Diogo Mainardi
"A mulher de Franklin Martins me telefonou. Eram 10 da noite. Falamos por mais de uma hora. Muito educadamente, ela me apresentou seu curriculum vitae e perguntou que cargo eu autorizaria que ela ocupasse a partir de agora, com a ida de Franklin Martins para o ministério de Lula"
Ninguém mais quer derrubar o Lula. Eu quero. Eu o derrubaria todas as semanas. Em vez de perder tempo comigo, leia atentamente a reportagem sobre Jader Barbalho. Se dependesse de mim, o caso derrubaria o presidente agora mesmo. O que falta para pedir a abertura de uma CPI da Bandeirantes? O que falta para responsabilizar Lula pelo rolo de 80 milhões de reais?
Deve ser bom derrubar um presidente. Deve ser bom derrubar qualquer político. Apesar de meu fervor golpista, só tenho o poder de nomeá-los. Eu nomeei Franklin Martins. Ele virou ministro porque foi afastado da Rede Globo. E ele foi afastado da Rede Globo porque mostrei que sua mulher era assistente parlamentar do então líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante.
Outro dia a mulher de Franklin Martins me telefonou. Eram 10 da noite. Falamos por mais de uma hora. Muito educadamente, ela me apresentou seu curriculum vitae e perguntou que cargo eu autorizaria que ela ocupasse a partir de agora, com a ida de Franklin Martins para o ministério de Lula. Respondi que ela poderia ocupar qualquer cargo no funcionalismo público, menos um cargo comissionado, como o que tinha no gabinete de Aloizio Mercadante. Ela achou ruim. Muito ruim. Para lá de ruim. Ponderou que, sem um cargo de comando, à altura de sua capacidade profissional, acabaria limpando as botas dos apadrinhados dos políticos. Repliquei que ela teria de se contentar em limpar as botas dos apadrinhados dos políticos enquanto seu marido fosse ministro. É isso: sou um fracasso na hora de derrubar o presidente, mas posso decidir o emprego do ministro e da mulher do ministro. Já tenho um futuro como lobista. No melhor dos casos, serei parceiro de Lulinha. No pior, de Vavá, o irmão de Lula.
A popularidade de Lula impediu até hoje que ele fosse derrubado. Eu refletia a respeito do assunto enquanto lia Os Homens que Mataram o Facínora, livro que narra a história dos soldados que perseguiram, assassinaram e degolaram Lampião. O fato de refletir a respeito de Lula durante a leitura de um ensaio sobre cangaceiros pode indicar uma certa obsessão de minha parte. É verdade. Ocupei-me de Lula por tanto tempo que o caso já se tornou patológico. Vejo sua imagem estampada em todos os lugares. Vejo-a na mancha de café do sofá da sala. Vejo-a no bolor do queijo parmesão. Vejo-a na marca de suor da camisa do porteiro. É meu sudário blasfemo.
Sociedades arcaicas tendem a cultuar o banditismo. Foi assim na Inglaterra do século XIV. Foi assim na Itália do século XVI. A gente ainda está estacionado nessa fase. Por isso os cangaceiros entraram para o imaginário nordestino. Por isso Lula foi reeleito. Mas um dia tudo muda. Como eu sei? A marca de suor na camisa do porteiro mostrava uma cabeça degolada.
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