08 maio 2007

ESPÓLIO SEM CLASSE

RUY CASTRO

Depois do desmantelamento da Varig, voar, que costumava ser uma atividade entre brasileiros adultos e consentidos, tornou-se brincadeira de criança. No mau sentido. Assim a entendem as empresas que herdaram o espólio da Varig, mas não a sua classe.

Nos aviões dessas empresas, as poltronas parecem adaptadas para menores de 11 anos. A distância entre os dois braços indica a preferência por tóraxes ainda pouco desenvolvidos -meninos que nadem ou façam judô terão tanta dificuldade quanto um adulto para caber ali. Abrir a mesinha também só será possível se o guri não tiver o menor traço de obesidade, coisa rara, hoje, nesse mundo rico em calorias.

Note que estamos falando de crianças. Mas, se forem adultos os passageiros, e você um deles, chegue cedo ao balcão para pegar um lugar na fila do corredor. Assim, quando o vizinho do meio espremê-lo para fora, você terá para onde transbordar - mas não muito, porque, quase roçando o seu braço, começa a outra fileira. Já o ocupante da janela terá de abrir a própria se quiser dar um conforto ao braço.

Se você for premiado com a poltrona do meio, torça para não ser ladeado por dois homens de paletó. Em caso positivo, reze para que os alfaiates tenham sido comedidos nas ombreiras. Mas, se forem dois americanos folgados, podem estar até de camisa havaiana - você será ensanduichado do mesmo jeito.

Quase ao fim do vôo, as aeromoças, outrora tão orgulhosas de suas funções, são obrigadas a converter-se em faxineiras e sair recolhendo a xepa. Os vôos dessas empresas não oferecem jornais como leitura de bordo porque, afinal, crianças não lêem jornais. E comida de adulto também não tem. Por sorte, quando a fome aperta, a moça aparece e nos oferece uma barrinha de cereal com Tota-Tola.

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