31 agosto 2007

ELEIÇÃO NÃO É ANISTIA


De Cláudio Humberto

O deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) contestou o presidente Lula, para quem o povo o absolveu ao reelegê-lo: "Eleição não inocenta e nem anistia corruptos, eleitor não tem esse poder". E lembrou que Richard Nixon foi reeleito nos EUA e depois teve de renunciar para evitar o impeachment.

OS RÉUS QUE FALTARAM


CLÓVIS ROSSI


Ainda falta muita gente no banco dos réus armado pelas decisões do STF. Falta a intelectualidade chapa branca que cometeu o crime de corromper ativamente os fatos ao tentar transformar os réus em vítimas de uma conspiração da mídia que jamais existiu.
Se um funcionário nomeado por Lula, o procurador-geral da República, diz que há provas para processar a "organização criminosa"; se o Supremo Tribunal Federal, com maioria de juízes nomeada por Lula, diz que há indícios de peculato, corrupção ativa e formação de quadrilha, é escandalosamente óbvio que a única conspiração havida contra o governo Lula e o PT foi a conspiração dos fatos.
Falta também, no banco dos réus, a instituição PT. Aos fatos, preferiu aderir aos gritos debilóides de "conspiração/conspiração". Por isso, só puniu um dos réus de hoje, Delúbio Soares, como se fosse possível a uma só pessoa armar tanta "corrupção ativa".
Um partido que tem dois de seus presidentes (José Dirceu e José Genoino) e um punhado de quadros relevantes no banco dos réus estaria obrigado, se fosse sério, a dar explicações ao público. O PT vai continuar refugiado no silêncio covarde?
Ou vai dizer que todos os ministros do STF fazem parte da tal conspiração que não houve? Ou vai simplesmente relaxar, gozar e incorporar a frase à estrela vermelha como seu novo dístico?
Pela mesmíssima lógica antes exposta, faltam também, no banco dos réus, todos os parlamentares que votaram pela absolvição dos mensaleiros.
Sei que ser réu não significa necessariamente ser culpado do ponto de vista penal. Mas, do ponto de vista ético, todos já estão condenados com sentença transitada em julgado. Uns por confessarem caixa dois, que é crime. Outros denunciados pelo próprio presidente de honra do PT, Luiz Inácio Lula da Silva, ao pedir perdão ao público.


*

Falta muita gente...

ANATOMIA DO PODER


IVES GANDRA DA SILVA MARTINS


Como, nas variantes do socialismo marxista, os fins justificam os meios, a ética não é a principal moeda para o exercício do poder

Em recente artigo neste jornal ("Tendências/Debates", dia 21/ 8), Arnaldo Malheiros Filho revelou que, no momento, os trabalhadores do direito começam a ter a sensação de que o poder é indefinido; que os diversos grupos que o detêm agem sem um comando supremo e que o Poder estabilizador da ordem, ou seja, o Judiciário, se sente cerceado, de mais em mais, por iniciativas do Executivo e do Legislativo destinadas a reduzir o direito de defesa.
Crítico do governo militar, reconheceu, entretanto, que havia mais direito de defesa - símbolo maior de uma democracia - à época do Ato Institucional nº 5 do que agora.
A análise merece diversas considerações adicionais. De rigor, ao fazer a anatomia do poder no Brasil, se percebe que há diversos grupos que conduzem o governo e que o presidente Lula assiste a tudo, sem que se possa dizer que exista unidade de comando.
De um lado, o Bolsa Família garante à S. Ex.ª. um eleitorado cativo e crescente, que lhe dá permanente avaliação positiva nas pesquisas. Seus beneficiários (um quarto da população brasileira) pouco se importam com a política ou a ética.
Assemelha-se, neste particular, ao presidente Médici, ovacionadíssimo num Maracanã lotado por um povo satisfeito com o desenvolvimento econômico e pouco interessado em política.
Por outro lado, o grupo de seus partidários e aliados -que incharam a máquina administrativa sem concurso e lutam por sua efetivação- entende que o poder é para ser usufruído pelos "amigos", alijando os inimigos ou mesmo os perseguindo. Vivenciam a teoria de Carl Schmitt de que a política é a ciência que opõe amigo ao inimigo (o conceito do político).
Como, nas variantes do socialismo marxista, os fins justificam os meios, a ética não é a principal moeda para o exercício do poder, razão pela qual todos os escândalos descobertos em 2005 -e que não cessam de surgir- estão na linha da manutenção das rédeas governamentais nas mãos desses grupos. Isso, aliás, ocorre não só no Brasil mas também em todos os países que sofreram a influência ou o impacto direto do marxismo.
A Polícia Federal e a Receita Federal, por outro lado, que angariaram poderes fantásticos no novo governo, exercem o poder adotando linha paralela e independente das funções que a lei lhes atribui.
A primeira, provocando receios até na mais alta corte da República, alguns de seus ministros considerando que vivemos em um Estado policial.
A segunda, batendo recordes sucessivos de arrecadação de origem legítima e ilegítima, com eliminação gradual do direito de defesa do contribuinte. Via "penhora on-line", vai incorporando como receita própria tributos contestados na Justiça e, quando perde questões em juízo, não devolve o indébito, usando estratégias que vão desde o não-pagamento de precatórios até a nulificação do instituto da "coisa julgada", mediante a oposição de embargos declaratórios de natureza protelatória ao infinito.
Apesar de pôr a culpa pela morosidade do Judiciário no direito de defesa exercido pelo contribuinte, é o Estado que provoca e conta com a lentidão da Justiça para não cumprir as condenações.
Por essa razão, o Brasil tem o dobro da média da carga tributária dos países emergentes, com pífia prestação de serviços públicos.
A área técnica econômica, graças ao Banco Central, controla a inflação, mas o Brasil evolui pouco no que diz respeito à educação, ao emprego, aos investimentos, à tecnologia e ao comércio exterior se comparado com os outros países emergentes de expressão (Rússia, China e Índia).
O poder, portanto, partilhado entre correligionários, que o querem no modelo chavista; entre os controladores da privacidade (polícia e receita), que o querem atrelado ao medo que provocam; pelos técnicos de economia, que o querem com temor de retorno à inflação; e pelos idealistas, como Patrus Ananias, que o querem apenas assistencialista, tem, no Ministério Público e no Poder Judiciário, poucos entraves, pela desestruturação do Estado, e no Poder Legislativo, duas Casas que se destroem sozinhas, pela sua incansável capacidade de gerar sucessivos escândalos.
A tudo assiste o presidente Lula, imune, graças a seu grande eleitor (Bolsa Família), delegando ao máximo e conduzindo o mínimo, o que, de rigor, faz do Brasil um país sem projeto. Infelizmente, a sociedade consciente e não-governamental, embora pague a conta, é a que menos voz ativa tem nesta nova democracia, que ganha ares totalitários, instalada no país.


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Bolsa Família: a praga do Brasil.
Atenção especial para o último parágrafo (grifo nosso).

30 agosto 2007

A EDUCAÇÃO PELA BRINCADEIRA


ROSELY SAYÃO

Ao andarmos pelas cidades, cruzamos com várias crianças pequenas, com menos de seis anos, acompanhadas de adultos ou apenas de crianças pouco maiores. Elas pedem esmola, vendem doces, lixas, flores etc. São as nossas crianças que realizam trabalho infantil.
Há também um número expressivo de crianças dessa idade que ficam em casa, muitas vezes sem adultos, por falta de vagas suficientes nas instituições públicas de educação infantil. E, finalmente, há as que freqüentam a escola de educação infantil, quase sempre por meio período no dia.
Será que existe algo em comum entre crianças com vidas tão diferentes? Sim: muitas delas não têm espaço e tempo para brincar. As primeiras porque já têm responsabilidade de gente grande: precisam produzir renda para a família. As do segundo grupo porque passam horas em frente à TV. E as do terceiro porque, quando estão em casa, também vêem TV: pesquisas mostram que as crianças brasileiras passam de quatro a cinco horas por dia assistindo à televisão. Ah, mas estas últimas têm um espaço e um tempo certos dedicados à brincadeira quando vão à escola, certo?
Errado. Em geral, nem a escola permite que as crianças brinquem no período em que lá ficam. E vários motivos contribuem para isso. Em primeiro lugar, construímos um problema sério para a educação infantil: os professores não são valorizados e são colocados em patamar inferior ao dos demais docentes. Os pais precisam saber que os professores que lecionam no ensino médio ganham mais do que os que ensinam no segundo ciclo do fundamental, que, por sua vez, recebem salários maiores do que os que trabalham no primeiro ciclo. Os que se dedicam à educação infantil constituem a classe D nas camadas sociais criadas na escola, independentemente da formação, da experiência e da excelência na realização do trabalho. O salário é apenas um sinal do que se espera desses professores.
Nos países em que a educação é tratada com seriedade, os professores dos mais novos têm de ter sólida formação -e não só metodológica e técnica mas também cultural.
Com a política que adotamos, criamos uma ligação muito estreita entre o trabalho desses professores e o doméstico. Não é à toa que, principalmente nesse ciclo, as professoras são chamadas de "tia".
Para tentar dar um ar mais profissional a esse trabalho, muitas escolas decidiram investir no ensino de conteúdo, realizando uma caricatura do ensino fundamental. Isso acaba por abolir o espaço para o lúdico. Chegamos ao ponto de termos crianças com três ou quatro anos que precisam aprender a escrever e que levam lição para ser feita em casa! Pelos pais, evidentemente.
Aliás, só estes podem ajudar a mudar tal quadro: Exigindo que as políticas públicas e as escolas privadas valorizem o profissional de educação infantil, teremos chances de oferecer às crianças profissionais qualificados capazes de acompanhá-las na descoberta de si e do mundo pela brincadeira.

