19 dezembro 2007

MEU PRATO DE NATAL

Diogo Mainardi

"A pena de morte é um assunto proibido, automaticamente associado aos piores brucutus da história. Mas, quando se tem 44 663 assassinatos por ano, como no Brasil, nenhum assunto pode ser tabu. Nem na noite de Natal"

Pena de morte. É um tema perfeito para o período de Natal. Enquanto as pessoas confraternizam com parentes e amigos, distribuindo presentes e bons sentimentos, eu confraternizo com a cadeira elétrica e a forca.

A pena de morte reduz consideravelmente o número de assassinatos. Para cada criminoso condenado à morte, ocorrem de três a dezoito assassinatos a menos. A estatística consta de uma reportagem do New York Times, de onde chupei os dados publicados nesta coluna.

A reportagem apresenta o resultado de uma série de estudos realizados na última década. Os economistas citados pelo jornal compararam as taxas de homicídio nos Estados Unidos com o número total de prisioneiros executados, estado por estado, cidade por cidade. Eles descobriram que, nos lugares em que a pena de morte foi aplicada com mais freqüência e com mais rapidez, como no Texas, a taxa de homicídios caiu de maneira mais acentuada.

Alguns especialistas contestaram os estudos. O principal argumento que eles usaram foi o seguinte: o número de penas capitais é insuficiente para determinar seu efeito. Em 2003, nos Estados Unidos, apenas 153 criminosos foram condenados à morte, para um total de 16 000 homicídios. Um professor de direito da Universidade da Pensilvânia declarou ao New York Times que precisaria de 1 000 presos executados alea-toriamente para poder concluir algo definitivo a seu respeito. Por acaso ele aceitaria 1 000 presos brasileiros?

O fato é que os estudos mencionados pelo jornal indicam que há, sim, uma correlação direta entre a pena de morte e a queda no número de assassinatos. Pelas contas do economista H. Naci Mocan, cada execução acaba salvando cinco vidas. Apesar disso, ele afirmou ser pessoalmente contrário à pena de morte. Porque há outros fatores em jogo: morais, religiosos, políticos.

Na ceia de Natal, entre uma fatia e outra de panetone, o assunto pode ser este: se eletrocutar um assassino realmente salva vidas, há um ponto em que a barbárie da pena de morte se torna moralmente aceitável? Um professor de direito da Universidade de Chicago, Cass R. Sunstein, respondeu ao New York Times: "A evidência de que ela teria um efeito dissuasório significativo parece suficientemente plausível para tornar complicada a questão moral. Eu era contrário à pena de morte, mas passei a considerar que, se ela tem um efeito dissuasório significativo, provavelmente é justificável".

O professor da Universidade de Chicago tem um bom motivo para medir as palavras. Nos meios intelectuais, discute-se alegremente a tese de Steven Levitt, segundo a qual o aborto reduziria o número de assassinatos. Até mesmo o governador do Rio de Janeiro embarcou nessa, uma prova de que a idéia é falsamente provocatória. Já a pena de morte é um assunto proibido, automaticamente associado aos piores brucutus da história. Mas quando se tem 44 663 assassinatos por ano, como no Brasil, nenhum assunto pode ser tabu. Nem na noite de Natal.

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