Editorial da Folha de S. Paulo
No conto fantástico em que se converteu a promessa das Farc de libertar três reféns, é bom esclarecer em que lado atuam os protagonistas. O papel do delinqüente responsável pela farsa é exclusivo da guerrilha colombiana.
O grupo que se esconde na Amazônia é um raro remanescente da esquerda armada latino-americana que não abriu mão da violência. As Farc seriam apenas um fóssil ideológico da Guerra Fria se não houvessem migrado para a criminalidade organizada. O seqüestro e a venda de proteção ao narcotráfico se tornaram seu principal negócio.
Não merecem crédito criminosos que mantêm 750 pessoas cativas, muitas por vários anos, sujeitas ao arbítrio e à violência cotidiana de seus captores e às intempéries da floresta; facínoras que, copiando uma prática atroz da ditadura argentina, arrancaram de uma refém o filho recém-nascido, concebido não se sabe em que condições e gravemente enfermo.
As Farc, contudo, detêm o poder típico dos seqüestradores -o de dispor sobre a vida e a morte de inocentes. Qualquer governo teria se preparado para receber três reféns após promessa de libertação. Um presidente mais maduro e responsável que Hugo Chávez, decerto, teria feito todos os gestos protocolares para prestigiar a soberania da Colômbia nesse tema e submeter-se a ela.
O presidente da Venezuela, que se gabava de ser o interlocutor privilegiado da guerrilha, o líder capaz de desfazer o nó dos reféns e abrir as portas para a pacificação da Colômbia, foi feito de tolo por um cartel de bandidos. Depois da derrota no referendo da reeleição perpétua, Chávez recebe agora o segundo choque de realidade em 30 dias. Talvez amadureça.
Mas não se pode culpar o veículo, Chávez, pela farsa do menino Emmanuel, que não estava na selva, e sim num orfanato em Bogotá. Ela é produto único da lógica doentia e assassina das Farc.
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