O CARÁTER REVOLUCIONÁRIO DAS ROTINAS


Anna Veronica Mautner


Será que se livrar das rotinas é se libertar? Não consigo pensar em efetuar intervenções ou mudanças na vida sem hábitos bem estabelecidos. No nosso cotidiano, vejo a rotina como um ponto de apoio indispensável. Vejo essas ordenações como Arquimedes via o ponto de apoio e a alavanca com a qual pretendia mover o mundo. Eu diria: "Dê-me uma rotina e uma vontade de mudar para mudar o mundo".
Sem rotina, invenção é difícil. Sem rotina, não existiria nem jeitinho -coisa tão nossa, com a qual abrimos novos caminhos. Sem rotina, com tudo permitido, na ausência de ordenação, como e com que romper? Não tenho em mente a rotina das máquinas, que se repetem sem saber por quê. Falo daquela ordem que resulta de múltiplos acertos e erros.
É sempre melhor lavar o rosto só depois de lavar os dentes, tudo para não sujar com a pasta o rosto já lavado. Sabia? Mínimos detalhes do cotidiano não estão aí à toa. Têm uma razão de ser. Procure-a.
Ter lugar para as coisas pode chegar a ser uma obsessão, mas pode ser também o melhor jeito de não ter que procurá-las a cada vez que precisamos delas, perdendo preciosos minutos.
Ordem e rotina sagradas e intocáveis paralisam as mudanças. Mas, entre rotina sagrada e vida sem qualquer rotina, vai uma boa distância. Felizmente.
Uma boa mãe atende aos resmungos de seu bebê. A partir da certeza de ser atendido, ele vivencia suas primeiras rotinas: sabe que quando reclama provavelmente será atendido. Pouco a pouco, vai usufruir dessa constância repetitiva e perceber algumas coisas como familiares e outras como estranhas. Conforme as estranhas se repetem, vão sendo incorporadas ao universo conhecido. Se o bebê viver imerso num mundo com falta de previsibilidade, olhará o mundo apreensivamente.
Tem gente que passa a vida só evitando surpresas. Os carcereiros vigilantes também são prisioneiros de quem cuidam e não querem saber de surpresas.
A rotina é, pois, não só o sustentáculo da liberdade mas também o aprisionamento dela. Incapazes de usar a rotina, perdemos a segurança necessária para criar e ser livre. É porque certas certezas existem que eu posso usar a minha mente para brincar, inventar, criar coisas novas. As rotinas geram confiabilidade no mundo que nos rodeia e permitem libertar nossa atenção para divagar por terras novas.
Uma barra rígida sem ponto de apoio não é alavanca, diria Arquimedes. É conhecendo os fenômenos do mundo que posso mudá-lo. É com a confluência dos dois que gero a força para mover o mundo.
Educar para a rotina, ao contrário do que se possa crer, é uma forma de gerar liberdade. Imponha-se rotina para que as crianças possam se exercitar em contorná-la.
Não faz muito tempo, eu vivia tentando afrouxar rotinas na minha vida, na de meus alunos ou clientes. Faltava flexibilidade para resolver inovadoramente novos problemas. De uns anos para cá, percebo-me lutando na direção oposta: quero salvar a idéia de repetição que foi relegada ao escárnio geral. Tendo a rotina virado palavrão, perderam-se muitos graus de liberdade. Reimplantar a noção de rotina como ponto de apoio indispensável pode ser visto hoje até como um ato revolucionário.


*

Interessantíssimo!
Vale a pena parar e pensar.

O BRASIL E OS CEGOS


BERTRAND DE ORLEANS E BRAGANÇA


A artificial popularidade de Lula parece ter se esvaído, de um momento para o outro, como um encantamento que perde sua sedução

O Brasil vive uma conjuntura inesperada e que causa perplexidade. Fatores até contraditórios parecem conjugar-se, gerando situações ora confusas, ora auspiciosas, ora trágicas, ora reveladoras.
Dir-se-ia que uma misteriosa mão revolveu o tabuleiro de xadrez da conjuntura político-social brasileira, derrubando certas peças, trocando outras de lugar, fazendo com que umas perdessem seu sentido e outras se sentissem confusas e desnorteadas.
Sou obrigado a concordar com o deputado Fernando Gabeira - em cujos antípodas ideológicos me encontro- quando escreveu, há dias, nesta Folha: "Há algo no ar além dos poucos aviões de carreira. É uma sensação de que o governo, diante da crise, deixou de fazer sentido, deixou de dizer coisa com coisa. As pessoas não acreditam ainda no que estão ouvindo" ("A bruxa na cabeça", 28/7, pág. A2).
Por que afinal o governo "deixou de fazer sentido"? E terá sido apenas o governo? Relembro aqui razões pertinentes, já exaustivamente apontadas: a generalizada incompetência; o aparelhamento do Estado pelo PT e partidos aliados; um governo voltado para a autolouvação e a propaganda; a submissão de todos os atos políticos a uma ideologia.
Há, entretanto, a meu ver, uma razão mais profunda que vejo pouco mencionada ou referida sem o devido destaque. Obcecados por uma ideologia utópica, com tintas de fanatismo, Lula, seus colaboradores e conselheiros mais próximos muito falam do povo, mas pouco conhecem dele. O que se nota em suas convicções -melhor diria, em suas crenças- e modos de atuar é um desconhecimento fundamental da índole de nossa gente.
Inúmeros historiadores, sociólogos e analistas de renome se debruçaram e escreveram sobre ela. Sirvo-me aqui das palavras de Plinio Corrêa de Oliveira, um dos pensadores e homens de ação que, a meu ver, com maior acuidade discorreram a respeito dos traços de alma, dos sentimentos, da mentalidade de nosso povo:
"O povo brasileiro se destacou desde as origens, por seu caráter ameno, afetivo e cordato. Ademais, habituou-se ele a considerar com otimismo as várias crises econômicas por que tem passado. Ele confia em Deus ("Deus é brasileiro", afirma um velho dito popular). (...) Com "jeitinho" (o "jeitinho" é uma instituição nacional), bonomia e paciência -julga a imensa maioria dos brasileiros- tudo se arranjará. O brasileiro é infenso à ansiedade. Detesta rixas. Cuida pacatamente de si e de sua família e considera com um olhar algum tanto desinteressado e cético a política e os políticos (...). Em comparação com o imenso contingente populacional assim disposto, publicistas, políticos etc. representam uma minoria que por certo faz ruído, pois está nos postos-chaves de onde o ruído se difunde sobre as multidões. Mas essas multidões constituem um povo que pouca atenção dá a tal ruído" ("Sou Católico: Posso Ser contra a Reforma Agrária?", Vera Cruz, 1981, pp. 57, 58).
Talvez por esse motivo a tão simbólica vaia do Maracanã tenha deixado surpreso e desorientado o presidente Lula e desconcertados seus assessores; talvez por esse motivo políticos petistas e aliados se tenham dedicado a exercícios abstratos e especulativos sobre os motivos da vaia em vez de se voltarem para o país profundo, que está mudando de modo irreversível.
A artificial popularidade de Lula, mantida à custa de uma fabulosa máquina de propaganda, regada generosamente a números de pesquisas, tratada com uma cuidadosa ausência de oposição, parece ter se esvaído, de um momento para o outro, como um encantamento que perde sua sedução.
O terrível e trágico acidente da TAM, dias depois, teve o condão que, paradoxalmente, têm certas tragédias, de operar um choque salutar nos que arrastavam indolentemente sua insatisfação. Num clarão de dor e de morte, aos olhos de grande parte dos brasileiros se tornaram patentes o descomunal desastre e a imensa tragédia histórica para a qual o chamado lulo-petismo arrasta a nação.
Pela primeira vez, das camadas profundas da sociedade surgem manifestações de inconformidade ativa, de um descontentamento que há muito germinava e só o lulo-petismo parecia não levar em conta, em sua marcha utópica por cima do Brasil.
Afinal, só isso explica as reações absurdas como a tristemente célebre frase da ministra Marta Suplicy; o escárnio da afirmação do ministro Guido Mantega; o sumiço do presidente Lula ante uma tragédia sem nome; os gestos desqualificados de Marco Aurélio Garcia; as piadas presidenciais e as gargalhadas na posse do novo ministro da Defesa. Parecem não saber avaliar o desgaste profundo de seu projeto de poder nas mentalidades. E o desgaste das multidões é um dos fenômenos mais difíceis de ser revertido. Afinal, não se caminha impunemente ao arrepio de um povo, sobretudo quando sobre esse povo pairam os desígnios e a proteção da virgem Aparecida.
Mas, para o lulo-petismo, tudo se reduz a uma disputa eleitoral, tudo é golpismo. O pior cego é aquele que não quer ver: e o Brasil está aí, aos olhos de todos... menos dos cegos.


