JANIO DE FREITAS
Não é o PAC que é eleitoreiro por si só; eleitoreiro sim, agressivamente eleitoreiro, é o uso que Lula faz do PAC
A razão que Lula pode ter ao dizer-se "indignado" com as "acusações de que o PAC é eleitoreiro" ("cretinices verbais", na sua versão de polidez verbal) devem-se a uma distorção da crítica oposicionista e do comentarismo jornalístico. Não é o Programa de Aceleração do Crescimento, conjunto de obras convenientes, umas, e discutíveis outras, que é eleitoreiro, por si só. Eleitoreiro sim, agressivamente eleitoreiro, é o uso que Lula faz do PAC. E eleitoreiro é só um dos aspectos, talvez o menos grave, do uso que Lula faz do seu tempo útil, no cotidiano presidencial, e dos recursos de governo para desenvolver sua propaganda personalista, a imagem de um-pai-pátria.
Essa atividade não-presidencial, por seu agudo sentido antidemocrático e pelo acinte irrefreado de sua prática, é o grande, o maior escândalo do governo Lula. Sem, no entanto, constituir escândalo propriamente, por um composto de fatores em que os políticos oposicionistas, a imprensa, a TV, o rádio e representações civis, com realce para a OAB, não ficam bem. Estamos todos vendo, sem enxergar, ou sem querer fazê-lo, um processo bem conhecido.
Lula deu ontem uma demonstração completa do uso que faz do PAC, já sem resistir até a explicitar a exploração também eleitoreira do programa. Era só o discurso de lançamento do PAC em Recife, mas assim: "Nós vamos fazer o sucessor" (implicitamente, na Presidência, no governo de Pernambuco e na Prefeitura de Recife), "apenas fazendo discurso não vão nos derrotar, têm que trabalhar mais do que nós", "a oposição pode tirar o cavalinho chuva", e por aí foi. Com a disposição sintetizada no discurso, não será proveitoso duvidar da previsão de Lula, mas seria inteligente refletir sobre o que subjaz a ela.
Lula não faltou, é claro, com o culto a si mesmo. A comparação do seu vitorioso governo com os inúteis 500 anos precedentes, a liderança econômica a que seu governo levará o Brasil no mundo, até o pagamento ao FMI entrou, para o entendimento nebuloso do comício nordestino, no rol dos seus feitos. Tudo, é claro, como único caso histórico de governo para os pobres.
Lula, PAC, Recife: mais um eco dos discursos de todos os dias, cada vez menos objetos das atenções que merecem cada vez mais. Ao menos para observação dos efeitos presentes na advertência de que as repetições, de verdades ou não, são como perfuratrizes. Só o próprio Lula, porém, parece estar atento para tais aspectos de suas possíveis condutas e palavras, como portadoras de mensagens.
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