01 novembro 2007

INTEGRANTES DE CPI VÃO DE GRAÇA A SHOW PAGO PELA TAM

Folha de S. Paulo

Congressistas e autoridades ganham convites para ver Cirque du Soleil em Brasília

Juniti Saito e Gilberto Carvalho compareceram; TV Globo e Bradesco também distribuíram convites para sessões do espetáculo

Uma semana antes da votação do relatório final da CPI do Apagão Aéreo no Senado, a TAM, um dos objetos da investigação, distribuiu 400 ingressos do espetáculo "Alegría", do Cirque du Soleil, a congressistas e autoridades em Brasília, entre eles o comandante da Aeronáutica, Juniti Saito, o presidente da CPI, Tião Viana (PT-AC) -hoje presidente interino do Senado-, e mais quatro integrantes da comissão.
Todos eles compareceram ao espetáculo, fechado pela TAM só para convidados -cerca de 1.600, entre eles clientes, jornalistas e beneficiários de entidades assistenciais. O evento ocorreu na noite de quarta-feira da semana passada.
O relatório aprovado ontem pela comissão sugere que as empresas aéreas sejam auditadas por conta da crise aérea.
Anteontem, o Cirque du Soleil apresentou o "Alegría" em sessão fechada, dessa vez bancada pela TV Globo, para funcionários, deputados, senadores e autoridades convidadas, como o ministro do STF Marco Aurélio Mello, que "bailou" com um cantora do espetáculo, e Gilberto Carvalho, chefe-de-gabinete de Lula.
"Recebi um convite de amigos, não levei em conta essa questão. Nunca saio do Palácio, não tomei ciência do preço do ingresso. De fato, há um código de ética, deveria ter tomado esse cuidado", disse Gilberto.
"Demos lá umas rodadas. Estranhei um pouco porque geralmente nós conduzimos a dama. E ela, talvez por ser uma atriz, procurou conduzir. Depende da platéia avaliar, mas acho que não fui tão mal", disse Marco Aurélio, que não vê inconveniente no convite.
O Bradesco também realizou três sessões fechadas para convidados, entre eles congressistas e autoridades.
Os políticos e as autoridades que foram de graça ao espetáculo e as empresas que distribuíram os ingressos disseram não ver conflito de interesse na situação. Elas não forneceram as listas dos convidados.
O grupo canadense Cirque du Soleil está em turnê pelo Brasil e estreou na capital federal em 19 de outubro. Os ingressos vão de R$ 150 a R$ 450, e as autoridades foram colocadas, geralmente, nos lugares cujos ingressos são os mais caros.
"Não vejo qualquer relação com a CPI. É vínculo zero, não houve nenhum contato com diretor", argumentou Tião Viana. "Ali dava quórum para votação no plenário", brincou Ideli Salvatti (SC), líder do PT e também membro da CPI.
A Folha confirmou que os outros três integrantes da comissão que assistiram ao espetáculo na quarta da semana passada são Romero Jucá (PMDB-RR), Sérgio Guerra (PSDB-PE) e Inácio Arruda (PC do B-CE).
Vários outros senadores também foram ao evento, como José Nery (PSOL-PA), Eduardo Suplicy (PT-SP) -que disse ter sido convidado pela "produção do evento"-, Augusto Botelho (PT-RR), Marco Maciel (DEM-PE), Heráclito Fortes (DEM-PI) e Pedro Simon (PMDB-RS). "O que a gente comentou lá é que eles poderiam melhorar um pouco o atendimento do passageiro em vez de gastar aquela montanha de dinheiro", disse Simon.
Alguns senadores convidados pela TAM disseram ter recusado. "Comprei ingresso e fui com minha família outro dia. Deu R$ 1.037. Não aceitei os convites, até porque eu estou batendo muito nisso [crise aérea]", disse Mário Couto (PSDB-PA), da CPI. Outros lamentaram não terem sido convidados. "Me deixaram de fora dessa. Queria ir, mas fui olhar o preço dos ingressos e dava R$ 1.000", disse Sibá Machado (PT-AC), também da CPI.
"Comprei ingresso para 9 de novembro. Não posso fazer prejulgamento. Você tem os camarotes de empresa no Carnaval, na festa de Parintins [AM]. Soube que a TAM convidou, que a Globo convidou, mas não aceitei porque já havia comprado", disse o senador José Agripino (DEM-RN). "Eu não, que convite o quê? Comprei ingresso e fui na sexta. Vocês da Folha me amam, hein?", reagiu Wellington Salgado (PMDB-MG), membro da CPI.
Criado em comemoração ao décimo ano do Cirque du Soleil, em 1994, o "Alegría" é o segundo espetáculo do grupo - que já havia vindo ao Brasil.


