CLÓVIS ROSSI
À primeira vista, é razoável supor que o derrotado no plebiscito venezuelano de domingo foi o Hugo Chávez do futuro, aquele que pretendia perpetuar-se no poder (sua última menção ao ano em que deixaria o posto foi para cravar 2050, quando teria provectos 96 anos).
É claro que a derrota respinga também - e fortemente - no Hugo Chávez do passado e do presente, aquele que está no poder desde 1999. Mas esse Chávez detém ainda uma dose formidável de popularidade, atestada pelo melhor metro dos humores latino-americanos que é o Latinobarómetro.
Chávez é tão popular internamente quanto é impopular fora da Venezuela, a ponto de perder até para o "diabo", mais conhecido como George Walker Bush, nos outros países latino-americanos, proeza formidável.
Na Venezuela, no entanto, ele só perdeu porque uma impressionante fatia de seus seguidores deixou de votar. A abstenção (44,11%) quase duplica a da eleição presidencial de 2006 (25%).
Posto de outra forma: entre sancionar a reeleição indefinida, não desejada, e "trair" o caudilho, votando "não", um pedaço do "chavismo" escolheu ficar em casa. Essa é a leitura mais lógica, com a ressalva de que América Latina e lógica nem sempre são parentes.
Que diferença faz essa leitura, se correta, argumentarão as pessoas práticas que olham o placar e vêem 50,7% contra Chávez e 49,29% a favor? O presidente perdeu. Ponto.
A diferença é a seguinte: a oposição não pode acreditar que o placar indica que ela é majoritária. O "não" teve pouco mais de 28% do total de votos possíveis.
Ou, traduzindo politicamente: a era dos caudilhos eternos parece encerrar-se na América Latina, mas não a era dos dirigentes atentos, real ou demagogicamente, às necessidades das massas pobres - chamem-se populares ou populistas.
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