. Antes disso, acompanhei toda a guerrilha de esquerda contra os militares, a tortura, os presos políticos e os exílios. E a volta dos exilados, muitos deles mais interessados em poder e dinheiro do que em democracia, até hoje.
Vi Fernando Henrique -o político mais preparado da história recente do Brasil (PMDB então)- perder a primeira eleição direta para prefeito de São Paulo para Jânio Quadros, em 1985. Simultaneamente, participei da campanha Diretas-Já, em 1984/85, que, todavia, levou ao poder um dos mais arcaicos políticos desse país: José Sarney. O artigo 14 da Constituição regula os direitos políticos. O voto é facultativo aos adolescentes de 16 a 17 anos.
Essa foi uma das maiores conquistas da incipiente democracia brasileira porque institui uma espécie de treinamento para a cidadania num país que passou quase metade do século 20 sob ditaduras.
Qual é esse treinamento para a cidadania? Respondo, com Celso Lafer: "A vida moral e a vida do poder dão a impressão de correr paralelas, com raras convergências. Esse desencontro entre a ética e a política incomoda e indigna a todos que querem ver e sentir a presença de virtudes na condução dos negócios públicos, e não a mentira".
Por isso, reproduzi aos estudantes dos vários colégios que percorri em meu território eleitoral fazendo palestras o cartum de El Roto, do jornal espanhol "El País": "mejor que cronometrar el tiempo, que les midan las mentiras!" (melhor que cronometrar o tempo, que meçam suas mentiras).
Cabe, portanto, aos eleitores de 16 e 17 anos alistarem-se e passarem a exercer o seu espírito crítico em relação aos políticos, medindo suas mentiras, aferindo o que propõem de consistente, para substituir o marketing pelo debate, para que a vida moral e a do poder sigam em convergência, e não em divergência - como agora.
É para isso que os chamo: medir, rigorosamente, as mentiras, para que as verdades possam vir à tona - cooperando para diminuir o "risco rua" e projetando um país mais igual, de verdade, para um futuro próximo.

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