CARLOS HEITOR CONY
Apareceu mais um cidadão que tomou parte no esquema do regime militar, declarando ter participado da chacina promovida contra os guerrilheiros na região do Araguaia. O ex-soldado está disposto a contar o que sabe. Os episódios ligados à subversão e à repressão continuam como um quebra-cabeça e, embora haja pressão nacional pela liberação dos arquivos relativos àquele período abominável de nossa história, nenhum governo até agora teve coragem de abrir a sua caixa-preta.
Apesar do relativo consenso sobre a anistia, que deve funcionar para os dois lados, o temor de um revanchismo contra os militares não pode justificar o silêncio oficial sobre o que realmente aconteceu nos anos de chumbo. Os mais exaltados aderem à tese segundo a qual os crimes da ditadura não podem ser prescritos - o que é uma bobagem. Não mais se trata de punir quem quer seja, mesmo os que mataram ou torturaram nos dois lados da luta armada.
O problema não é policial nem mesmo político, mas histórico. Só para dar um exemplo: na passagem de 20 para 21 de agosto de 1976, na Casa da Manchete, em São Paulo, onde JK e eu estávamos hospedados, a conversa que varou a noite foi um desabafo do ex-presidente, que vivia um momento tenso em sua vida doméstica. Dias antes, correra a notícia de que ele morrera num acidente de carro na estrada que liga Luziânia a Brasília, fato que realmente aconteceria no dia seguinte, na Rio-São Paulo.
Aos 74 anos, JK pressentia que teria poucos anos de vida, e seu maior desejo era ter revelados os depoimentos que dera na Polícia Militar (RJ) quando regressou do seu primeiro exílio, em 1965. Na opinião dele, foi uma das maiores contribuições que tivera a oportunidade de dar à história de seu tempo.
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