ALBA ZALUAR
Um oficial da Polícia Militar do Rio de Janeiro, meu  amigo, argumentou corretamente que a diferença entre as  pessoas na Europa e no Brasil é  que, aqui, quando se põe uma placa  "é proibido pisar na grama", tem-se que acrescentar dois policiais  junto dela para que seja obedecida. 
Em compensação, na Europa,  diz-se que, despojados da proteção  que as redes de vínculos sociais  mais permanentes forneciam, os  indivíduos tornam-se mais sozinhos, vulneráveis e inseguros. Com  os laços de parentesco e de vizinhança frouxos ou inexistentes, o  que afeta principalmente os mais  ricos, adquirem um medo líqüido,  sem eira nem beira, nem origem  nem limites. 
No Brasil, a imprevisibilidade  não advém apenas das mudanças  no mundo do trabalho decorrentes  da globalização. Os laços sociais de  vizinhança e parentesco estão mais  bem mantidos que no Primeiro  Mundo. Mas o errático chega como  bens e serviços essenciais de um  modo quase que desconhecido por  lá. A população estarrecida se pergunta: em quem e no que confiar? 
O medo do avião piorou e foi  acrescido do medo de aeroporto,  de fazer churrasco, ou brincar no  quintal, ou ver televisão dentro de  casa em áreas residenciais perto de  algum campo de onde saem e caem  aeronaves. 
O pão nosso de cada dia, comprado por não ter gordura e não fazer  mal ao coração, tira zero nos testes  feitos de seus verdadeiros ingredientes. Os fabricantes dizem que  está tudo bem. 
O leite das crianças pode conter  soda cáustica e água oxigenada.  Mas os responsáveis pela composição do leite dizem que isso não faz  mal à saúde. 
Brinquedos de criança contêm  substâncias altamente tóxicas e  são vendidos legalmente! A fiscalização chegou depois.  Deus nos acuda, ou a lei nos proteja a todos. 
No Brasil, a confiança nos bens  também corre o risco de se liquefazer por causa do amor exclusivo ao  dinheiro. Não há mercado que resista a isso, nem mesmo aquele mínimo de previsibilidade necessária  à convivência humana. 
No mercado ilegal, sujeito a operações militares onde padecem  tantos, a maconha parece ser mais  inofensiva. Mas criou-se uma guerra, que não é civil por envolver a  violência legítima do Estado, para  combatê-la. Legítima? 
Talvez haja uma conexão entre o argumento do oficial PM e a insegurança da população. E esta deve ser: para que servem as leis se, no Brasil, sempre aparece alguém que se coloca acima delas? Para o capitalismo funcionar é, portanto, preciso que ele seja acompanhado pelo Estado de Direito, no qual as leis valem para todos.
Então vamos combinar: nem tudo é culpa da Polícia Militar.
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