Governo se adapta bem ao fim da CPMF, mas processo não deixa fruto duradouro na tributação nem no gasto público
O teor das medidas propostas pelo governo federal para compensar o fim da CPMF não era segredo. O corte de gastos nos três Poderes e o aumento de impostos mais à mão do Executivo - caso do IOF e da CSLL - já haviam sido anunciados para quem quisesse ouvir. O que se divulgou anteontem foi apenas a calibragem entre esses fatores.O ideal seria que o governo abrisse mão do recurso de aumentar tributos. Se tivesse levado a sério o caráter provisório da CPMF, cinco anos de mandato teriam sido suficientes para adaptar-se à vida sem imposto do cheque. Mas o presidente Lula apertou irresponsavelmente o acelerador das despesas permanentes do Estado e chegou à véspera de 2008 sem condições de substituir de chofre R$ 38 bilhões nas receitas federais.
À primeira vista, parece fácil abater essa quantia de um Orçamento de R$ 700 bilhões. O problema é que quase 90% das receitas federais têm destinação obrigatória, por força de lei e/ou compromissos fiscais assumidos. Trata-se de transferências para Estados e municípios, vinculações para saúde e educação, despesas com salários de servidores, com benefícios previdenciários e assistenciais, com juros e encargos da dívida pública etc.
Sobram cerca de R$ 70 bilhões em despesas passíveis de ser canceladas, conjunto em que se inclui a segunda vítima preferencial - perde apenas para os contribuintes - dos ajustes fiscais até aqui: os investimentos federais. Diante disso, um corte de R$ 20 bilhões, como o prometido pelo governo, não seria pequeno e provavelmente redundaria em diminuição da carga tributária federal em 2008.
O aumento do IOF é ruim para o crédito e as operações financeiras em geral, mas, na maioria dos casos, terá a função de substituir os 0,38 pontos percentuais antes gravados pela CPMF. A subida da CSLL sobre os lucros dos bancos, que há anos vivenciam a profecia do espetáculo do crescimento, foi uma opção razoável, embora o enorme poder de mercado do setor indique que as instituições vão tentar repassar o ônus para seus clientes.
O remendo está feito, enfim, e a economia e as finanças federais terão, como se previa, boas condições de absorver o fim da CPMF com o passar dos meses. O lamentável nesse longo processo é dele não ter restado nenhum ganho duradouro, seja para a estrutura do gasto público, seja para o sistema tributário.
A resposta do governo Lula é uma mera adaptação emergencial. Não contempla nenhum dispositivo para frear os grandes grupos da despesa pública ao longo do tempo - e ampliar a margem para investimentos e para a redução de tributos no futuro. Se a economia continuar crescendo num ritmo parecido com o de 2007, todas as condições para a escalada do gasto público corrente e da carga tributária estarão repostas em 2009.
Uma saída concertada dessa situação, com governo e oposição discutindo a um só tempo a estrutura da tributação e do gasto, continua possível. Basta, como diz o clichê, vontade política.
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