*

Muito bom.
Para ler e reler

VÁRIOS MUNDOS, DOIS GOVERNOS


ELIANE CANTANHÊDE


Uma senhora de 94 anos, reclamando o corpo do filho que desapareceu em 1974, aos 24 anos, é de doer em qualquer coração. Foi o que ocorreu ontem, quando Elzita Santa Cruz pegou o microfone e pediu que, antes de morrer, lhe permitissem enterrar o filho.
A cena, pujante, foi no Planalto, durante o lançamento do livro "Direito à Memória e à Verdade", documento oficial do governo acusando o regime militar por torturas e mortes de opositores.
Lula prometeu que vai fazer tudo para devolver os corpos dos desaparecidos. A promessa vem do primeiro mandato, mas como encontrar corpos 30 anos depois, no meio de uma selva fechada e úmida?
A solenidade, em que Lula falou em "busca de concórdia", reuniu familiares das vítimas, ministros do atual governo (inclusive vítimas da ditadura, como Dilma Rousseff) e tucanos que deflagraram, no governo FHC, o processo de reconhecimento de mortos e desaparecidos. Muitos choraram.
Serviu, assim, para um raro momento de trégua entre as eras Lula e FHC e também para desviar o foco da decisão do Supremo Tribunal Federal de acatar a denúncia contra os agora 40 réus do mensalão.
O governo Lula esteve ontem dividido em dois: um, no Planalto, confortando as famílias dos que caíram lutando contra a ditadura militar; o outro, no banco dos réus, com três ex-ministros processados, dois deles do "núcleo duro" original.
Num mundo à parte, estiveram os militares, longe tanto da cerimônia do Planalto como das agruras de Dirceu, Gushiken, Anderson Adauto. Como observadores. Quem representou as Forças Armadas no lançamento foi o ministro da Defesa, Nelson Jobim - aliás, um elo concreto entre FHC e Lula.
Ele deixou claro que não aceita manifestações de insubordinação por causa do livro: "Se houver, terá resposta", avisou. Solenidades passam, militares ficam.

DE CÃES, ELITES E "POVO"


CLÓVIS ROSSSI


Mário Magalhães, o ombudsman desta Folha, pergunta na crítica interna que circulou anteontem: "Quem paga os advogados de Delúbio Soares, Silvio Pereira e outros denunciados que não aparentam ter renda para bancar as despesas com alguns dos melhores (e mais caros) criminalistas do país?".
Completou: "Não se trata de assunto que diga respeito somente a cliente e defensor. Há interesse público na informação".
Correto, Mário. Eu tenho uma resposta tipo Cláudio Lembo, genérica demais para satisfazer sua justa curiosidade: o "povo" (do PT, claro) faz algum tempo que praticou alpinismo social e instalou-se confortavelmente ao lado da "elite branca e má".
Logo, contrata os melhores representantes, na advocacia, da "elite branca e má", figura mitológica que Lembo descobriu com 50 anos de atraso, depois de conviver gostosamente com ela esse tempo todo. Curioso, aliás, que o "povo" (do PT, claro) hoje festeja a descoberta de Lembo, depois de ter passado a vida criticando-o e a todos os pefelês, hoje DEMs, justamente por serem da "elite branca e má".
Aliás-2: não é igualmente curioso que o único negro no STF durante o julgamento do caso mensalão não era réu, não era advogado de defesa, mas acusador -e que acusador, como tão bem mostrou Elio Gaspari na coluna de ontem?
Caro Mário, eu não sei quem paga os advogados do "povo". Mas aposto que o que custa um só deles ao "povo" (do PT, claro) daria para organizar mais de um desfile de cães em Campos do Jordão.
Cães de raça, como é óbvio, que é deles que o "povo" (do PT, claro) gosta, como informou dia desses Mônica Bergamo.
Nada contra os cães de raça (aliás, nada também contra vira-latas). Mas tudo contra o crime de falsidade ideológica desse "povo" que é elite e finge ser "povo".

29 agosto 2007

PMN EM ASTORGA

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No último sábado (25), recepcionamos o Presidente Estadual do PMN - Partido da Mobilização Nacional, Willy Taguchi e o Deputado Estadual, Dr. Batista.
Numa reunião que contou com a presença de prefeitos, vice-prefeitos, vereadores e secretários de vários Municípios, entre novos filiados, foram oficializadas as comissões provisórias do Partido nestes Municípios.
O PMN, como o próprio nome diz, mobiliza homens e mulheres conscientes de seu papel na sociedade, com elevado espírito público e muita disposição para fazer a diferença junto às suas comunidades.
Assim, o PMN tem um crescimento direcionado a uma nova maneira de militância: com total responsabilidade e comprometimento de seus filiados com o legítimo patrimônio de uma nação: seu povo.

24 agosto 2007

"O BRASIL É ISSO MESMO QUE ESTÁ AÍ"

Roberto Pompeu de Toledo

O terrível parecer, de alguém que conhece o assunto, reforça uma sensação que paira no ar

Os distraídos talvez ainda não tenham percebido, mas o Brasil acabou. Sinais disso foram se acumulando, nos últimos meses: a falência do Congresso e de outras instituições, a inoperância do governo, a crise aérea, o geral desarranjo da infra-estrutura. A esses fatores, evidenciados por acontecimentos recentes, somam-se outros, crônicos, como a escola que não ensina, os hospitais que não curam, a polícia que não policia, a Justiça que não faz justiça, a violência, a corrupção, a miséria, as desigualdades. Se alguma dúvida restasse, ela se desfaz no parecer autorizado como poucos de um Fernando Henrique Cardoso, cujas credenciais somam oito anos de exercício da Presidência da República a mais de meio século de estudo do Brasil. "Que ninguém se engane: o Brasil é isso mesmo que está aí", declara ele, numa reportagem de João Moreira Salles na revista Piauí.

Ora, direis, como afirmar que o Brasil acabou? Certo perdeste o senso, pois, se estamos todos ainda morando, comendo, dormindo, pagando as contas, indo às compras, nos divertindo, sofrendo, amando e nos exasperando num lugar chamado Brasil, é porque ele ainda existe. Eu vos direi, no entanto, que, quando acaba a esperança, junto com ela acaba a coisa à qual a esperança se destinava. É à esperança no Brasil que o sociólogo-presidente se refere. Para ele, o Brasil jamais conhecerá um crescimento como o da China ou o da Índia. "Continuaremos nessa falta de entusiasmo, nesse desânimo", diz. O prognóstico é tão mais terrível quanto coincide com – e reforça – o sentimento que ultimamente tomou conta mesmo de quem não é sociólogo nem nunca conheceu por experiência própria os mecanismos de governo e de poder.

O Brasil que "é isso mesmo" é o das adolescentes grávidas e dos adolescentes a serviço do tráfico, das mães que tocam lares sem marido, das religiões que tomam dinheiro dos fiéis, dos recordes mundiais de assassinatos e de mortos em acidentes automobilísticos, dos presos que comandam de suas células o crime organizado, dos trabalhadores que gastam três horas para ir e três horas para voltar do trabalho, das cidades sujas, das ruas esburacadas.

Procura-se o governo e... não há governo. Há muito que nem o presidente, nem os governadores, nem os prefeitos mandam. Quem manda é a trindade formada pelas corporações, máfias e cartéis. Não há governo que se imponha a corporações como a dos policiais, ou a dos professores, ou a dos funcionários das estatais. Não há o que vença as máfias dos políticos craques em arrancar para seus apaniguados cargos em que possam distribuir favores e roubar. Para enfrentar – ou, humildemente, tentar enfrentar – cartéis como o das companhias aéreas, só em época em que elas estão fragilizadas, como agora. Às vezes os cartéis se aliam às máfias, em outras se transmudam nelas. Em outras ainda são as corporações que, quando não se aliam, se transformam em máfias. Em todos os casos, o interesse público, em tese corporificado pelos governos, não é forte o bastante para dobrar os fragmentados interesses privados.

A tais males soma-se o cinismo. Não há outra palavra para descrever o projeto, supostamente de fidelidade partidária, aprovado na semana passada na Câmara. O projeto, muito ao contrário de punir ou coibir os trânsfugas, perdoa-lhes o passado e garante-lhes o futuro. Quanto ao passado, estão anistiados os parlamentares que trocaram de partido e que por isso, no entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, deveriam perder o mandato. No que concerne ao futuro, o projeto estabelece que a cada quatro anos os parlamentares terão folga de um mês na regra da fidelidade partidária, pois ninguém é de ferro, e estarão abertos a negócios e oportunidades. Estamos diante de uma das mais originais contribuições da imaginação brasileira ao repertório universal de regras político-eleitorais. Para concorrer a uma eleição, o candidato deve estar filiado a um partido há pelo menos um ano. Mas, segundo o projeto, no mês que antecede a esse ano de jejum o candidato pode trocar o partido pelo qual foi eleito por outro. Como a eleição é sempre em outubro, esse mês será o setembro do ano anterior. Eis o Carnaval transferido para setembro. O projeto é uma esposa compreensiva que, no Carnaval, libera o marido para a gandaia.

FHC não era tão descrente. No parágrafo final do livro A Arte da Política, em que rememora os anos de Presidência, escreveu: "Se houve no passado recente quem empunhasse a bandeira das reformas, da democracia e do progresso, não faltará quem possa olhar para a frente e levar adiante as transformações necessárias para restabelecer a confiança em nós mesmos e no futuro desse grande país". Na reportagem da revista Piauí, ele não poupa nem seu próprio governo: "No meu governo, universalizamos o acesso à escola, mas pra quê? O que se ensina ali é um desastre". Pálidos de espanto, como no soneto de Bilac, assistimos à desintegração da esperança na pátria, o que equivale a dizer que é a pátria mesma que se desintegra aos nossos olhos.



*

É estarrecedor... Mas, verdadeiro.
Um texto profundo para refletirmos bastante.
Até quando assistiremos passivos a tudo isso?
O que podemos fazer para mudar?
Vamos pensar!

MALTRATA O PORTUGUÊS

Do Blog de Marcus Vinicíus


Lula repetiu o velho discurso no lançamento do PAC, agora há pouco, em um ginásio de Piraquara em que a claque foi escolhida a dedo. O movimento “Eu Quero Vaiar o Presidente”, portanto, ficou de fora. Atacou os ricos, afagou os pobres e lembrou a sua origem miserável em um tom evidentemente populista. Restou o assassinato à língua portuguesa, marca registrada de Lula. Selecionei algumas pérolas:

Este país só vai ter um povo como ’símbalo’.

Vamos atender com água e ‘esgotamento’ sanitário.

‘Trezentos’ mil crianças.

E quem é que comprava esses ‘título’ (imobiliário nos EUA)?

Os Estados Unidos têm um ‘pobrema’ sério pra resolver.

Não temos nada a ver com os ‘calote’ (nos EUA). Aqui o povo pobre faz as ‘conta’ que tem que fazer.

É verdade que nós somos um monte de coisa ‘iguais’.

23 agosto 2007

OS PAIS E A ESCOLA SOB MEDIDA

Rosely Sayão

Uma leitora enviou correspondência em que comenta as reuniões de pais nas escolas. Disse que vai a todas e que sai horrorizada porque alguns pais se acham no direito de cobrar da instituição escolar atitudes educativas que ela considera dever da família. Outro leitor contou que ouviu pais se manifestarem totalmente contrários às posições da escola e que não entende como eles podem manter o filho na mesma. Já é hora, portanto, de avançarmos na reflexão da delicada relação escola-família.
Esses nossos leitores, muito sagazes, constataram que há um grande número de pais, notadamente entre os que matriculam os filhos em instituição particular, que acreditam poder exigir uma escola sob medida para seus filhos.
Isso leva a pedidos ou exigências dos mais absurdos, como a troca de turma para o filho estar com amigos, troca de professor de sala ou de disciplina, maior ou menor quantidade de lição a ser feita em casa etc. Isso sem falar da relação pouco respeitosa que os pais mantêm com as regras de funcionamento da escola, tais como horário de chegada e de saída, datas e prazos, uso de uniforme, uso de telefone celular etc.
Por que tais solicitações são absurdas? Porque a escola é o lugar de transição entre família e mundo em que os alunos aprendem, entre outras coisas, a viver sem escolher. Essa é uma das características da vida pública: não escolhemos os colegas com quem iremos trabalhar, as pessoas que estarão ao nosso lado no trânsito, as datas para pagar contas e tributos e as leis que temos de respeitar.
Precisamos nos lembrar sempre de que a escola tem o dever de preparar os mais novos para a cidadania. Por isso, demandas dos pais que privilegiam o âmbito privado não fazem sentido algum quando consideramos esse exercício que os filhos devem fazer ao freqüentar a escola.
Esse aprendizado também tem sido dificultado pelo constatado declínio do trabalho educativo das famílias. Os alunos chegam à escola muitas vezes sem o processo básico de educação em curso. Mas, ao contrário do que muitos professores pensam, isso se deve pouco ao descaso ou à ausência dos pais e mais à nossa cultura que "juveniliza" os adultos. É que os jovens - não me refiro à idade cronológica - têm dificuldades de estabelecer relações educativas com os filhos.
Tal fato tem gerado muitas reclamações por parte da escola, porque os mestres, tanto quanto os pais, também estão submetidos a essa cultura. Uma coisa é certa: pais e professores têm objetivos comuns e precisam constantemente recordar que é a educação dos mais novos o foco de sua tarefa educativa. A maioria dos conflitos entre eles não considera esse ponto, e sim anseios próprios de cada um deles.
Enquanto tivermos pais aflitos com o que consideram sofrimento dos filhos na escola e em busca de soluções fáceis e escolas mais comprometidas com novas metodologias e com a busca de determinados perfis de alunos em vez de com o uso do rigor e da exigência para alcançar um ensino de qualidade, a relação entre ambos será, necessariamente, conflituosa e desastrosa. Quem perde são os mais novos, que deveriam nortear todo nosso trabalho.


*

Lendo este artigo lembrei-me daqueles rapazes que espancaram uma doméstica no Rio de Janeiro. O pai de um deles ia à escola (particular) onde o filho estudava, exigindo tratamento diferenciado e privilegiado, quando não insultava funcionários em defesa de algum erro do filho.
Deu no que deu.
Pais responsáveis geram filhos responsáveis.

JOÃO IVO

O ex prefeito de Maringá, João Ivo Caleffi, deixou o PT.
Ontem, ao entregar sua carta de desfiliação, João Ivo não justificou sua decisão, apenas fez o comunicado.
Ele estava no PT há 23 anos. Mas, ultimamente vinha se sentindo desprestigiado.
Vice de José Cláudio, assumiu a prefeitura de Maringá depois da morte do prefeito.
Sua relação com as outras alas do Partido sempre foi extremada, por isso, nunca houve consenso em torno do seu nome.
Sonhando com outra eleição, não encontraria espaço no PT, já que a maioria prefere o nome do deputado estadual e hoje Secretário do Planejamento, Ênio Verri.
Provavelmente ingresse no PMDB.
Bom? Não sei, pois lá também ele não será a "estrela" principal.
Só o tempo dirá se a sua opção foi certa.

O PSDB E AS AVES

Contraponto - Folha de S. Paulo

No mundo das aves


Depois de Fernando Henrique Cardoso dizer, na semana passada, que o PSDB deveria pegar o bico do tucano, símbolo do partido, e trocar por um de sabiá para "cantar suas realizações", José Serra voltou ao assunto anteontem durante seminário da sigla em Curitiba.
Ao insistir na tese de que os correligionários pecam por fazer pouca propaganda das "conquistas" obtidas pelo partido quando no Executivo, o governador de São Paulo também recorreu a uma metáfora aviária:
-O PSDB parece uma pata. Porque vocês sabem: a galinha bota ovo pequeno e sai por aí cacarejando. Já a pata bota ovo grande e não faz barulho nenhum!

