MELCHIADES FILHO
A literatura técnica sobre greves de fome é escassa. Uma convenção internacional proíbe experimentos com voluntários, como ocorria até o século 19, e dá ao manifestante o direito de rejeitar monitoramento médico. Estudos sobre desnutrição não servem, pois as reações à privação absoluta de alimento são outras. Sem falar que o metabolismo varia inclusive em um mesmo indivíduo.
Há um consenso, no entanto, sobre o "roteiro" que o corpo obedece quando desprovido de nutrientes.
A primeira fase raramente causa seqüelas. O fígado quebra reservas de glicogênio em glicose (açúcar).
A segunda, após alguns dias, já traz perigos. A queima de gordura produz ácidos. Um, tóxico, é eliminado na urina e via expiração. A alta concentração dos outros reduz o pH do sangue. Boca e pele secas, aumento de micções, prostração e hálito frutado são sintomas de cetoacidose, que pode levar a complicações cardíacas e cerebrais.
Com a perda de um quinto do peso, o organismo entra na terceira etapa. Baixa o ritmo metabólico e passa a consumir, indistintamente, proteínas estocadas em tecidos de músculos e órgãos. Devastador.
Mahatma Gandhi nunca estendeu uma greve de fome além do 21º dia. Dos prisioneiros do IRA que jejuaram em 1981, na tentativa de obter status político, o primeiro morreu no 46º dia; o último, no 73º.
Dom Luiz Cappio está no 22º. Ao contrário dos irlandeses, ingeriu soro caseiro: sal para manter a pressão arterial e açúcar para repor energia. Em tese, terá muitos dias de lucidez (e beijos de Letícia Sabatella, fotos com Suplicy, entrevistas por celular etc.) pela frente.
Por ora, quem agoniza é o governo, surpreendido pela cruzada herética contra as obras do São Francisco e ciente do estrago político que ela causará. Lula sabe que não pode reeditar Margaret Thatcher e "cumprir o desejo do suicida". Mas fazer o quê? Mandar o ministro Geddel fechar a boca também?
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