31 outubro 2007

ORGULHOSOS, MAS CEGOS

CLÓVIS ROSSI

Por muito que passe o tempo nas estradas da notícia, por muito que o Brasil político convide ao ceticismo, já a caminho do cinismo, ainda assim há coisas que conseguem me espantar. Exemplo: a nutrida comitiva de políticos brasileiros que, chefiada pelo próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva, veio a Zurique para a confirmação do Brasil como país-sede da Copa de 2014.
Se fosse disputa, vá lá. Mas para uma mera confirmação?
Até eu já sabia que o Brasil estava escolhido havia meses. De todo modo, o tamanho da comitiva acabou sendo o espanto menor. Ao término da cerimônia oficial, aberta a sessão para perguntas, uma jornalista do Canadá, Erica Bouman, fez a pergunta mais ou menos óbvia sobre como o Brasil poderia garantir a segurança, em sendo um país perigoso, com grande número de mortes.
O presidente da CBF, Ricardo Teixeira, reagiu como se a pátria tivesse sido ultrajada. Desviou a questão para o tema da violência em outros países, o que é real, mas passa alegremente por cima do fato de que quem vai organizar a Copa de 2014 é só o Brasil.
Foi aplaudido furiosamente pela nutrida comitiva, como se tivesse resgatado a honra verde-e-amarela.
Pior: seus assessores puseram em circulação, como é de praxe no Brasil, uma teoria conspiratória. A repórter (da AP norte-americana) teria sido instruída por seu governo, supostamente interessado em assumir a Copa outorgada ao Brasil, se o país falhasse nas providências necessárias.
O técnico Dunga, um dos que espalhavam a suspeição, batia no peito, lamentava que os jornalistas brasileiros supostamente acreditassem na canadense (que, aliás, apenas apontava fatos reais) e reclamava: "Temos que ter orgulho de sermos brasileiros".
Tudo bem, mas temos também que ser cegos?

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