29 setembro 2007

AGRICULTURA E INFLAÇÃO

ROBERTO RODRIGUES

Nos últimos anos, o Brasil teve grande crise agrícola e os preços caíram muito; agora, eles passam por recuperação

Quando os preços agrícolas despencam por qualquer razão (em geral por causa do excesso de oferta), e não cobrem os custos de produção, os agricultores -como qualquer empresário eficiente- deixam de plantar. Se acontecer uma seca muito ampla e intensa, a produção pode cair demais, não atendendo à oferta, e os preços sobem de novo. Aí os agricultores voltam a plantar e a oferta excede a demanda, os preços caem outra vez e assim vai a vida no campo nos países onde não existem políticas estabilizadoras da renda rural. É a instabilidade, ruim para todos, produtores e consumidores.
O pior é que, quando um país está lutando para combater a inflação, o desastre dos agricultores é a felicidade do governo, porque os preços baixos permitem maior consumo com oferta abundante, e os consumidores -sobretudo os de baixa renda- podem ficar com a sensação de que aquilo é resultado de uma boa ação governamental. Na verdade, trata-se de um incidente do mercado, com a vantagem, do ponto de vista oficial, de derrubar os índices inflacionários.
Porém, milhares de produtores quebram, principalmente os pequenos, deixam a atividade e a produção acaba diminuindo. Os preços voltam ao patamar anterior e, não raro, a agricultura é acusada de ser causadora da inflação, quando, na verdade, o que acontece é apenas uma recuperação.
Acrescenta-se a isso o dado óbvio de que existe a safra e a entressafra. Na safra, os agricultores precisam pagar suas contas e vendem a produção a qualquer preço. Mercado não tem coração, aperta os mais fracos. Na entressafra, aqueles que conseguem agüentar vendem a preços melhores. Ora, isso é outra perversidade, porque concentra a renda: quem agüenta mais tempo vende melhor; quem está mais apertado ganha menos ou até perde, vendendo abaixo do custo.
Os governos dos países em desenvolvimento geralmente não entendem isso ou, se entendem, não ligam, porque os consumidores têm muito mais votos que os produtores. Por outro lado, sabem que, na economia globalizada, sempre dá para importar e cobrir a falta eventual de produtos. Mas a sociedade precisa compreender.
Nos últimos anos, o Brasil viveu uma das suas piores crises agrícolas, com grande quebradeira no campo, necessidade de prorrogação das dívidas e outras medidas extremas para sustentar a atividade. Os preços foram parar lá embaixo. Era evidente que uma hora voltariam a subir, recuperando-se. E, é claro, logo surgiriam vozes acusando a agricultura de alimentar a inflação, esquecidos do contrário acontecido antes.
Estamos perto disso, até porque há um aquecimento dos preços dos alimentos em razão da demanda por milho nos Estados Unidos e na China. No entanto, os números não mentem. Dados do IBGE indicam que de janeiro de 1994 (ano da implementação do Plano Real) a agosto de 2007, o IPCA aumentou 212%.
No mesmo período, leite aumentou 181%, aves e ovos, 170%, carnes, 155%, hortaliças e verduras, 150%, cereais e leguminosas (arroz, feijão, soja, milho, trigo etc.), 124%, e frutas diminuíram 34%. Tudo abaixo do IPCA.
No entanto, serviços de comunicação aumentaram 661%, combustíveis, 634%, aluguéis, 477%, transporte, 442%, eletricidade, 393%, tudo acima do IPCA. Os agricultores pagam por todos esses serviços, assim como os demais consumidores. Seu custo aumenta. E a sua renda?
Como pode a agricultura ser responsabilizada pelo aumento da inflação?


*

Por que Roberto Rodrigues, enquanto ministro, não trabalhou para mudar esta dura realidade dos agricultores?

Nenhum comentário: