Anna Veronica Mautner
[...] DIANTE DA INSEGURANÇA DOS ADULTOS, RESTA À LITERATURA RESGATAR PARA O JOVEM A POSSIBILIDADE DE NOVAS PERCEPÇÕES
Juventude procura porta-voz. Pode ser sábio, mas não autoritário. Deve ser capaz de dizer a coisa certa sobre dúvidas, não importa se para o corriqueiro ou para o excepcional.
O pensamento mágico que chegava pela voz de fadas, bruxas, monstros e heróis tem cada dia menos utilidade prática. Criados num mundo atravessado pelo saber da ciência, os jovens não encontram na experiência passada orientação para viver no século 21.
O bom senso de Dona Benta não dá conta dos problemas do jovem moderno. Ela tem de virar "Dra. Benta" para ensinar a viver com tudo de novo que a ciência introduziu no dia-a-dia.
Onde está a mãe, o pai ou o avô que sente firmeza em orientar a ação, os sentimentos e as dores dos filhos? O transcendente e o cotidiano tiveram sua essência modificada pelas ciências do comportamento. O apoio para os momentos difíceis teve de ser inovado.
É aí que entra a "nova ficção", ou relato de aventuras emocionais. Para adultos cujas vidas também se complicaram, há uma infinidade de títulos da chamada "auto-ajuda", que nada mais é do que a intenção de substituir o bom senso, outrora tão valioso. Tais livros ensinam desde a escrever um currículo até a lidar com a depressão.
A linguagem dos livros de auto-ajuda bate de frente com a ânsia de autonomia do jovem.
Ele não aceita receitas nem soluções de cuja concepção não participou. É próprio aos jovens ansiar por resolver a vida, surdos às pregações dos adultos. Daí a atemporal importância das fábulas e das parábolas na tarefa de orientar.
O jeito é palpitar por meio da ficção. É chegado o momento de editar livros que falam de angústias de gordinhos, medo do sexo oposto, pânico da humilhação. As conseqüências psicológicas dos conflitos familiares, de doenças, da morte e do abandono são temas aos quais a sabedoria das avós tem hoje pouco a acrescentar.
Livros de aventura na selva chegam em filmes melhor apresentados. Como o adulto não se sente eficiente para bem orientar os jovens, é chegada a hora dos artistas. Por meio daquelas histórias, o jovem pode, identificando-se, situar-se diante do moderno.
Sair da infância, adolescer e amadurecer é uma aventura para ninguém botar defeito.
Parece-me que, diante da insegurança dos adultos, resta à literatura resgatar para o jovem a possibilidade de novas percepções sem obedecer à voz imperativa de um adulto.
Harry Potter é um exemplo dessa tendência. São livros que falam de um modo de viver diferente, como uma obra de auto-ajuda disfarçada de aventura. O palpite chega sem verbo no imperativo, envolto por uma linda historia, onde conflitos se resolvem de um jeito novo.
Os jovens agradecem as modernas formas de esclarecer e fazer pensar sem o peso da autoridade outrora decretada pela "moral da história".
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Incentivemos nossos filhos a ler.
Uma boa leitura faz muito bem.
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