MENSALEIROS E MARGARIDAS

ELIANE CANTANHÊDE

O procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, falou em bom português sobre "quadrilha", "submundo do crime", "núcleo central da organização criminosa".
Já os advogados, que falaram um atrás do outro, num lento e morno jorrar de palavras, insistiam nas palavras "inepto" e "inépcia" para desqualificar o trabalho do procurador. Em geral, entonação ensaiada, gestos discretamente teatrais.
No particular, foco para o advogado de Silvinho Pereira, aquele do Land Rover, empenhado em convencer que seu cliente não tinha cargo no governo, era um nada no PT. Só não explicou o que fazia, então, em reuniões na Casa Civil com bancos, empresas privadas, até empresas internacionais. A dúvida continua.
Mas a grande estrela estava ausente: José Dirceu, apontado como o chefe de todo o esquema, que o mesmo procurador classificou de "promiscuidade" entre membros do governo, líderes de partidos e bancos privados, tudo movido a dinheiro, para então ironizar: "Será que foi um surto de filantropia político-partidária?"
Ficou evidente o contraste entre o tom vetusto dos ministros, a forma coloquial do procurador e o malabarismo verbal dos advogados. Três mundos, três interesses.
E não há comparação entre as CPIs no Congresso e os julgamentos no Supremo. Nas CPIs, todos falam, se interrompem, se xingam, os celulares tocam sem parar e as conversas correm soltas em ambientes lotados. No Supremo, o linguajar é sóbrio, ninguém interrompe ninguém, há um surpreendente silêncio e sobraram cadeiras até mesmo na bancada de imprensa.
Também não havia manifestantes, nenhum "cara-pintada" em defesa da ética pública. Brasília amanheceu com um megacongestionamento, mas por outro motivo: a Marcha das Margaridas, que reuniu 15 mil trabalhadoras rurais na Esplanada dos Ministérios.


*

Vamos aguardar o resultado.

CARGA INSUPORTÁVEL

Editorial da Folha de S. Paulo

Não haverá melhor oportunidade no futuro visível para reduzir o peso dos impostos do que a discussão sobre a CPMF

A Receita Federal confirmou que a carga nacional de impostos, taxas e contribuições bateu novo recorde no ano passado. De cada R$ 100 produzidos no país, R$ 34,23 foram absorvidos pelos governos. E a história continua: a arrecadação de tributos federais neste ano cresce num ritmo duas vezes maior que o da atividade econômica.
O governo federal, principal responsável pelo aumento do peso dos tributos sobre trabalhadores e empresas, tenta se defender sustentando que os resultados recordes da arrecadação não se deveram a aumento de alíquotas. O erário, pondera o Planalto, apenas se beneficia de um momento favorável da economia, em que há mais atividade, mais emprego, mais renda e, portanto, mais tributos.
O argumento é um estratagema para fugir à questão central. Governos responsáveis aproveitam momentos favoráveis da atividade para corrigir distorções macroeconômicas. É o que acontece com os juros básicos e a dívida pública, que vêm sendo reduzidos paulatinamente.
A carga fiscal que não cede -ao contrário, aumenta- destoa desse movimento e representa um sinal contrário à desejável manutenção de altas taxas de crescimento econômico pelos próximos anos. Reduções de impostos, oferecidas pelo governo federal aqui e ali, não foram suficientes para aliviar o torniquete tributário sobre os negócios, os investimentos e o emprego.
Não haverá melhor oportunidade no futuro visível para virar esse jogo -e encaminhar uma redução no peso dos impostos no Brasil- do que a discussão, em curso no Congresso, sobre a prorrogação da CPMF. Apenas o crescimento da arrecadação federal neste ano será equivalente a duas vezes a receita com a CPMF.
Nada justifica a manutenção da alíquota de um imposto que distorce as relações econômicas nesse contexto. Seria como abonar de antemão um novo ciclo de aumento de despesas públicas correntes (os gastos na manutenção da máquina), no momento em que é preciso diminuí-las em benefício do investimento público e, via redução de impostos, do contribuinte.
É preciso impor o interesse da sociedade ao imediatismo do governo Lula. A condição para renovar a CPMF deve ser a queda paulatina, a ser iniciada de imediato, de sua alíquota (hoje de 0,38%) até que ela se torne simbólica, o que preservará no tributo apenas a função fiscalizadora.


*

Brasil: o país dos impostos.
Brasil: um país chamado imposto.
Pra que tanto imposto?

GOVERNO E MENSALÃO

Não é possível um esquema desse tamanho sem o governo

Antônio Fernando Souza, procurador-geral da República, sobre a quadrilha do mensalão



*


Precisa falar mais alguma coisa?

22 agosto 2007

STF E O PROCESSO DO MENSALÃO

Estadão OnLine:

O que interessa saber sobre o STF e o processo do mensalão


A denúncia do procurador-geral da República contra o ex-ministro José Dirceu e mais 39 pessoas envolvidas no chamado "mensalão" começa a ser apreciada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira, 22. É um dos mais complexos casos da história política e do Judiciário no Brasil.

Veja como irá se desenrolar o processo:

1. O QUE SERÁ DECIDIDO
Se a denúncia apresentada pelo procurador-geral da República preenche os requisitos para a abertura de ação penal contra os 40 denunciados no inquérito do mensalão. Nesta fase, o Supremo não julga os acusados, mas examina se a denúncia contém os indícios mínimos para sustentar a acusação, se o crime e suas circunstâncias foram expostos corretamente, se os acusados foram corretamente qualificados e os crimes, tipificados.

2. QUEM DECIDE
A decisão pode ser tomada por unanimidade ou por maioria (cinco votos) de nove ministros. A presidente do STF, Ellen Gracie, só é obrigada a votar em matérias constitucionais (não é o caso do inquérito). O ex-ministro Sepúlveda Pertence aposentou-se na última semana e não participa. O inquérito e a eventual ação penal tramitam no STF porque envolvem ex-ministros e parlamentares, que não podem ser processados em instâncias inferiores.

3. ONDE ASSISTIR
TV Justiça (canal 53-UHF, SKY canal 117, DirecTV canal 209, NET, canal 10) Rádio Justiça (104.7 FM, em Brasília). Ou na internet (http://www.tvjustica.gov.br/). As sessões de quarta, quinta e sexta começam às 10 horas com intervalo para almoço e sem previsão para o encerramento. Se necessário, haverá sessão segunda, 27.
Qualquer pessoa pode acompanhar o julgamento no STF, mas a maior parte dos 246 lugares no plenário foi reservada para os acusados e seus advogados. Dois telões foram instalados em um dos salões do STF, com capacidade limitada.

4. O ROTEIRO DO JULGAMENTO
Leitura do relatório (resumo do processo) pelo ministro Joaquim Barbosa (50 páginas, previsão pouco mais de uma hora);
Sustentação oral da denúncia pelo procurador-geral Antonio Fernando Souza (prazo de uma hora);
Defesa oral dos denunciados. Cada advogado tem direito a 15 minutos. Até terça-feira 27 advogados haviam se registrado (se for usado o tempo máximo, serão usadas 7 horas e meia pela defesa)
Leitura das questões preliminares e do voto do relator Joaquim Barbosa. São mais de 400 páginas (previsão de cerca de seis horas).
Debate e declaração dos votos dos ministros, por ordem de antiguidade (do mais novo para o mais velho). Sem previsão de tempo, esta fase pode avançar até segunda-feira. Qualquer ministro pode pedir vistas (exame individual) do inquérito e suspender a votação.

5. AÇÃO PENAL
Caso o STF decida pela abertura da ação contra todos ou parte dos denunciados, eles se transformam em réus e começa a fase do contraditório. Defesa e acusação podem arrolar testemunhas, solicitar diligências e perícias antes do julgamento final, para o qual não há prazo previsto.
Caso o STF rejeite a denúncia, o inquérito será arquivado.

6. A DENÚNCIA
O procurador-geral Antônio Fernando de Souza acusou o ex-ministro José Dirceu de ser o "chefe de uma organização criminosa" que atuou para "desviar dinheiro público e comprar apoio político."
Segundo o procurador, a "quadrilha" teria operado entre 2003 e 2005 com um núcleo político-partidário, um núcleo financeiro e um núcleo publicitário.
Entre os acusados estão o ex-ministro Luiz Gushiken, o ex-presidente do PT, deputado José Genoíno (SP), o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares, o empresário Marcos Valério Fernandes de Souza e seus sócios, diretores do Banco Rural, deputados e dirigentes do PT, do antigo PL (atual PR), PTB, PP e PMDB, além do ex-presidente do PTB, Roberto Jefferson, que denunciou o chamado "mensalão".

