05 novembro 2007

REELEIÇÃO, SÓ UMA

Editorial da Folha de S. Paulo

Petistas de segundo escalão testam reação à idéia de terceiro mandato para Lula: a melhor resposta é o repúdio

Devanir Ribeiro está sempre na vanguarda das causas indigestas do PT. Amigo do presidente Lula desde o tempo heróico do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, granadeiro aguerrido no batalhão que absolveu mensaleiros na Câmara, o deputado agora assume o papel de bandeirante do terceiro mandato.
Ribeiro é desbravador a serviço de um protagonista que ainda não está em cena. O petismo começa a preocupar-se com 2010 e com a perspectiva de ver-se alijado do poder federal, que abriga 5.000 militantes do partido. Sem candidato natural à sucessão, os murmúrios de queremismo naquele que já foi chamado de "Partido da Boquinha" encontraram seu primeiro porta-voz.
O deputado cumpre uma missão precursora, para testar a receptividade da idéia. As cúpulas do governo, a começar de Lula, e do partido, metidas numa negociação duríssima com a oposição no Senado, também honram o protocolo e "desautorizam" a movimentação continuísta. Mas ela não parou até agora, sinal de que nem Planalto nem PT agiram para bloqueá-la.
Muita gente no governismo está curiosa para saber as conseqüências do "factóide" lançado pelo deputado Devanir Ribeiro -no mínimo para ter noção dos custos implícitos numa campanha pelo terceiro mandato presidencial. A melhor resposta da opinião pública é deixar claro que tais custos são proibitivos.
A reeleição aumentou as opções para o eleitorado brasileiro, que passou a ter o direito de estender por uma vez o mandato de governantes que aprova. Pela regra em vigor desde o pleito de 1998, o inconveniente de retardar a necessária alternância no poder fica suplantado pelo benefício da continuidade administrativa, pois quatro anos é um período curto para a consecução de uma boa gestão pública.
Tal avaliação muda radicalmente no caso de um período de 12 anos ou mais. O Executivo no Brasil, em especial a Presidência da República, é incontrastável na concentração de poder. A probabilidade de que o presidente se converta num caudilho e vá minando as instituições cujo papel é fiscalizar e moderar a força do Planalto cresce exponencialmente num mandato longo.
Os EUA, fonte de inspiração do presidencialismo brasileiro, descobriram essa ameaça na prática, mesmo num momento especialíssimo de sua história. Depois da quarta vitória seguida de Franklin Roosevelt, em 1944, limitaram a reeleição a uma única vez.
De resto, a democracia no Brasil precisa valorizar a estabilidade nas regras fundamentais da luta pelo poder. Não faz sentido modificar um sistema -a reeleição limitada a um termo- que foi implantado há apenas dez anos e cujos resultados iniciais são positivos.
A confusão de princípios e o mudancismo casuísta são tamanhos que há gente propondo o terceiro mandato, enquanto outros querem acabar com a reeleição. Esse clima de ameaça permanente aos pilares da disputa política não faz bem ao país.
Os políticos fariam melhor se concentrassem suas energias em responder a duas intervenções recentes do Supremo Tribunal Federal: devem ao país um estatuto coerente para a fidelidade partidária e o restabelecimento da chamada cláusula de barreira.

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