20 março 2007

FAÇA SEU BEBÊ SORRIR


Pode Rir!

Está nas suas mãos e na força da sua criatividade ensinar o bebê a gargalhar gostoso desde cedo. Bom humor é um dos maiores presentes que você pode dar a ele. Para a infância e para a vida inteira.
Ana Paula Franzoia

Julia tinha 5 anos quando protagonizou uma daquelas histórias que entram para o arquivo de casos engraçados da família. Expansiva e elétrica, a menina surpreendeu os pais ao entrar correndo na sala gritando: "Gente, vem ver a videocassetada que eu fiz na cozinha!" Os pais, o jornalista Gilmar Almeida e a fonoaudióloga Patrícia Perini, atenderam ao chamado rapidamente e se depararam com uma pequena catástrofe doméstica: panelas e tampas espalhadas pelo chão e potes de plástico boiando na água, que escorria da pia formando uma piscina no piso. A situação caótica, com grandes possibilidades de terminar em bronca e chateação, acabou ganhando uma dimensão inesperada graças ao senso de humor da pequena Giulia. Ao chamar a arte que tinha feito de videocassetada, a garota conseguiu desarmar a irritação que a cena causaria nos pais. A graça fez toda a diferença e o episódio ganhou um final feliz, com todos arrumando a bagunça. A relação entre pais e filhos saiu fortalecida, e a confiança mútua também.

A história de Giulia ilustra o poder do bom humor nos relacionamentos e ajuda a lembrar como é importante cultivar essa característica desde cedo. Quando alguém se aproxima de nós com um sorriso no rosto, instintivamente relaxamos. Se quem chega está sério, a tendência é ficarmos na defensiva. Em se tratando de crianças, a reação é ainda mais perceptível. Por isso, muitas vezes, basta o adulto olhar sério para o bebê para que ele caia no choro. Qualquer sinal de stress ou mau humor dos pais é absorvido em poucos instantes. "Criança pequena é como uma esponjinha", afirma a pediatra Ana Maria Escobar, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo. Da mesma forma, uma atitude positiva dos pais é capaz de contagiar a criança. Uma situação típica é quando a criança cai. Ela imediatamente olha para o adulto para ver como ele reage, só então chora ou se levanta e continua a brincar.

Doutoures da Alegria, levam alegria aos hospitais
Logo que os palhaços dos Doutores da Alegria chegam, um sorriso vai se espalhando pelos corredores do hospital. Os primeiros a rir são os médicos, enfermeiras e auxiliares. A cada quarto visitado, a expressão de alegria vai surgindo no rosto de pacientes e familiares. As brincadeiras singelas e engraçadas da equipe de palhaços deixam um rastro de benefícios que perdura por dias. Pacientes apresentam melhoras físicas e mentais expressivas e comprovadas em exames. E não são somente os doentes que se beneficiam com o bom humor da trupe. Todos os funcionários também sentem na pele os resultados das risadas que deram por algumas horas. A eficiência dos Doutores da Alegria acabou virando objeto de estudo da psicóloga Morgana Masetti. Há 11 anos, Morgana foi convidada pela entidade sem fins lucrativos para dar apoio psicológico à equipe. A parceria rendeu a criação de um centro de estudos na sede do grupo e dois livros sobre os efeitos nas crianças e no corpo médico (Boas Misturas, a Ética da Alegria no Contexto Hospitalar e Soluções de Palhaços, Transformações na Realidade Hospitalar, lançados pela editora Palas Athena). "É fascinante como os palhaços conseguem se comunicar com os pacientes e é isso o que mais encanta o corpo clínico. Médicos e enfermeiras querem se apropriar desse elo e acabam aprendendo com eles", diz a psicóloga. Os Doutores surgiram há 13 anos, quando o ator Wellington Nogueira voltou de uma temporada em Nova York, onde trabalhou em um grupo semelhante. Hoje, além de equipes de palhaços atuando em hospitais de São Paulo, os Doutores têm equipes no Rio e Recife.

Pais com bom astral criam filhos bem-humorados
Quando alguma mãe chega ao consultório reclamando da irritação e do choro constante de seu bebê, a pediatra diagnostica na hora o problema, que, por incrível que pareça, raramente é com a criança: é ela, a própria mãe, que precisa dedicar um tempo somente para si e encontrar uma atividade que lhe dê prazer. "Os bebês captam a falta de paciência e reagem chorando ainda mais. É por isso que os pais devem estar de bem com a vida: só assim conseguirão passar aos filhos sensações de prazer, satisfação e paz espiritual", aconselha a doutora Ana Maria. Como em qualquer relação, a qualidade do tempo de convivência é superimportante. Portanto, não tenha medo de deixar o filhote por uma hora ou duas e vá ao shopping, faça uma caminhada ou visite uma amiga querida. Relaxe! "Os pais precisam estar cientes de que a criança aprende por imitação; se ela interage com pais nervosos e tensos, será tensa e ansiosa", completa Mariangela Barbato, professora do departamento de educação da PUC de São Paulo. Claro que todos nós temos dias mais alegres e outros nem tanto, mas é bom que a criança entenda isso também. "O contato com as emoções do outro ajuda no desenvolvimento da criança e a prepara para lidar melhor com o mundo", explica a psiquiatra Maria Teresa Lamberte, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo.

O mundo sorri para quem sorri para o mundo
A capacidade social do riso é o que mais fascina a psicobióloga Silvia Helena Cardoso, pesquisadora da Unicamp. "A função do riso é a comunicação. Ele está presente em todas as situações sociais, daí a importância de termos uma família convivendo em um ambiente pacífico e alegre." O riso não é exclusividade do ser humano. Muitos animais riem, mas a diferença está na origem dessa demonstração física. "O riso humano, como o de outros animais, envolve componentes motores e emocionais. A questão é que somente os humanos desenvolveram o lado cognitivo, que permite, por exemplo, rirmos de uma piada."Os pais gostam de pensar que os recém-nascidos já são capazes de sorrir para eles. A verdade, porém, é que esses primeiros sorrisos são um reflexo motor, um espasmo muscular involuntário. Só depois de algumas semanas, e esse período pode variar de bebê para bebê, é que a criança começa a sorrir de fato. Por volta dos 3 meses de vida o bebê já é capaz de identificar o rosto humano e começa a se relacionar com as pessoas mais próximas. A partir dos 6 meses, sente grande prazer em interagir com os outros, e é nesse momento que surge também a angústia do estranho, que faz com que ele chore diante de uma pessoa desconhecida. Depois de 1 ano - e vale lembrar novamente que cada pessoa tem um ritmo próprio -, a criança já tem estrutura mental para entender o sentido do humor. A essa altura da vida, ela compreende que existem situações "certas" (a calça comprida deve ser vestida pernas acima) que podem ser subvertidas criando cenas inusitadas e ridículas (a mãe põe a calça do bebê na cabeça como se fosse um chapéu) e se diverte com elas. "O humor nos indica que a criança está bem estruturada mentalmente, mas a recíproca não vale", avisa Maria Teresa. A psiquiatra deixa claro que, se a criança é mais quieta ou séria, não significa que ela tenha problemas. "Tudo depende do temperamento de cada um e é preciso respeitar as características individuais."

Sorrir faz bem ao coração, ao pulmão, à digestão, à circulação...
Não é por acaso que o dito popular "rir é o melhor remédio" nunca caiu em desuso. O sistema imunológico é um dos mais beneficiados pelo riso e isso já foi comprovado cientificamente. "Quem é deprimido tem muito mais possibilidade de ficar doente", afirma a pediatra Ana Maria Escobar, do Instituto da Criança. Quando rimos, produzimos mais endorfina, o que ajuda o organismo a combater as dores e o mal-estar. Os efeitos podem ser sentidos em várias partes do corpo. Por causa das contrações causadas pela gargalhada, os órgãos do abdome se movimentam, o fluxo sanguíneo é ativado e isso ajuda a melhorar a digestão e o funcionamento dos intestinos. Como o coração costuma acelerar quando rimos muito, há um aumento significativo na oxigenação das células, beneficiando o corpo todo. Para os pulmões, significa uma grande inalação de ar, aumentando a ventilação do órgão e promovendo uma faxina geral. Ocorre ainda uma onda vibratória que deixa uma sensação profunda de relaxamento.

Na brincadeira, uma aula de humor
Cadê o bebê da mamãe? A pergunta antecede o rosto escondido por alguns instantes, até reaparecer para surpreender a criança. O jogo de aparece-e-esconde sempre resulta em riso mesmo que se repita por dezenas de vezes. Brincar é fundamental para desenvolver o bom humor. É por meio das brincadeiras que a criança vai ganhando maturidade e segurança. Para brincar, não é necessário ter em casa um arsenal de brinquedos caros e cheios de recursos. Pesquisadora de brincadeiras, Mariangela Barbato lembra que até o ato de acalentar o bebê já é uma forma de brincadeira. "Interações entre pais e bebês, como aquela de a mãe suspender o filho e fingir que vai deixá-lo cair ou de fingir que vai atacá-lo para dar uma mordida e no final enchê-lo de beijos, são jogos simples que ajudam a criança a se desenvolver." Outra boa maneira de estimular o riso é criar situações inusitadas com objetos do cotidiano, como fingir que a panela é um chapéu. A brincadeira favorita de toda criança pequena é montar e desmontar; construir, destruir e reconstruir. Quando o bebê joga o objeto que tem nas mãos para que a mãe abaixe, pegue e o devolva a ele, e em seguida volta a jogá-lo no chão, não se trata de uma forma de tortura: ele está apenas exercitando novas habilidades. Depois de perceber e absorver o mundo a sua volta, é hora de descobrir que é possível fazer e refazer. "Essa é a base do humor", diz a psiquiatra Maria Teresa. "A criança só pode rir do ridículo se já tiver consciência do que a cerca. Nesse contexto, o jogo da repetição passa a dar enorme prazer." A brincadeira aparentemente sem importância vai ajudá-la a lidar melhor com as dificuldades, já que a criança está desenvolvendo a capacidade de tomar distância dos problemas e de rir de si mesma. "Ela vê que é possível recomeçar, e isso é um legado para a vida toda."

Bisnaguinha vira super-herói
Cada família tem suas artimanhas para lapidar o humor. O chef Benny Novak e a jornalista Natasha Novak, pais de Sofia, de 1 ano e 10 meses, contam que música e historinhas sempre alegram a filha. "Ela gosta quando dançamos com ela e dá gargalhadas deliciosas quando nos atrapalhamos", diz Natasha. Ator e palhaço, Wellington Nogueira, fundador dos Doutores da Alegria, lembra que quando Theo nasceu, há cinco anos, decidiu com a mulher, a cineasta Mara Mourão, não vestir o personagem palhaço para o filho. "Queria que ele risse de mim e não do personagem." As brincadeiras que divertem Theo são as mais simples. No café da manhã, por exemplo, cada objeto ou alimento da mesa ganhou o nome de um super-herói. A bisnaguinha com queijo, por exemplo, é conhecida como mulher-gato. Theo adora e já começa o dia rindo.

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