CLÓVIS ROSSI
O presidente Lula produziu uma frase que poderia perfeitamente servir de dístico para o poder público brasileiro, o atual e todos os anteriores: "Em determinados cargos, a gente não diz aquilo que pensa nunca, a gente faz quando pode e, se não pode, a gente deixa como está para ver como é que fica".
Temos aí um condensado da hipocrisia, da mentira, da falta de transparência, numa ponta (a de nunca dizer o que pensa). Na outra, a versão moderna do Jeca Tatu ("o deixa como está"). Ou uma versão menos elaborada da "utopia do possível", o lema de seu antecessor Fernando Henrique Cardoso, tão medíocre quanto o dístico de Lula.
Daria para citar mil casos em que o "deixa como está para ver como fica" produziu um país francamente obsceno pela miséria, pela desigualdade, pela corrupção e todos os etcs. conhecidos. Mas, para ficar apenas na mais estrita atualidade, deixou-se Congonhas como está, e o que ficou foram centenas de cadáveres carbonizados. Como bem mostrou ontem Igor Gielow, a localização de Congonhas é incompatível com o movimento do aeroporto. No entanto, sucessivos governos foram tolerando não só a manutenção do aeroporto como a sua constante ampliação. Hoje, Congonhas opera com 50% mais passageiros que sua capacidade.
Pode até ser que o desastre com o avião da TAM acontecesse em qualquer outro sítio, mas as chances de reduzir o número de mortos aumentam exponencialmente à medida que a localização do aeroporto se afasta de áreas densamente povoadas. Acidente à parte -e até que se saibam suas causas-, o "deixa como está" no transporte aéreo levou ao caos nos aeroportos brasileiros, em especial em Congonhas. Mais ainda quando chove. Mas, como não se pode evitar que chova, deixa como está. Fica como ficou.
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Triste lema!
O Brasil não merece isso.
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