7. OS DENUNCIADOS E AS ACUSAÇÕES
1. Anderson Adauto, ex-ministro dos Transportes - corrupção ativa e lavagem de dinheiro
2. Anita Leocádia, ex-assessora do deputado federal Paulo Rocha - lavagem de dinheiro
3. Antônio Lamas, irmão de Jacinto Lamas - formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
4. Ayanna Tenório, ex-vice-presidente do Banco Rural - formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta
5. Bispo Rodrigues (Carlos Rodrigues), ex-deputado federal do PL - corrupção passiva e lavagem de dinheiro
6. Breno Fischerg, sócio na corretora Bonus-Banval - formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
7. Carlos Alberto Quaglia, dono da empresa Natimar - formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
8. Cristiano Paz, sócio de Marcos Valério - corrupção ativa, peculato, evasão de divisas e lavagem de dinheiro
9. Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT - formação de quadrilha, corrupção ativa e peculato
10. Duda Mendonça, publicitário - evasão de divisas e lavagem de dinheiro
11. Emerson Palmieri, ex-tesoureiro informal do PTB - corrupção passiva e lavagem de dinheiro
12. Enivaldo Quadrado, dono da corretora Bonus-Banval - formação de quadrilha e lavagem de dinheiro
13. Geiza Dias, auxiliava Simone, ex-diretora da SMPB - formação de quadrilha, corrupção ativa, evasão de divisas e lavagem de dinheiro
14. Henrique Pizzolato, ex-diretor de marketing do Banco do Brasil - peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
15. Jacinto Lamas, ex-tesoureiro do PL (hoje PR) - formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
16. João Cláudio Genu, ex-assessor da liderança do PP - formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
17. João Magno, ex-deputado federal - lavagem de dinheiro
18. João Paulo Cunha, deputado federal (PT-SP), - corrupção passiva, lavagem de dinheiro e peculato
19. José Borba, ex-deputado federal, foi líder do PMDB - corrupção passiva e lavagem de dinheiro
20. José Dirceu, ex-ministro chefe da Casa Civil - formação de quadrilha, corrupção ativa e peculato
21. José Genoíno, deputado federal (PT-SP), - formação de quadrilha, corrupção ativa e peculato
22. José Janene, primeiro-tesoureiro do PP - formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
23. José Luiz Alves, ex-chefe de gabinete de Anderson Adauto no Ministério dos Transportes - lavagem de dinheiro
24. José Roberto Salgado, vice-presidente do Banco Rural - formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta
25. Kátia Rabello, dona do Banco Rural - formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta
26. Luiz Gushiken, ex-ministro da Secretaria de Comunicação da Presidência da República - peculato
27. Marcos Valério, publicitário, seria o operador do esquema - formação de quadrilha, falsidade ideológica, corrupção ativa, peculato, evasão de divisas e lavagem de dinheiro
28. Paulo Rocha, deputado federal (PT-PA) - lavagem de dinheiro
29. Pedro Corrêa, ex-deputado federal pelo PP - formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
30. Pedro Henry, deputado federal (PP-MT) - formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
31. Professo Luizinho (Luiz Carlos da Silva), ex-líder do governo na Câmara - lavagem de dinheiro
32. Ramon Hollerbach, sócio de Marcos Valério -- formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, evasão de divisas e lavagem de dinheiro
33. Roberto Jefferson, ex-deputado federal pelo PTB - corrupção passiva e lavagem de dinheiro
34. Rogério Tolentino, sócio de Marcos Valério - formação de quadrilha, corrupção ativa, peculato, evasão de divisas e lavagem de dinheiro
35. Romeu Queiroz, ex-deputado federal pelo PTB - corrupção passiva e lavagem de dinheiro
36. Sílvio Pereira, ex-secretário-geral do PT - formação de quadrilha, corrupção ativa e peculato
37. Simone Vasconcelos, ex-diretora da SMPB, seria a principal operadora do esquema dirigido por Marcos Valério - formação de quadrilha, corrupção ativa, evasão de divisas e lavagem de dinheiro
38. Valdemar Costa Neto, deputado federal (PR-SP), - formação de quadrilha, corrupção passiva e lavagem de dinheiro
39. Vinícius Samarane, diretor do Banco Rural - formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta
40. Zilmar Fernandes, sócia de Duda Mendonça - evasão de divisas e lavagem de dinheiro

8. AS PENAS
Corrupção ativa: prisão de 2 a 12 anos e multa
Corrupção passiva: prisão de 2 a 12 anos e multa
Peculato (especifico de servidor público): prisão de 2 a 12 anos e multa
Falsidade ideológica: prisão de 1 a 5 anos e multa
Lavagem de dinheiro: prisão de 3 a 10 anos e multa
Evasão de divisas: prisão de 2 a 6 anos e multa
Formação de quadrilha: prisão de 1 a 3 anos.
As penas podem ser agravadas pela repetição do crime. Alguns dos réus são acusados dezenas de vezes pelo mesmo crime neste inquérito.


*

Sem dúvida, um grande espetáculo político. E grande vergonha nacional.
Esperamos que a justiça prevaleça.

O JULGAMENTO

Eliane Cantanhêde

O Supremo Tribunal Federal decide a partir de hoje se abre ou não ação contra José Dirceu e 39 outros mensaleiros, com boas chances de repetir um enredo bem conhecido: no caso de Fernando Collor, o tribunal abriu a ação, que depois não deu em nada. Ele foi absolvido por falta de provas.

Há, porém, enormes diferenças entre os dois casos, principalmente políticas. Collor era um contra todos, quando foi aberta a ação, e não valia mais nada, quando foi absolvido. Tanto fazia. Agora, os 40 indiciados pelo procurador geral da República são muitos e dividem opiniões, acaloradamente, a favor ou contra. As pressões sobre os ministros virão de todos os lados. O risco é se neutralizarem.

Outras diferenças: Collor era "de direita" e o PT já tinha desde então todos os seus braços nos movimentos, nos sindicatos, nas entidades. Os "caras pintadas" estavam nas ruas. Se eram ou não uma juventude dourada, de elite e branca, não interessava muito. O fato é que o "Cansei" deles foi levado muito a sério.

Agora, os homens de José Dirceu e de Lula, não necessariamente nessa ordem, podem até ser "de direita", como a turma pesada do PTB, do PP, do PL, mas no geral eles representam a base congressual de um governo de esquerda e são liderados pelo PT, que foi não apenas o partido da esquerda por excelência, mas tido e havido como o mais puro do planeta.

Os movimentos fingem que não vêem nada, e o "Cansei" de hoje é ridicularizado até pelos opositores do governo. Seria inconcebível bater nos "caras pintadas" anti-Collor, mas fica "bem" bater na elite loura que posa atrás de Hebe Camargo e de Ana Maria Braga. Digamos que é "politicamente correto". É o que se espera da elite intelectual, que tem horror à elite rica e famosa.

A grande diferença, portanto, é que Fernando Collor foi um alvo fácil, primeiro, que se tornou inexpressivo, depois, enquanto os mensaleiros são um alvo poderoso que estão na essência de um governo que não é apenas o governo de plantão, mas que tem também imensamente mais força política.

Outra diferença significativa é que, na época de Collor, os julgamentos eram a portas fechadas, para que os ministros do Supremo desfilassem erudição jurídica entre eles. Hoje, o julgamento é aberto e será transmitido ao vivo pela TV Justiça. Para o telespectador, a erudição jurídica é um detalhe. O que importa é onde se pretende chegar. Faz ou não faz diferença?

Assim como estamos todos craques para discutir sobre transponder, reverso pinado e "grooving", vamos nos familiarizar também com termos jurídicos e ter aulas inesquecíveis de como funcionam o poder e os poderosos, especialmente os neo-poderosos dispostos a tudo, a qualquer preço.


*


Vai dar no que sempre dá: em nada.
É o governo do PT.

