01 agosto 2007

QUEM INDICOU


Editorial da Folha de S. Paulo

Governo se aproveita do descalabro da aviação e tenta retirar o poder de outorga de concessões das agências reguladoras

O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva se aproveita do descalabro no setor aéreo para retomar sua antiga proposta de solapar o poder das agências reguladoras. O projeto de uma lei geral para essas autarquias, que tramita no Congresso desde 2004, foi recolocado na lista de prioridades do Legislativo.
Uma armadilha acompanha a discussão, necessária e saudável, acerca do aperfeiçoamento dos mecanismos para que a sociedade aumente seu grau de controle sobre as agências. Quanto a este tópico, são aceitáveis dispositivos que prevejam até mesmo a destituição dos diretores das agências -desde que em casos extremos, de descumprimento reiterado de metas objetivas, e mediante aprovação por maioria qualificada no Parlamento.
Mas o ponto perigoso do projeto, que a gestão petista sonha em ver aprovado, é o que retira o poder de editar outorgas das agências e o entrega aos ministérios. Trata-se de uma ameaça de retrocesso, pois a conversão em lei desse mecanismo injetaria insegurança jurídica no sistema de concessões de serviços públicos à iniciativa privada.
Contratos cujos prazos são contados em décadas e que obrigam o concessionário a fazer investimentos de grande escala voltariam a ficar sujeitos a mudanças de curto prazo na política federal. A inoperância de agências como a Anac nada tem a ver com o fato de deterem o poder de concessões. Tampouco o fiasco na aviação está ligado à sempre alegada drenagem, supostamente em favor das agências, do poder do governo de definir e planejar políticas públicas.
Desde sempre esteve à mão do governo federal a faculdade de planejar e executar a melhoria na gestão e a expansão dos sistemas aeroportuário e de controle de vôos -bem como a iniciativa legislativa de estabelecer critérios para as concessões às empresas de aviação. Não o fez por negligência.
O presidente Lula tampouco se preocupou em indicar para as agências reguladoras quadros de qualidade técnica inquestionável. Loteou diretorias entre apaniguados, como mostrou reportagem de ontem desta Folha. Seria cômico, se não fosse desastroso, notar que o mesmo governo responsável por indicações irresponsáveis se põe agora a colocar a culpa pela inépcia, que é só sua, no modelo das agências.
A esse respeito, têm sido comoventes as manifestações de mea-culpa de senadores que coonestaram o loteamento incompetente das agências. Prometem que agora vão dedicar mais atenção às mal chamadas sabatinas -há casos de diretores aprovados sem uma única pergunta. Estariam dispostos até a instituir a obrigatoriedade de um parecer técnico sobre cada indicação do Planalto.
E o cidadão fica sabendo, espantado, que nem isso acontece como rotina nessas homologações interesseiras e preguiçosas.


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Das 10 Agências Reguladoras do governo federal, 6 atualmente (e ainda uma outra Agência é comandada por um filho de um ex-senador mineiro), são dirigidas por petistas e membros da base aliada do governo.
Ou seja, indicação é totalmente política, nada mais é levado em consideração.
Um verdadeiro descaso com o país, uma grande irresponsabilidade.

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