Reinaldo Azevedo
O ataque do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, à imprensa brasileira, em especial ao jornal O Globo, é inaceitável. O bufão estava aqui como convidado e recebia uma homenagem — de resto, ridícula — na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro (leia abaixo). Brandindo o jornal, protestava contra um texto que lembrava as óbvias incongruências entre o regime que ele comanda e os compromissos do Mercosul com a democracia.
Na galeria, um charabiá esquerdopata juntava zurrados, relinchos e urros, numa impressionante diversidade de quadrúpedes morais. O coronel — um chefe de Estado! — comandou pessoalmente uma vaia ao jornal. Seria uma atitude desrespeitosa também com o governo brasileiro, não fosse o presidente Luiz Inácio Lula da Silva seu aliado incondicional. Acho um engano da generosidade supor que possa haver alguma divergência importante entre o Apedeuta brasileiro e o milico venezuelano. Ao contrário: as relações entre os dois países só fazem se estreitar. Isso é estratégico. O resto é tático.
Quando classifico o episódio de “inaceitável”, não estou me deixando mover por qualquer impulso corporativista — eu nem mais sou dono de revista, hehe... — ou por um sentimento, sei lá, parente do patriotismo. Isso é bobagem. Não devemos aceitar é que um ditador vagabundo, que censura a imprensa e ameaça jornalistas com a cadeia — num país em que Legislativo e Judiciário já passaram pela fagocitose autoritária —, venha lançar sua baba hidrófoba contra a imprensa de um país que vive plenamente a democracia, a despeito dos arreganhos autoritários do PT e das penas de aluguel.
Sim, é o caso de se cobrar o pronunciamento do governo brasileiro — um dos fiéis depositários da Constituição, que assegura a liberdade de imprensa —, das entidades de classe dos jornalistas (quem quer apostar a mão que a Federação Nacional dos Jornalistas e os sindicatos vão ficar de bico calado?), das empresas de comunicação, dos políticos, das entidades representativas da sociedade civil, dos presidentes da Câmara e do Senado, dos governadores, de todo aquele, enfim, a quem cumpre ser protagonista na defesa das liberdades públicas quando ela é atacada.
Sabem o que penso. As eventuais diferenças entre Chávez e Lula me parecem irrelevantes. O Brasil é hoje o principal fiador político da ditadura venezuelana. Os laços entre os dois países, sob o governo petista, não fazem senão se estreitar. Marco Aurélio Garcia já fala no Brasil como uma espécie de gestor de um modelo de “substituição de importações” na Venezuela. Escrevi sobre isso ontem. Vejam lá. Chávez é o retrato do perfeito idiota latino-americano, mas seus passos jamais são ignorados pelo Brasil.
Aquela excitação quadrúpede que emanava das galerias expressava o juízo que o próprio PT — e quase toda a esquerda — faz da imprensa. Eles querem censura. Eles querem cassar concessões, eles querem silenciar as dissensões, eles querem impor o “seu” consenso. Já não lhes basta mais aparelhar praticamente todas as redações do país com sua ideologia perturbada. Por isso gostam tanto do coronel. Ele lhes oferece ação direta e emoções baratas.
Mas que ninguém se engane. O chefe estratégico dessa onda chama-se Partido dos Trabalhadores. E seu líder inconteste é Lula. É como se o Apedeuta estivesse ali, ele próprio, comandando a vaia à democracia. Tudo o mais constante, é só questão de tempo.
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