Editorial da Folha de S. Paulo
É desalentador verificar que, num ano muito bom para a economia, o setor público tenha gasto R$ 160 bilhões com juros
Foram decepcionantes os resultados das contas públicas de 2007. Num ano excepcional para a atividade econômica, o déficit de iniciativa, idéias e prioridades no governo federal redundou em melhorias apenas discretas e inerciais em algumas cifras. Nenhum avanço estrutural no sentido da superação do nó fiscal foi obtido - muito pelo contrário.
Pelo quinto ano consecutivo, a gestão Lula manteve o compromisso com princípios elementares do equilíbrio financeiro. A poupança do setor estatal (União, Estados e municípios) chegou a 4% do PIB e assegurou a continuidade do alívio paulatino no peso da dívida pública e das despesas com juros.
Mas o chamado superávit fiscal dependeu, mais uma vez, do aumento dos recursos que a sociedade entrega ao governo sob a forma de impostos. A receita tributária cresceu muito acima do forte ritmo de expansão da economia. O excesso de arrecadação poderia ter sido devolvido aos contribuintes, numa redução de alíquotas; poderia ter sido destinado à ampliação agressiva do investimento público em infra-estrutura; poderia ter acelerado o abate da dívida estatal.
Todos esses nobres objetivos, no entanto, foram bastante comprometidos por mais uma rodada de aumento de gastos com a manutenção do governo. Só na esfera federal, as despesas com funcionalismo subiram mais de 5% acima da inflação; os dispêndios com o custeio, mais de 10%.
O governo Lula comemora um módico aumento de R$ 4,6 bilhões (numa receita total superior a R$ 600 bilhões) nos investimentos federais como se significasse mudança de qualidade no padrão de gasto público. Aquela cifra poderia ter sido duplicada se, em vez da retórica, o Planalto houvesse aplicado uma medida que propagandeou ao lançar o PAC - a limitação do crescimento anual da despesa com pessoal a 1,5% acima da inflação.
Assegurar a sustentação financeira do Estado brasileiro ao longo do tempo, diminuir a sua dependência de credores privados, ampliar a margem para que o governo invista em equipamentos de bem-estar e infra-estrutura, aliviar trabalhadores e empresas para que possam consumir e investir mais. É disso que se trata quando se propugna pela redução paulatina do chamado gasto público corrente.
É desalentador verificar que, ao longo de um ano muito bom para a economia nacional, o setor público tenha despendido R$ 160 bilhões - mais de 6% de tudo o que se produziu em 2007, o equivalente a quase toda a despesa da Previdência - a título de juros. O conservadorismo excessivo de várias equipes que atuaram no Banco Central e os erros da política de estabilização macroeconômica não são responsáveis únicos por essa situação.
Desde a implantação do Real, tem faltado a nossos governantes a decisão política de mudar o padrão do equilíbrio fiscal. Ninguém ainda foi capaz de trocar a voracidade arrecadatória pelo controle do gasto público.
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