10 dezembro 2007

ENFIM, UM COLUNISTA SEM ESTILO

Diogo Mainardi

"Na lista de Época, tornei-me o emblema do que o país tem de pior. O último desqualificado que mereceu um tratamento análogo por parte de Época foi o caseiro Francenildo. Meu sigilo bancário também foi violado?"

Época publicou uma lista das 100 pessoas mais influentes do Brasil. Eu estou lá. Eu e outros 99. Os outros 99 destacaram-se como "exemplos de força moral". Só eu fui eleito por minha perniciosidade. Só eu me notabilizei por infectar meu campo de trabalho. Tornei-me o emblema do que o país tem de pior. O último desqualificado que mereceu um tratamento análogo por parte de Época foi o caseiro Francenildo. Meu sigilo bancário também foi violado?

Na lista de Época, Lula é comparado a Getúlio Vargas, "o brasileiro mais influente da história". Dilma Rousseff é "decidida, racional, entusiasmada, companheira". Época é apartidária: bajula à direita e à esquerda. José Serra aparece como um "dos brasileiros mais preparados da atualidade, técnica e politicamente". Sérgio Cabral "sempre sonhou com um Brasil melhor". José Sarney é nosso "camisa 10". Fernando Henrique Cardoso é festejado pelo "conteúdo social" de seu governo.

Além de mim, mais seis colunistas foram selecionados por Época. Um deles é descrito como espirituoso, cáustico, douto. Outro é virulento, culto, desencantado. De acordo com o perfil que acompanha meu nome, eu sou o contrário disso tudo: deselegante no estilo e descompromissado com os fundamentos do bom jornalismo, tenho "todas as características que deveriam levar-me à irrelevância". Mas estarei "na lista dos jornalistas mais barulhentos e mais comentados do país" enquanto Lula permanecer no poder, por causa daqueles "que simplesmente abominam o governo petista".

O perfil de Lula foi assinado por Fernando Abrucio. O de Sérgio Cabral, por seu pai. O de Abilio Diniz, por sua filha. O de Paulo Coelho, por seu biógrafo Fernando Morais. O de Ivete Sangalo, por Gilberto Gil. O de Oscar Niemeyer, por Lula. As 100 pessoas mais influentes do Brasil foram retratadas por seus familiares ou admiradores. No meu caso, aconteceu algo diferente. Época pediu um artigo a meu respeito a Lucas Mendes, meu colega no Manhattan Connection. O artigo, entregue na data combinada, foi elogiado por quem o encomendou. Na última hora, porém, trocaram-no por outro, anônimo.

Paulo Nogueira, diretor editorial de Época, responsabilizou-se pela lista. Se ele fez o meu perfil, eu também posso fazer o dele. De sua passagem por VEJA, duas décadas atrás, ninguém consegue se lembrar. Sabe-se apenas que, enquanto seus colegas eram promovidos, sua carreira empacava. Hoje em dia, como eu, Paulo Nogueira tem uma coluna. A minha é publicada em VEJA. A dele, na revista Criativa. Uma amostra de seu estilo elegante: "Me pergunto se há coisa mais fascinante para uma mulher do que atrair assovios de homens na rua". Uma amostra de sua sabedoria: "Somos escravos da opinião dos outros. O importante é que você se respeite, não que os outros o respeitem". A coluna de Paulo Nogueira é chamada O Homem Sincero. Apesar de tanta sinceridade, ele esconde seu próprio nome, identificando-se como Fabio Hernandez.

A lista de Época reflete um desejo difuso de ter uma imprensa domesticada, subalterna, colaboracionista. O Homem Sincero corresponde perfeitamente ao papel. Só lhe falta uma coisinha: leitores.

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