AUTONOMIA EM RISCO NA NOVA TV PÚBLICA

DIOGO MOYSES e JOÃO BRANT

Entendeu-se que o governo cumpriria o compromisso. Porém, o caráter público da nova TV, que parecia consolidado, está em risco

Quando o governo federal anunciou a intenção de construir uma rede pública de televisão, setores da sociedade logo se preocuparam em definir as diferenças fundamentais entre emissoras públicas e estatais.
Para ser de fato pública, a nova TV deveria ter gestão independente do governo, financiamento não contingenciável e uma programação que refletisse a diversidade da sociedade brasileira. Não cumpridas essas premissas, a nova instituição acabaria por se constituir como uma TV estatal ou governamental, mas não uma TV pública.
A apreensão de que tais princípios não fossem respeitados não nos impediu de apoiar a iniciativa. Afinal, é evidente a necessidade de instituir no país um autêntico sistema público de comunicação, autônomo e independente dos governos e do mercado.
Historicamente, o setor comercial de rádio e TV tem se mostrado incapaz de garantir o debate plural sobre as questões centrais para o Brasil. São inúmeros - e permanentes - os exemplos em que os interesses particulares dos donos da mídia se impõem ao interesse público, com resultados desastrosos para a democracia.
A polêmica "público X estatal" parecia ter sido dirimida com a realização do 1º Fórum Nacional de TVs Públicas, em maio deste ano, quando governo, emissoras do campo público e organizações da sociedade civil assinaram a Carta de Brasília, documento que estabelecia diretrizes para a nova TV pública: deveria ser independente em relação ao governo federal, com autonomia para estabelecer sua programação e gerenciar seus recursos.
O conselho gestor da TV Brasil, explicitava o documento, deveria ser representativo da sociedade e, em sua composição, o governo não deveria ter maioria. Buscava-se, assim, afastar o risco de a emissora se tornar braço político do Executivo federal, qualquer que seja seu ocupante.
Nos últimos meses, prevaleceu a convicção de que o governo cumpriria o compromisso assumido e daria efetividade aos princípios pactuados.
De fato, alguns princípios parecem estar se concretizando. Será um avanço se o governo realmente adotar um modelo de rede horizontal e descentralizado. Também é positivo o incentivo à autonomia das emissoras estaduais em relação aos governos locais.
Entretanto, o que parecia consolidado - o caráter público da nova instituição - está sob risco. A proposta atual do governo contraria os princípios da Carta de Brasília ao estabelecer mecanismos de gestão vinculados direta e exclusivamente ao Executivo federal. Pela proposta, tanto o conselho gestor da TV (responsável por zelar pelas finalidades públicas da instituição) quanto a presidência da nova emissora seriam indicados pelo presidente da República, sem nenhuma necessidade de aprovação por órgão independente.
Ora, com um conselho de "personalidades" indicado pelo presidente, a TV perde sua autonomia e independência, com ameaça a seu caráter público. Não é a mera existência de um órgão gestor que confere à emissora esse caráter público. É preciso que ele seja plural e representativo, preservando a independência da instituição em relação ao governo. Além disso, é a própria sociedade quem deve escolher os seus representantes.
A idéia de um governo que indica, em nome da sociedade, quem a representa é paternalista e antidemocrática, independentemente de quem sejam esses indicados.
Alega o ministro Franklin Martins (Comunicação Social) que representantes de instituições no conselho gestor da emissora tendem a defender interesses corporativos. A preocupação com a possível contaminação da instituição por interesses particulares é legítima, mas a solução proposta é a pior possível.
É certo que não deve haver no conselho vagas fixas para nenhuma instituição. O desafio é estabelecer mecanismos democráticos e participativos de indicação, seja por conferência, seja por eleição direta.
Esse modelo já é utilizado - e bem-sucedido - em estruturas como o Conselho Nacional de Saúde e o Conselho das Cidades que, embora tenham atribuições distintas daquelas do conselho de gestão da nova TV pública, também têm a missão de representar o conjunto da sociedade.
A ousadia e a coragem que o governo teve ao propor a criação de uma nova rede de televisão devem permanecer na escolha de seu modelo de gestão. Neste momento de definições, é imprescindível zelar pelo caráter efetivamente público da futura instituição, para que nenhum governo, a qualquer tempo, possa utilizá-la como um instrumento político. Que assim seja, para o bem da ainda incipiente democracia brasileira.


*

Rede pública de televisão: você acreditou?

O "TUMOR FÉTIDO" VAI AO STF

CLÓVIS ROSSI

Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, como diria Denise Abreu, a diretora da Anac que enganou a Justiça e, não obstante, continua diretora.
Uma coisa é o Supremo Tribunal Federal aceitar ou não a denúncia contra os 40 do mensalão. Do ponto de vista jurídico, é decisão irrefutável, seja qual for.
Outra coisa é a igualmente irrefutável culpa dos acusados sob o aspecto ético e moral. Culpados não apenas pela denúncia oferecida pela Procuradoria Geral da União, ainda que esta seja de uma contundência nunca antes vista neste país. "Organização criminosa" não é rótulo usual para um partido do governo.
Ainda assim, a Procuradoria acusa, mas não julga. Quem condenou os mensaleiros foi o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em três diferentes frases.
Primeiro, ao pedir perdão ao público. Se pediu perdão, é porque um crime foi cometido, a menos que Lula, além de messiânico, seja também masoquista.
Depois, ao dizer-se traído. Se foi traído, é porque seus amigos cometeram um trambique. Finalmente, ao dizer que o PT fez o que todo mundo faz (caixa dois).
Caixa dois é crime. O fato de que muita gente o pratique não lhe tira a característica de crime.
Como confessou ainda anteontem o governador da Bahia, Jaques Wagner, ex-palaciano: "A tese do mensalão, como foi apresentada, foi equivocada. Que houve, houve, mas não com essas características que tentaram sustentar. O que teve: tratos de ajuda e sustentação [entre partidos da base aliada e o PT] para as eleições de 2004". Se o nome é mensalão ou não, continua sendo crime -e confessado.
Por fim, como prefere outro ex-palaciano, Frei Betto, "a crise ética de 2005 [foi] tumor fétido de alianças nefastas".
Com ou sem denúncia, o fato é que tumores fedem.


*

Uma coisa é votar.
Outra coisa é saber votar.
Tenhamos fé: um dia aprenderemos a votar.

21 agosto 2007

BOM SENSO E CPMF

BENJAMIN STEINBRUCH


A CPMF é um péssimo tributo, porque eleva custos e impacta toda a cadeia produtiva brasileira

Durante as turbulências que vêm aterrorizando o mercado financeiro mundial, soube-se que o Tesouro brasileiro tinha em caixa, na semana passada, R$ 280 bilhões. Foi uma boa notícia para deixar claro que o Brasil tem como resistir a um possível agravamento da atual crise, nada mal para um país que tem sofrido de crônica escassez de recursos.
Obviamente, grande parte desse dinheiro em caixa já tem destinação específica em gastos futuros do governo federal. Mas há certa ironia no fato de que, ao mesmo tempo em que entesourava essa montanha de recursos, o governo resistia bravamente à idéia de abrir mão de um único centavo na arrecadação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira).
A CPMF foi criada ainda no primeiro governo Fernando Henrique Cardoso, em 1997, por insistência do então ministro da Saúde, Adib Jatene, para durar dois anos, num momento em que havia brutal falta de recursos nos hospitais. Em princípio, os recursos deveriam ser todos direcionados à saúde, mas ao longo do tempo foram desviados para outros fins. Neste ano, a arrecadação da CPMF deve atingir R$ 36 bilhões, por meio da taxação em 0,38% em todas as transações bancárias. Desse valor, 0,20 ponto percentual será repassado à saúde, 0,10 ponto, à Previdência, e 0,08 ponto, ao programa de erradicação da pobreza.
Pelo que se tem visto no Congresso, a cobrança da CPMF, já prorrogada seguidas vezes e que deveria terminar em 31 de dezembro, corre o risco de ser aprovada, ainda que parcialmente, para vigorar por mais quatro anos, até 2011.
A CPMF é um péssimo tributo, porque eleva custos e impacta toda a cadeia produtiva brasileira, ao ser cobrada em cada uma das fases da produção: do agricultor que compra a semente ou que vende a safra, dos transportadores, do industrial e dos consumidores no atacado e no varejo. O tributo é aplicado até mesmo sobre o pagamento de outros impostos, no momento em que se faz a operação bancária. Cada família brasileira gasta R$ 626 por ano com CPMF, diz o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário). q Falta bom senso nessa decisão de prorrogar a CPMF porque o momento favorável da economia brasileira, com arrecadação crescente do governo federal, seria uma ótima oportunidade para que o país pudesse começar a se livrar desse imposto perverso.
Como em muitas outras oportunidades, a posição irredutível do governo, com apoio até de parte da oposição -já que o PSDB foi o partido que bancou a criação do tributo e está constrangido em defender a sua extinção-, não faz nenhum sentido no momento em que há um crescimento surpreendentemente forte da arrecadação federal.
Se houvesse real intenção de estimular a economia, o país teria de caminhar imediatamente para buscar uma fórmula que permita a extinção desse imposto de péssima qualidade. No máximo, seria possível aceitar a manutenção da uma taxa mínima, simbólica, para facilitar a atividade fiscalizadora da Receita Federal.
É falso, portanto, o argumento central de que o governo federal não pode abrir mão de nenhuma receita neste momento. Os R$ 280 bilhões que estão em caixa no Tesouro Nacional são uma amostra do potencial arrecadatório.
É preciso avançar em matéria de desoneração fiscal, uma lição de casa que o país teimosamente vem se recusando a fazer durante duas décadas. A extinção da CPMF seria um bom início para esse avanço.


