LAIS FONTENELLE PEREIRA
O 12 de outubro é Dia das Crianças, mas a que preço? O que de fato celebramos nessa data: a criança ou o consumo?
"Filho, você comeu direito?". "Não esquece o casaco!". "Só mais uma história". "Já sei andar de bicicleta sem rodinhas!". Onde estão essas palavras? Está cada vez mais difícil escutarmos o riso das crianças, assim como suas verdadeiras necessidades. Vivemos imersos em imagens e sons que nos atravessam sem nos pedir permissão. A palavra foi substituída pela imagem. A coleção, pela aquisição. A atenção, pelo presente. O medo do lobo mau, pelo medo da realidade. O abraço, pelo objeto.
O desejo, pela necessidade, e a criança, pelo consumidor - antes mesmo de se tornar cidadã. O ter prevalece sobre o ser. Esse é o tempo do consumo e da descartabilidade.
No Brasil, 12 de outubro convencionou-se como o Dia das Crianças, mas a que preço? O que de fato celebramos nessa data: a criança ou o consumo?
Parece-nos que esse hábito é vivido pela maioria das famílias como um simples dever ao consumo.
O 12 de outubro foi proposto pelo deputado federal Galdino do Valle Filho em 1920 e oficializado como Dia das Crianças pelo presidente Arthur Bernardes em 1924. Porém, o dia passou a ser comemorado só em 1960, depois que a fábrica de brinquedos Estrela e a Johnson & Johnson criaram a Semana do Bebê Robusto. Um convite ao consumismo precoce.
Se fôssemos comemorar realmente a criança, por que não fazer em 20 de novembro, data da aprovação da Declaração dos Direitos das Crianças?
No mês das crianças, a publicidade surge com força total. Quando vemos que o valor gasto no Brasil em publicidade dirigida ao público infantil foi de aproximadamente R$ 210 milhões (Ibope) e que o valor do investimento no Programa Federal de Desenvolvimento da Educação Infantil (FNDE) foi de aproximadamente R$ 28 milhões, ficamos pasmos.
A publicidade participa da formação de nossas crianças tanto quanto a escola. O que é mais importante, esses objetos que prometem a felicidade ou a educação?
As crianças são desde cedo incitadas a participar da lógica de mercado. A forma como são olhadas e investidas pelos outros passa pela cultura do consumo. As expectativas em torno do nascimento, a escolha do nome e dos objetos e a reorganização da casa circunscrevem o lugar social no qual se constituirão a identidade e os valores do bebê.
As imagens publicitárias dirigem-se às crianças, o que é extremamente abusivo, pois até os 12 anos não têm capacidade crítica de entender o caráter persuasivo das mensagens. Até os quatro anos as crianças não conseguem diferenciar publicidade de programas. Conforme pesquisa norte-americana, bastam apenas 30 segundos para uma marca influenciá-las. Se pensarmos que a criança brasileira passa em média cinco horas por dia em frente à TV (Ibope, 2005), quanta influência da mídia ela sofre?
Esse problema se soma ao afastamento das brincadeiras.
Quem precisa de dez sapatos, três bolsas ou saber usar batom? Os pais foram desautorizados do poder, ou melhor, do seu saber, e a mídia se ocupou do papel de transmitir os caminhos da infância. Porém, o mercado - mídia ou anunciantes - assumiu isso pensando no lucro imediato, e não nas crianças ou no futuro da nação.
A infância não pode ser aprisionada pela falsa felicidade que a sociedade de consumo nos vende. Criança precisa de olhar, de palavras e de escuta. Precisa ter infância para ser criança. E os pais sabem o que é melhor para os filhos.
Nesse Dia das Crianças, troquemos o shopping pelo parque. Façamos brinquedos, em vez de comprá-los prontos. Troquemos as guloseimas pelo bolo feito no calor da cozinha.
Paremos para refletir. Olhemos para a infância que nos circunda e rememoremos nossa experiência infantil.
Assim, talvez possamos subverter a ordem estabelecida do consumismo desenfreado e encontrar uma forma mais sincera de homenagearmos nossas crianças.
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Apesar de já ter passado o Dia da Crianças, este texto vale uma boa reflexão.
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