14 agosto 2007

MÁQUINA SEM GESTÃO

Editorial da Folha de S. Paulo

Carreiras de Estado melhoram rendimentos, o que é positivo, mas burocracia é ineficiente e avessa à modernização

Emdez carreiras do Executivo federal, o aumento real dos vencimentos no primeiro governo Luiz Inácio Lula da Silva variou de 15% a 80%, segundo levantamento da Folha. Como são carreiras de nível superior, quase todas exclusivas do Estado (delegados, procuradores, diplomatas etc.), faz sentido uma melhora na remuneração, condizente com as funções desempenhadas.
Trata-se de uma maneira de disputar bons profissionais e evitar a cooptação por grupos privados. O maior problema, contudo, não está na elite, mas nos setores de média e baixa qualificação do serviço público, cuja remuneração tende a ser mais alta do que seus similares na iniciativa privada.
Pior: a folha de salários relativamente elevada do funcionalismo federal - a despesa pode ultrapassar 5% do PIB neste ano - contrasta com a má qualidade do serviço prestado à população. O Estado brasileiro é carente de mecanismos de gestão destinados a incentivar o aumento da produtividade dos servidores.
Concepções arcaicas resistem a idéias óbvias como a remuneração de acordo com o desempenho. Ainda fazem parte de experimentos vanguardistas na administração pública brasileira os contratos de gestão, por meio dos quais se estabelecem parâmetros objetivos para medir a execução das tarefas. O órgão que se destaca nesse saudável campeonato recebe um bônus.
Outro foco de resistência à modernização é a batalha contra a gestão de setores da administração por meio de fundações. Bem fiscalizado, esse modelo tem se mostrado mais eficiente do que o tradicional - que acaba protegendo mais os servidores, com estabilidade, aposentadoria integral e outras vantagens- do que os usuários do serviço.
Não há razão para que o Estado dê tratamento especial a carreiras - como a de médico, enfermeiro, professor etc. - que não são exclusivas do setor público. Os hospitais públicos, por exemplo, devem ser capazes de pagar remunerações competitivas no mercado de trabalho, mas também precisam ter à mão instrumentos para cobrar desempenho profissional análogos aos das empresas privadas.
Tímido nos projetos para modernizar a administração pública, o governo Lula mostra-se à vontade para lotear politicamente a máquina federal.
O Estado brasileiro entrou em franca deterioração financeira e operacional com a crise da dívida externa do início dos anos 1980. Deglutir esse imenso passivo custou muito - em tempo e recursos - ao país. A inflação foi debelada a partir de 1994; o descompasso fiscal foi equacionado a partir de 1999; e o desarranjo nas contas externas pôde ser corrigido a partir de 2003. O ambiente se tornou favorável à entrada do Brasil numa nova fase de seu desenvolvimento.
A transformação dessa expectativa em realidade, porém, requer um Estado com capacidade gerencial, que modernize a administração dos seus serviços, corte despesas correntes, amplie gastos em infra-estrutura e diminua o fardo dos impostos sobre a sociedade.

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