09 abril 2008

COMEÇOU A CONTAGEM REGRESSIVA

FERREIRA GULLAR

O predestinado de Caetés cruza o país como se fosse candidato em todos os municípios

Há partidos para os quais a alternância no poder é natural. É que não estão imbuídos da pretensão de que nasceram para salvar a pátria, que, por isso mesmo, sem eles, não será salva. Essa foi, na origem, a pretensão do PT e de Lula, hoje, mais do que nunca, convencido de que é um predestinado. Do PT ele já não pensa isso, pois o vê como um instrumento de suas pretensões.
Na condição de mero palpiteiro, sempre disse que Lula e o PT não existem um sem o outro, e daí por que, apesar dos mensalões e aloprados, dólar na cueca e beijus de tapioca, são inseparáveis como irmãos siameses. Mas quem manda é o Lula que, como amante infiel, transa com crivelas e severinos, chávez e bushes, certo de que nem por isso o lar petista será desfeito. Como as esposas norte-americanas traídas, engole o sapo e se conforma, já que, em compensação, tem à sua disposição muita grana e milhares de cargos públicos para sustentar a máquina partidária.
Enquanto isso, o predestinado de Caetés cruza o Brasil de Norte a Sul, de Leste a Oeste, como se fosse candidato a prefeito em todos os municípios do país. Se a oposição diz que o PAC viola a legislação eleitoral e que ele o usa como propaganda, alega que não é candidato. Sucede que a lei proíbe a propaganda indevida, não importa se o cidadão a faz em benefício próprio ou de outro. Na verdade, como se sabe, Lula se empenha diuturnamente para que os candidatos que apóia saiam vitoriosos das urnas e ofereçam a ele a base de sustentação das eleições presidenciais de 2010. Aliás, ele diz isso abertamente: "Se pensam que vão nos derrotar em 2010, podem tirar o cavalo da chuva".
Essa é a questão: Lula tem que fazer seu sucessor. Não é próprio dele nem de seu partido aceitar a rotatividade no poder, especialmente se se trata da presidência da República. Isso, que para qualquer partido é natural, para o PT será uma desgraça, porque foi fundado para nele se manter indefinidamente. Se, como Lula costuma afirmar, "eles governaram durante 500 anos", por que -perguntaria ele- vamos governar só oito? E especialmente agora, quando tem o apoio de 73% da opinião pública, só perdendo para o general Médici, que teve 84%?
O sonho de Lula, como o de Chávez, era reeleger-se indefinidamente, mas, como nos dois casos, a opinião pública repeliu-lhes a pretensão, devem estar ambos maquinando que golpe dar para continuar no trono. Por entender que o Brasil não é a Venezuela, Lula agirá com cautela e, se não houver jeito, jogará tudo para fazer o sucessor. É, aliás, o que já está fazendo.
Mas quem é o seu candidato à sucessão? Uns dizem que é a Dilma Rousseff, outros que é Marta Suplicy, mas ninguém sabe ao certo; possivelmente, nem o próprio Lula, para quem o candidato de fato teria que ser ele mesmo.
Na verdade, Lula sabe que vive um momento decisivo de sua carreira política. Por essa razão mesmo, inventou o PAC, que serve duplamente a seus propósitos: põe-lhe nas mãos bilhões de reais, que lhe permitem aliciar políticos de todas as tendências, ao mesmo tempo em que lhe possibilita estar no palanque, todos os dias, em todos os cantos do país, atacando os adversários e se promovendo. Desse modo, joga com duas possibilidades: ou tornar-se candidato por clamor do povo, ou assegurar a eleição do candidato que venha a apoiar.
Mas por que digo que este é um momento crucial para ele? Porque deixar o governo, no seu caso, é quase uma deposição, já que, a seu juízo, só com ele na presidência da República o povo estará de fato no poder. E há o outro lado da questão: o candidato que deveria substituí-lo tem de ser do PT e de nenhum outro partido. Esta é uma condição "sine qua non". E não é difícil entender, uma vez que esse seria o único modo possível de ele, Lula, continuar mandando e assegurar sua volta ao governo em 2014. E, se efetivamente pensa assim, pensa certo. Alguém pensa que um presidente do PMDB ou mesmo do PSB iria preparar o caminho para a volta de Lula à presidência da República? Jamais. Todos os partidos, em uníssono, odeiam o PT, querem se livrar dele e de sua arrogância (um exemplo é o dossiê da Dilma). E Lula é o PT. Por isso, querem todos vê-lo pelas costas.
Mas se, na pior e mais provável das hipóteses, o sucessor de Lula for do PSDB? Já imaginou o frio que corre pela espinha de Lula e dos petistas ao pensar nisso? Pode alguém retrucar: mas o PSDB tampouco conta com a simpatia dos demais partidos. É verdade, mas o risco é menor: ele aceita o jogo democrático.

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