DANUZA LEÃO
A cada vez que fazem o que se costuma fazer nas datas certas, como todo mundo, sofrem, e muito
Ninguem decide ser inconformado; eles nascem assim, ou não.
O universo dos que não se conformam é único. Sem nem se dar conta, eles compram as revistas de moda só para fazer exatamente o contrário do que elas mandam. Se foi decretado que o amarelo é a cor desse verão, o inconformado não precisa nem pensar: antes de sair de casa, tudo funciona no piloto automático, e até que o amarelo saia de moda ele não será visto convivendo com nada dessa cor; talvez nem coma mais bananas, até a onda passar.
Ele estará sempre ou muito à frente do seu tempo, ou lá atrás, bem longe. Um inconformado não iria, por dinheiro nenhum, passar o Réveillon ou o Carnaval em Salvador ou Trancoso; para ele, isso é coisa de um passado remoto, já vivido, ou talvez de um futuro, um dia. Recentemente foi obrigado a deixar de lado o vinho rosé, de que gostava tanto - e até bebia com duas pedrinhas de gelo- para não fazer parte da turma que descobriu, em 2007, esse tão antigo vinho da Provence. Teve que rever seus gostos, pelo menos por aqui, para não fazer parte do mundo dos que seguem a moda de perto demais. Os inconformados sofrem.
Não que sejam pessoas difíceis; elas apenas gostam de andar na contramão, e isso em tudo. Um inconformado só freqüenta praias no inverno, não vai a restaurantes da moda, e seu roteiro internacional é, geralmente, um pouco de Paris, Veneza, Marrakech ou Capri - fora de estação, é claro. Nunca pisaram em Bali e estão esperando que passe a febre da Índia para poderem voltar a esse país tão lindo, hoje tão banalizado; preferem ficar em casa, inteiramente sós, a fazer parte de qualquer grupo que se guia por modismos.
Um inconformado detesta datas; não sabe do dia do aniversário de nenhum amigo e gostaria que esquecessem do dele. Quando pode, pega um avião, vai para bem longe e só volta uns dez dias depois da "data querida", mas nem sempre consegue se livrar; tem sempre um amigo ou uma amiga que lembra e dá os parabéns quando ele volta. E tem mais: se ninguém se lembrar, o inconformado é capaz de sofrer, se achando um rejeitado. Se não é fácil entender um inconformado, mais difícil é ser um deles.
O fim de ano dos inconformados é um verdadeiro suplício; quando vê um gorrinho de Papai Noel, os comerciais na TV anunciando o Natal, as guirlandas de luzinhas piscando, ele passa mal, e se alguém mandar um cartão de feliz Natal ou uma lembrancinha, quer se atirar pela janela. Passa tudo adiante imediatamente, mas felizmente empregadas domésticas e porteiros estão aí para isso mesmo. Entre 20 de dezembro e 6 de janeiro, em suas casas não entra uma só castanha, um só panetone, nada que lembre, de longe, o tal do Natal; e, se conseguir, durante esse prazo nem atende o telefone. Um problema, entender um inconformado.
Eles até tentam, mas não conseguem - e não por falta de esforço; a cada vez que fazem o que se costuma fazer nas datas certas, como todo mundo, sofrem, e muito. Depois de algumas tentativas, desistem, ficam como são, e pronto; mas fácil não é.
Basicamente, os inconformados não suportam ter que viver da maneira que foi determinada, seja lá por quem for, mas têm, pelo menos, um mérito: não obrigam ninguém a fazer o que eles querem, seja lá o que for.
Só um inconformado compreende outro inconformado, e como eles são poucos, geralmente passam a vida sós; sós e sofrendo, porque eles sofrem - mas preferem assim. Mas, de alguma maneira, não escapam de desejar, a amigos e a todos, um feliz Ano Novo.
Sendo assim, feliz 2008.
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