05 março 2008

INGRID E GLORIA

JOSÉ SARNEY

Pobres mulheres estas - Gloria, Ingrid, Consuelo e Clara -, cujos destinos foram atravessados pela crueldade do terrorismo. Passaram anos na selva, presas entre seus algozes, deixando um rastro de saudades e de amarguras que vão desde a viuvez no exílio aos maridos assassinados, filhos seqüestrados e famílias com o cotidiano das incertezas sobre a vida, o estado de saúde e o tratamento dos guerrilheiros com os seqüestrados. Inserir esses fatos como parte de um estilo normal do jogo político é atribuir valores a um simples exercício do terrorismo. É, no mínimo, uma velada solidariedade com esse modo de tortura.
Vejamos a história de Gloria Polanco, ontem solta. Foi seqüestrada com seus filhos. Os seqüestradores pediram resgate para soltar os filhos, que estiveram dois anos na selva em sua companhia. Ela concorda em pedir ao marido para pagar pela liberdade dos filhos. Estes foram soltos, mas outro preço de sua liberdade foi a vida do seu pai, assassinado pelos guerrilheiros. Ela agora é solta e traz na alma os seis anos de solidão e maus-tratos, doenças e humilhações. Reencontra a liberdade e o espaço vazio do esposo morto.
Infelicidade mais dolorosa e prolongada está reservada para Ingrid Betancourt. Por ter dupla nacionalidade, é moeda de troca mais valiosa. A França, sua segunda terra, entra no movimento de sua liberdade, e não se sabe se será para o bem ou para o mal. Disso valem-se os guerrilheiros para visibilidade mundial, e a pobre Ingrid, francesa e colombiana, sofre nas e pelas duas pátrias. Seu retrato é a própria expressão da dor, esquálida, lágrimas de olhos que já estão secos, olhar baixo e distante, como se não restasse esperança. Agora, os companheiros de infortúnio trazem a notícia de que seu corpo não tem mais tempo de esperar a liberdade. Ele se despede de suas forças, destruídas pela doença que lentamente lhe consome os dias.
"Ah! se tivéssemos nos homens o coração de Cristo" - como dizia o padre Antônio Vieira. Por todos os meios, devemos manifestar nossa condenação, nosso irrestrito repúdio à violência, que não pode ser justificada por nada, muito menos por confusas motivações ideológicas misturadas com cocaína. Qual a ideologia e os ideais das Farc? A violência pela violência.
Na próxima semana, comemoraremos o Dia Internacional da Mulher. Não precisamos buscar exemplos no passado para nossa solidariedade com elas. Basta o de Ingrid Betancourt, a mater dolorosa que não tem nem o menino no colo, porque os filhos, que eram pequenos no início do seu cativeiro, hoje são jovens adultos que choram, como todos nós, pelo destino de sua mãe.


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Emociona... um belo artigo.

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