14 agosto 2007

ARITMÉTICA DA IMPUNIDADE

ELIANE CANTANHÊDE

Até que eu me esforço para cultivar meu lado Poliana, para ver o lado positivo das coisas, acreditar que hoje é melhor do que ontem e que amanhã será melhor do que hoje. Mas está ficando cada vez mais difícil. Assim não dá.
Levantamento publicado na última edição da revista "Veja" sobre os resultados de dez operações realizadas pela Polícia Federal entre 2003 e 2004 mostra que o festival não deu em nada. De 245 presos, só 64 foram julgados e só dois continuam onde a maioria deveria estar: na cadeia. Ou seja: 245 passaram para 64 e viraram dois.
As operações eram fantásticas, e os nomes, criativos e instigantes: Anaconda, Gafanhoto, Vampiro, Pororoca, Sentinela. Repórteres e fotógrafos deliravam com o espetáculo. As pessoas em casa pensavam: "Agora, vai!" Foi?
Há uma espécie de complô para o sistema não funcionar. A polícia investiga e prende, mas a Justiça não é para fazer justiça. É toda montada e operada para fazer teatro e legitimar uma rede e uma realidade em que bandidinho vagabundo e até inocentes acabem atrás das grades e bandido de grande calibre e contas milionárias continue por aí, livre, leve e solto.
Quando tem o título de "político", então, nem se fala. As polícias do Brasil, dos EUA, da Suíça, das ilhas isso e aquilo podem providenciar montanhas de provas e documentos, mas o que prevalece são os privilégios. Há excesso de habeas corpus, apelações, prescrições.
Os advogados são pagos a peso de ouro, não para defender, mas para empurrar com a barriga. Pedem incontáveis revisões e contam os anos, os meses e as horas para o crime prescrever. Enquanto isso, o ilustre cliente desfila pelas colunas sociais, senta em plenários e vai a tribunas fazer discursos incríveis como "representante do povo".
Então fica difícil torcer, acreditar. Como não ver, não ouvir, não falar? Como não escrever?

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