BENJAMIN STEINBRUCH
A CPMF é um péssimo tributo, porque eleva custos e impacta toda a cadeia produtiva brasileira
Durante as turbulências que vêm aterrorizando o mercado financeiro mundial, soube-se que o Tesouro brasileiro tinha em caixa, na semana passada, R$ 280 bilhões. Foi uma boa notícia para deixar claro que o Brasil tem como resistir a um possível agravamento da atual crise, nada mal para um país que tem sofrido de crônica escassez de recursos.
Obviamente, grande parte desse dinheiro em caixa já tem destinação específica em gastos futuros do governo federal. Mas há certa ironia no fato de que, ao mesmo tempo em que entesourava essa montanha de recursos, o governo resistia bravamente à idéia de abrir mão de um único centavo na arrecadação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira).
A CPMF foi criada ainda no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, em 1997, por insistência do então ministro da Saúde, Adib Jatene, para durar dois anos, num momento em que havia brutal falta de recursos nos hospitais. Em princípio, os recursos deveriam ser todos direcionados à saúde, mas ao longo do tempo foram desviados para outros fins. Neste ano, a arrecadação da CPMF deve atingir R$ 36 bilhões, por meio da taxação em 0,38% em todas as transações bancárias. Desse valor, 0,20 ponto percentual será repassado à saúde, 0,10 ponto, à Previdência, e 0,08 ponto, ao programa de erradicação da pobreza.
Pelo que se tem visto no Congresso, a cobrança da CPMF, já prorrogada seguidas vezes e que deveria terminar em 31 de dezembro, corre o risco de ser aprovada, ainda que parcialmente, para vigorar por mais quatro anos, até 2011.
A CPMF é um péssimo tributo, porque eleva custos e impacta toda a cadeia produtiva brasileira, ao ser cobrada em cada uma das fases da produção: do agricultor que compra a semente ou que vende a safra, dos transportadores, do industrial e dos consumidores no atacado e no varejo. O tributo é aplicado até mesmo sobre o pagamento de outros impostos, no momento em que se faz a operação bancária. Cada família brasileira gasta R$ 626 por ano com CPMF, diz o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário). q Falta bom senso nessa decisão de prorrogar a CPMF porque o momento favorável da economia brasileira, com arrecadação crescente do governo federal, seria uma ótima oportunidade para que o país pudesse começar a se livrar desse imposto perverso.
Como em muitas outras oportunidades, a posição irredutível do governo, com apoio até de parte da oposição -já que o PSDB foi o partido que bancou a criação do tributo e está constrangido em defender a sua extinção-, não faz nenhum sentido no momento em que há um crescimento surpreendentemente forte da arrecadação federal.
Se houvesse real intenção de estimular a economia, o país teria de caminhar imediatamente para buscar uma fórmula que permita a extinção desse imposto de péssima qualidade. No máximo, seria possível aceitar a manutenção da uma taxa mínima, simbólica, para facilitar a atividade fiscalizadora da Receita Federal.
É falso, portanto, o argumento central de que o governo federal não pode abrir mão de nenhuma receita neste momento. Os R$ 280 bilhões que estão em caixa no Tesouro Nacional são uma amostra do potencial arrecadatório.
É preciso avançar em matéria de desoneração fiscal, uma lição de casa que o país teimosamente vem se recusando a fazer durante duas décadas. A extinção da CPMF seria um bom início para esse avanço.
*
A CPMF é o imposto da vergonha, ou melhor, da falta de vergonha.
Um imposto provisório, criado para ser destinado à saude, tornou-se hoje moeda de troca no congresso nacional.
E a saúde pública continua na UTI, agora em estado terminal.
Este é o Brasil.
Lamentável!
Nenhum comentário:
Postar um comentário