Senadores afirmam não ver "conflito de interesses"

Senadores que assistiram ao show como convidados da TAM dizem não ver conflito de interesse pelo fato de a empresa ser investigada no Congresso. Para a companhia aérea, promover sessões fechadas "é uma das propriedades de relacionamento desse patrocínio".
"A TAM informa que apóia projetos culturais e, desde o ano passado, é patrocinadora dos espetáculos do Cirque du Soleil apresentados no Brasil. Desta forma, a realização de sessões fechadas nas localidades onde o grupo faz suas apresentações é uma das propriedades de relacionamento desse patrocínio", disse, em nota. Segundo a TAM, foram 400 ingressos para autoridades, congressistas e jornalistas.
Presidente interino do Senado, Tião Viana (PT-AC), que chegou a comandar a CPI do Apagão Aéreo, disse que recebeu dois convites porque é cliente "fidelidade vermelho" -plano de milhagens da TAM.
"O convite era no dia que minha esposa podia ir, não vejo qualquer relação com a CPI, é vínculo zero, não houve nenhum contato com diretor. Poderia não ter ido naquele dia e ir hoje [ontem], que foi a Globo que deu quatro [convites]. Se fosse da Folha também iria, não vejo maldade", disse Tião.
Ideli Salvatti (PT-SC) disse que o fato de ter ido a convite "não muda nada sua posição sobre a CPI". Ela ironizou: "Ali, dava quórum para plenário".
Eduardo Suplicy (PT-SP) afirmou que foi ao espetáculo atendendo a um chamado da organização do evento e não sabia que era da TAM. Augusto Botelho (PT-RR) disse que "só foi por insistência de Suplicy".
"Se há alguém que a TAM não deve gostar sou eu, que briguei pela Varig. Pensei que tinham comprado o ingresso, fiquei sabendo quando estava lá", disse Pedro Simon (PMDB-RS). "Não interfere em nada, não muda minhas posições, inclusive sobre os serviços prestados pela TAM", afirmou Sérgio Guerra (PSDB-PE).
Heráclito Fortes (DEM-PI) e Marco Maciel (DEM-PE) afirmaram por meio de assessoria que "não há conflito de interesses". Romero Jucá (PMDB-RR) não comentou.
O ministro Marco Aurélio Mello disse que "de forma alguma" vê empecilho ao fato de ter aceitado convite da Globo. "Havia várias autoridades e não se pode vislumbrar aí qualquer comprometimento. O dia em que um juiz for alcançado na sua honorabilidade por um convite para espetáculo circense, estará muito vulnerável, e isso será péssimo à sociedade."
O Bradesco afirmou, por meio da assessoria, que convidou clientes de varejo, "prime", "private", empresarial, "corporate", acionistas, funcionários e parceiros, e que, entre eles, havia congressistas e autoridades que não são clientes, mas em número reduzido.
A assessoria da Central Globo de Comunicação disse que o evento de anteontem foi destinado a funcionários -cada um recebeu dois convites. Mas que, como havia muitos lugares, foram convidados também "fornecedores, clientes, integrantes do mercado publicitário, parceiros em projetos sociais e autoridades". Informou ainda que foram convidados "o público com o qual a Globo tem relacionamento".
A assessoria da Aeronáutica não comentou a presença do comandante, José Nery (PSOL-PA) está no exterior e Inácio Arruda (PC do B-CE) não ligou de volta.

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