03 agosto 2007

O GOVERNO E A IMPRENSA

Do Blog de Reinaldo Azevedo

Para envergonhar parte do colunismo político brasileiro
No Estadão desta sexta, por Andrei Netto. Volto em seguida:

A maior organização não-governamental de defesa da liberdade de imprensa do mundo, a Repórteres Sem Fronteiras (RSF), divulgou ontem, em Paris, uma carta aberta ao presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, e ao presidente do Partido dos Trabalhadores (PT), Ricardo Berzoini, na qual critica a postura beligerante de líderes da sigla contra a imprensa do País.

A ONG classifica o documento do partido como “inoportuno e infundado”. A manifestação da entidade, assinada por seu secretário-geral, Robert Ménard, veio a público dois dias após a reunião da Executiva do PT na qual seus dirigentes denunciaram o que, em seu entender, é um “aproveitamento indevido” do acidente do vôo 3054 da TAM, em São Paulo, que fez 199 vítimas no dia 17 de julho. Segundo Valter Pomar, secretário de Relações Internacionais do PT, há uma tentativa da oposição de rearticular ataques ao governo” e a “grande imprensa” estaria abordando o acidente de acordo com os interesses dessa oposição.

O texto do PT também se solidariza com o assessor especial da Presidência, Marco Aurélio Garcia, criticado pelos gestos obscenos que fez - e que foram filmados por um jornalista - ao ouvir uma informação que, em tese, absolveria o governo de culpa na tragédia da TAM.

Na sua nota, a RSF se mostrou preocupada com as conseqüências da resolução petista, que “vem a público após o grande eco midiático dado às manifestações que se seguiram à catástrofe aérea no Aeroporto de Congonhas e às vaias endereçadas ao presidente Lula quando da abertura dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro', afirma o autor, que depois pergunta: “Este eco deve ser entendido como uma crítica sistemática ao governo? A mídia deveria deixar esses eventos passarem despercebidos?”.

O texto pede calma ao presidente Lula e a Berzoini e diz contar com “a sabedoria” de ambos. “A resolução do PT é um mau sinal, indigno de um partido democrático. Ela não faz nada além de alimentar os rancores. Ela deve ser reconsiderada.” À noite, o diretor do Escritório para Américas da RSF, Benoît Hervieu, reforçou a posição apartidária da ONG e lembrou ao Estado a responsabilidade do Brasil na manutenção da liberdade de imprensa na América Latina. “O Brasil é um exemplo importante no continente, mas que enfrenta tensão entre o poder político e a imprensa. Depois do acidente, vive-se um momento de calor emocional, e os meios de comunicação ecoam as preocupações públicas sobre o fato”, ressaltou.

Para Hervieu, a resolução “não é uma boa idéia se falamos de um partido que está no poder”. E acrescentou: “Um país não pode se apresentar como democrático e livre se pedir à imprensa que não reverbere os problemas do País.”

Voltei
Uma parte considerável da imprensa brasileira deveria estar morta de vergonha. A razão é simples. O tal documento do PT, que esculhambei aqui, foi solenemente ignorado pela maioria dos “analistas” políticos. É que eles estavam muito ocupados pegando no pé — com sapato de cromo alemão? — de João Dória Jr. Também se dedicavam a demonizar ou a ironizar os ricos, a classe média brasileira, a Dona Zelite, que teria vaiado Lula no Maracanã e promovido a passeata em São Paulo. Como diria o “classe-mediólogo” Ricardo Amorim (ver abaixo), essa gente não tem tradição de mobilização...

A carta a Lula e ao PT escrita pela ONG Repórteres Sem Fronteira a respeito de um assunto sobre o qual os nossos comentaristas decidiram silenciar dá conta da miséria que vive certo jornalismo. Miséria moral com pauta: a do PT. À entidade não escapou o viés autoritário do documento do partido: “A resolução do PT é um mau sinal, indigno de um partido democrático. Ela não faz nada além de alimentar os rancores. Ela deve ser reconsiderada.”

Pois é... O Brasil, visto de longe, parece se revelar com mais clareza. Não custa lembrar que, depois daquele documento, o próprio Lula falou duas vezes em “pôr gente na rua”, isto é, em confrontar os que o vaiam (na suposição de que sejam pessoas manipuladas pela oposição, o que ele sabe ser mentira) com os seus apoiadores. Mais do que ninguém, ele sabe que a oposição não é assim tão ousada.

Já falamos bastante sobre esse caso. Trata-se do comportamento habitual do PT, que parte sempre para a ofensiva, transformando inocentes em culpados. E vice-versa. O partido, vá lá, cumpre a sua natureza. Marilena Chaui também. Mas e esses jornalistas? Na prática, estão sendo chamados às falas por uma entidade que se ocupa de defender a liberdade de expressão no mundo inteiro. Também eles estavam e estão engajados no CCCM: o Comando de Caça à Classe Média, que estaria proibida de se manifestar — a não ser, claro, quando seus radicais esquerdopatas invadem e depredam a reitoria de uma universidade, roubando seus computadores. Aí aparecem as penas do petralhismo para chamar aquilo de “nova democracia ateniense”.

Tanto o governo como o PT criminalizam, a um só tempo, a política e a imprensa e, curiosamente, com o apoio de jornalistas — desta feita, não são apenas os anões e mascates de sempre, que, claro, trabalham por dinheiro. Agora, alguns bocós caíram na conversa — e de graça, ajudando Lula a alimentar o mito de que o mundo se divide entre os bem-intencionados, que o apóiam, e os venais, que estão contra ele.

Parte do nosso jornalismo também não tem fronteiras. Morais.

PS: Marilena Chauí continua a provocar os meus melhores instintos. Volto àquele seu formidável depoimento. Algo havia me escapado. De novo, em vermelho. Retomo depois:
“Era o fim da tarde. Estava num hotel-fazenda com meus netos e resolvemos ver jogos do PAN-2007. Liguei a televisão e "caí" num canal que exibia um incêndio de imensas proporções enquanto a voz de um locutor dizia: "o governo matou 200 pessoas!". Fiquei estarrecida e minha primeira reação foi típica de sul-americana dos anos 1960: "Meu Deus! É como o La Moneda e Allende! Lula deve estar cercado no Palácio do Planalto, há um golpe de Estado e já houve 200 mortes! Que vamos fazer?". Mas enquanto meu pensamento tomava essa direção, a imagem na tela mudou. Apareceu um locutor que bradava: "Mais um crime do apagão aéreo! O avião da TAM não tinha condições para pousar em Congonhas porque a pista não está pronta e porque não há espaço para manobra! Mais um crime do governo!". Só então compreendi que se tratava de um acidente aéreo e que o locutor responsabilizava o governo pelo acontecimento.”

Voltei
Leio mal ou esta humanista começou a se acalmar quando constatou que se tratava SÓ de um acidente aéreo, onde morreram 199 pessoas? É, com efeito, a mídia "golpista" não presta. Marilena é que é legal. Confiem em seu senso de piedade e justiça.


*

É extremamente preocupante quando um governo só quer aplauso.
Não nos esqueçamos de olhar para Cuba e Venezuela.
O Brasil não merece isso.

Nenhum comentário: