29 abril 2008

DISTORÇÕES, AINDA

ARTHUR VIRGÍLIO


Os resultados são os esperados. Demoraram um pouco, mas não se pode esquecer que o governo FHC pegou o Plano Real no início

Acreditava ter encerrado o debate com o prezado senador Aloizio Mercadante ao saudar, em artigo publicado neste mesmo espaço (23/3), sua conversão (tardia) à política econômica herdada do governo anterior e mantida pelo presidente Lula, graças à lucidez do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci e do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.
Mercadante não gostou, porém, de eu ter lembrado sua posição passada, mantida até muito recentemente, e voltou, na edição de domingo, dia 6 ("Dizem, ainda", "Tendências/Debates"), com algumas distorções, a começar pela acusação de que o ataquei. Não, não o fiz! Tenho sempre procurado manter com ele o debate qualificado que a vida pública exige.
É, acaso, injusto recordar que ele e seu partido armaram barricadas contra o Plano Real, as privatizações, o saneamento das finanças dos Estados, a Lei de Responsabilidade Fiscal, o Fundef? Não! Quero crer, sinceramente, que acreditavam estar tudo errado.
No governo, algumas poucas, porém decisivas figuras perceberam o alcance das medidas e as mantiveram. Nunca deixei, no Senado, de saudar o maestro dessa mudança de atitude, ainda que freqüentemente entrando em choque com idéias do senador.
Ainda agora, demonstra ele não se ter convertido por inteiro, pois continua entendendo que "a política de metas de inflação pode ser administrada de forma menos ortodoxa e mais gradativa". Trocado em miúdos: com as rédeas um tanto soltas. Sabe-se bem até onde iria a inflação se corresse livre. Indicativo disso são os índices do último mês de março, que extrapolaram o centro da meta, repetindo o quadro de fevereiro.
Curiosa a mais não poder é a "tese-justificativa" formulada por Mercadante: "Como explicar que políticas em tese idênticas tenham dado resultados tão díspares?". Ora, senador, os resultados são os esperados. Demoraram um pouco para aparecer porque o governo Fernando Henrique Cardoso não teve a sorte de Lula de encontrar cenário internacional tão favorável em quatro anos de gestão. O governo passado enfrentou tempestades, a começar pelas mais drásticas, como a dos tigres asiáticos, a da Rússia e a do México.
Não se pode esquecer também que o governo Fernando Henrique pegou o Plano Real no seu início. Tirava-se o país, bruscamente, de uma inflação anual de 764% (média entre 1990 e 1994) para índices "civilizados" de mais ou menos 4% a 5% ao ano.
Era experiência nova, sujeita a correções em razão dos desajustes estruturais da economia. A valorização do real, por exemplo, teve, no meio do caminho, de ser ajustada à realidade.
E então, com as demais medidas de modernização e racionalização do país, chegou-se à estabilidade econômica tão sonhada. Em 2003, a semeadura estava feita.
O Brasil estava saneado e preparado para o momento da colheita, que teria chegado antes, não fosse o estremecimento experimentado pela economia diante da perspectiva de vitória eleitoral do PT. Temia-se um retrocesso, considerando o histórico do partido e de seu líder máximo. O dólar disparou, beirando os R$ 4. Os investidores, internos e externos, prudentemente, retraíram-se.
Felizmente para o país, o "monstro" chegou manso ao poder. Surpreendeu a todos ao nomear Palocci e ao buscar, entre os deputados eleitos pelo PSDB, alguém com experiência em finanças e mercado para presidir o Banco Central. Rendeu-se, com méritos, à cartilha econômica do governo anterior e, agora, colhe frutos que poderiam ter sido maiores, não fossem a incompetência administrativa e o pequeno apetite reformista.
Eis a verdade que o senador precisa enxergar. Encará-la é o melhor meio de ajudar o presidente Lula a repetir o êxito, pondo fim à farra fiscal, à farra da gastança de seu segundo período.
Os juros básicos deverão aumentar a partir de agora, precisamente porque ao Banco Central não resta alternativa fora da política monetária. O governo, afinal, descuida da parte fiscal, e mágica não existe em economia. Só no circo!
Ou os gastos de custeio são fortemente reduzidos ou os juros, diante do repique inflacionário, terminarão em outro processo de ascensão. E, aí, espero que Mercadante não volte a criticar Meirelles, como fez, anteriormente, em situação assemelhada.
Finalmente, registro o equívoco técnico do último artigo de Mercadante: eufórico com a queda na relação dívida/PIB, aplicou a nova metodologia de aferição ao ano de 2007, porém não a 2002, que apontou 50,5%, contra os 59,6% por infelicidade publicados.


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Até onde vai esta discussão?!

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