11 janeiro 2008

ÍNDIA LANÇA "CARRO MAIS BARATO DO MUNDO"

Folha de S. Paulo

Veículo anunciado pela fabricante indiana Tata Motors deverá chegar ao consumidor indiano ao preço de US$ 2.500

Carro não possui rádio, direção hidráulica, vidros elétricos e ar-condicionado e terá só um limpador de pára-brisas em vez de dois

O que é preciso para fabricar o carro mais barato do mundo?
Para a montadora indiana Tata Motors, que lançará seu carro ultrabarato amanhã, a pergunta mais relevante era: "O que se pode tirar do carro?".
A empresa vem mantendo segredo em torno do novo veículo, mas entrevistas com fornecedores e envolvidos na produção revelaram alguns dos segredos que possibilitaram redução de custos - entre eles, uma haste de direção oca, um porta-malas com espaço para uma pasta executiva e um motor na traseira do veículo que não é muito mais potente que o de um cortador de grama.
O lado positivo de tudo isso é um carro previsto para chegar ao varejo por US$ 2.500.
A empresa quer oferecer transporte motorizado sobre quatro rodas, pela primeira vez, a pessoas que estão acostumadas a deslocar-se sobre duas. O mercado inclui centenas de milhões de indianos e outros do mundo em desenvolvimento.
Mesmo assim, o "carro do povo" (é um apelido, já que a Tata também está fazendo segredo do nome) pode afetar os carros em todo o mundo, já que integra tendência ampla entre montadoras: produzir automóveis menos caros. "Basicamente, estamos falando em jogar fora tudo o que a indústria automobilística pensou sobre estruturas de custo, pegar uma folha em branco e indagar "o que é possível fazer?'", disse Daryl T. Rolley, diretor da Ariba, que ajuda a fornecer componentes a Tata, BMW, Toyota e outras montadoras. "Em cinco a dez anos, a indústria será virada de ponta-cabeça."
A aliança franco-japonesa Renault-Nissan e a joint venture indiano-japonesa Maruti Suzuki estão tentando descobrir como produzir automóveis ultrabaratos para a Índia.
Alguns analistas prevêem que, assim como os japoneses popularizaram as técnicas do "kanban" ("just in time") e o "kaizen" (aperfeiçoamento contínuo), os indianos podem exportar uma "engenharia gandhiana", com irreverência pelos modos convencionais de pensar e frugalidade pela escassez de recursos. Ou, como o executivo automobilístico indiano Ashok K. Taneja descreve: "Por que investir ouro quando preciso de prata?".
Algumas dos poucos que já viram o carro da Tata descrevem um veículo minúsculo, simpático, de quatro portas, lugar para cinco pessoas, porta-malas e formato de bala de goma, menor na frente e mais largo na traseira, para reduzir a resistência ao vento e permitir o uso de motor mais barato.
A redução de custos foi comandada por engenheiros da Tata. O modelo não possui rádio, direção hidráulica, vidros elétricos ou ar-condicionado, e tem um limpador de pára-brisas em lugar de dois.
Para economizar US$ 10, os engenheiros da Tata redesenharam a suspensão de modo a eliminar os niveladores que ajustam o ângulo do raio de luz do farol, dependendo de como o veículo está carregado.
A Tata optou por mancais de roda que sejam fortes o suficiente para levar o carro a andar a até 70 km/h, mas que, a velocidades superiores, vão se desgastar rapidamente, reduzindo o tempo de vida do automóvel mas não pondo em risco a segurança dos consumidores, segundo Taneja. A velocidade máxima deve ser 120 km/h.

Peso menor
A redução do peso fez cair os custos de materiais e permitiu que a montadora usasse um motor mais barato. Pessoas familiarizadas com o carro descrevem um motor traseiro de US$ 700 fabricado pela alemã Bosch, com potência de cerca de 30 a 35 cavalos. O Honda Fit, um dos menores carros comercializados nos EUA, tem potência de 109 cavalos.
As montadoras tradicionalmente cultivam relacionamentos de longo prazo com seus fornecedores, mas as empresas vêm pouco a pouco aderindo à terceirização eletrônica, recorrendo a leilões na internet que obrigam os fornecedores a competir pelos negócios. Mas, segundo Rolley, mesmo as montadoras mais eficientes não compram mais que 10% a 15% de seus componentes eletronicamente. No caso da Tata, são de 30% a 40%.
Os críticos do carro da Tata perguntam como um carro que custa milhares de dólares menos que os preços normais pode obedecer às normas ambientais e de segurança.
A Tata diz que o automóvel vai obedecer a todas as normas vigentes na Índia.
É possível que o carro seja menos ecológico do que a montadora afirma. Michael Walsh, consultor de poluição e ex-regulador da Agência de Proteção Ambiental dos EUA, disse que é provável que um carro que custa tão pouco não possua a complexa tecnologia necessária para manter seu nível inicial de emissões de gases e que, sem essa tecnologia, em pouco tempo os carros podem passar a produzir quatro a cinco vezes seu nível inicial de poluição.
Na maioria dos carros americanos, os equipamentos de segurança, por si sós, já custam mais de US$ 2.500, disse Adrian Lund, presidente do Instituto de Seguros de Segurança Rodoviária, em Arlington, Virgínia. As montadoras estão buscando meios de produzir carros pequenos para o mercado de classe média na Índia e China. Depois de a Renault-Nissan ter começado a produzir carros baratos na Romênia, ela transferiu suas técnicas de engenharia de baixo custo às suas unidades em que produz modelos mais caros -por exemplo, tornando as portas dos veículos mais planas, para que um número maior deles possa ser colocado nos contêineres de transporte marítimo, informou uma porta-voz da Nissan, Pauline Kee.
Segundo Rolley, "isso não vai ser diferente de quando empresas americanas passaram uma década inteira, nos anos 1980, estudando quais técnicas de gerenciamento japonesas elas precisavam adotar".

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