*

A CPMF é o imposto da vergonha, ou melhor, da falta de vergonha.
Um imposto provisório, criado para ser destinado à saude, tornou-se hoje moeda de troca no congresso nacional.
E a saúde pública continua na UTI, agora em estado terminal.
Este é o Brasil.
Lamentável!

A ORIGEM DE UM DIREITO

RITA CAMATA

Os motivos que originaram o direito das mulheres à aposentadoria 5 anos antes persistem, pois nada mudou na desigualdade entre sexos

É curioso e bastante educativo observar a origem de alguns direitos. Sabemos que uma determinada conjuntura que origina um direito pode se alterar de tal forma que o direito deve ser revisto.
Pensemos, por exemplo, no Código Civil de 1916. O inciso IV do artigo 219 estabelecia como um dos motivos para a separação "o defloramento da mulher, ignorado pelo marido". Ou seja, o marido tinha o direito de se separar de sua esposa se descobrisse que ela não era virgem antes do casamento. Com o novo código, o legislador entendeu que tal dispositivo não mais condizia com a realidade da sociedade, que não se tratava de um direito justo e o suprimiu.
Outros direitos acabam se tornando privilégios e devem ser combatidos, como o período de férias de 60 dias para a magistratura. Está em andamento o Fórum Nacional de Previdência Social, que tem por objetivo promover o debate para aperfeiçoar os regimes de previdência social.
Sempre que se fala na necessidade de nova reforma da Previdência, alguns estudiosos, inclusive aqueles que afirmam ter trocado muitas fraudas, lançam a idéia de acabar com a aposentadoria com tempo inferior para as mulheres. Defendem que não é justo mulheres de "classe média" se aposentarem aos 55 anos de idade.
Tais estudiosos esquecem que, para se aposentarem com 55 anos, as mulheres devem ter começado a trabalhar com pelo menos 25 anos e que, ao se aposentarem com idade inferior a 60 anos, seu benefício será bastante reduzido pelo fator previdenciário.
Analisemos a partir de um ponto que julgo principal: os motivos que originaram o direito das mulheres à aposentadoria cinco anos antes dos homens persistem? Ou, como no exemplo do Código Civil de 1916, desapareceram e clamam pela mudança da legislação?
Esse direito surgiu da necessidade de compensar as mulheres pelos efeitos da dupla jornada de trabalho. Ao ingressarem no mercado de trabalho, elas continuaram com a responsabilidade sobre a casa e os filhos e com tantas outras atribuições ainda não compartilhadas integralmente com seus companheiros. Isso sem mencionar a diferença salarial -as mulheres ganham menos- e os cargos inferiores para a mesma qualificação.
Nada disso se alterou, e a situação se confirma com os dados que revelam a necessidade da manutenção da compensação.
Pesquisas indicam, por exemplo, que as mulheres são as principais vítimas da hipertensão. As mortes por esse motivo já são seis vezes superiores àquelas causadas por câncer de mama. Uma das causas apontadas para essa doença silenciosa é exatamente a dupla jornada. Dados do IBGE revelam que, na faixa etária entre 50 e 64 anos, o índice de diagnóstico de doença crônica é de 57,4% para homens e de 70,8% para mulheres. Na faixa entre 40 e 49 anos, tal índice é de 40,9% para homens e de 51,8% para mulheres. A diferença é gritante, e comprovadamente as mulheres estão mais suscetíveis a essas doenças pelo estresse, e não pela carga genética.
Mesmo diante de tais dados, os defensores da "nova reforma" insistem: deve haver outra forma de compensá-las sem comprometer as contas da Previdência Social, até porque isso já foi feito em outros países.
Concordo inteiramente. Ocorre, porém, que a aposentadoria com tempo diferenciado não é um privilégio das mulheres. É um direito social legitimado, entre outros fatores, pela necessidade familiar.
Quanto às contas da Previdência Social, elas podem encontrar o equilíbrio atuarial sem passar por cima desse direito social. Basta combater as fraudes, os desvios e, principalmente, reconhecer seu papel de política pública voltada para todos que já contribuíram para o desenvolvimento do país por meio de seu trabalho.
Quando o Estado brasileiro garantir políticas públicas capazes de suprir essa compensação, quando a sociedade evoluir para uma mentalidade de verdadeira igualdade entre homens e mulheres, quando alcançarmos o que hoje ainda é uma utopia, serei a primeira a propor que homens e mulheres se aposentem mediante os mesmos critérios.


*

O que você pensa sobre isto: é justo?

TERRA À VISTA

ELIANE CANTANHÊDE

O empresário Nenê Constantino telefonou para o governador do DF, José Roberto Arruda, comunicando que está comprando um terreno da Marinha em área nobre de Brasília, perto do Memorial JK, para construir um conjunto residencial à custa de uma "módica" mudança no gabarito, de três para seis andares. Constantino é um dos donos da Gol e pivô do escândalo que levou o ex-governador do DF Joaquim Roriz a renunciar ao mandato de senador. Arruda não gostou da história.
Em reunião na última quinta, avisou ao ministro Paulo Bernardo (Planejamento) que, se o governo federal quiser usar suas áreas para construir prédios públicos da própria União, tudo beleza. Mas, se quiser vender para empresas privadas, tem que passar pela Terracap, empresa pública com 51% do capital do DF e 49% da União. Por que vender direto para Constantino?
Arruda também chiou contra a intenção do Exército de vender um terreno de aproximadamente 500 hectares entre a Rodoferroviária e o Setor de Indústria, que viraria um novo bairro residencial para 80 mil pessoas. Para o governador, o projeto agride o Plano Piloto de Brasília, tombada pelo Patrimônio Histórico, e não prevê sistemas de água, esgoto e até viário na área. Na reunião, Arruda fez alusão à pindaíba das Forças Armadas, indagando se os militares não estão vendendo terrenos para fazer caixa. Bernardo - que tinha concordado no resto - deu um pulo: Ah, isso, não. E anunciou que o Orçamento da Defesa vai aumentar R$ 2 bilhões em 2008, sem contar R$ 800 milhões via PAC (Plano de Aceleração do Crescimento, que ainda não engatou a primeira).
Bernardo telefonou ao ministro da Defesa, Nelson Jobim, no mesmo dia. Misturar Nenê Constantino, Marinha, gabarito de prédio e bairro novo em Brasília não chega a ser nenhum caos aéreo. Mas pode dar uma baita dor de cabeça.

*

Alguns homens aprendem com seus erros. Este é o caso do governador José Roberto Arruda.
Ao renunciar seu mandato no Senado Federal, José Roberto Arruda foi para casa de cabeça erguida: tinha aprendido uma grande llição.

Ao ganhar a eleição em Brasília (com uma expressiva votação), tornou-se um político com espírito público.
Além disso, é responsável, arrojado, corajoso. Manda, decide, assume, faz.

Quem dera tudo funcionasse assim em Brasília!

OS "GRAMPOS " E AS BANANAS

CLÓVIS ROSSI

São tantas as anomalias que, no Brasil, passam por normais - e durante tanto tempo - que ninguém mais, ou muito pouca gente, ergue as sobrancelhas ante o escândalo, qualquer escândalo.
O mais recente de uma safra fartíssima é a possibilidade de que ministros do Supremo Tribunal Federal estejam sendo vítimas de escutas telefônicas. A revista "Veja" alçou o tema à capa de seu número em circulação. A Folha registrou-o, com alguns novos detalhes, no domingo, mesmo assim sem o destaque que uma situação como essa deveria merecer.
Não houve, até agora, uma repercussão, nos meios políticos, jurídicos, sociais, acadêmicos, digna da enormidade do escândalo.
Aí, cabem várias possibilidades, todas tremendas:
1 - Mentiram os ministros do STF que reconheceram para a revista seu temor de estarem sendo "grampeados".
2 - Os juizes do STF são chegados a delírios conspiratórios.
3 - (A hipótese mais provável) - O ambiente na capital da República tornou-se de tal forma degradado que mesmo os ministros da mais alta corte de Justiça da pátria entendem ser possível que haja "grampeamento" de seus telefones, ainda que não tenham provas.
Já houve, aliás, uma varredura, por empresa especializada contratada pela corte que apontou indícios de "grampo", mas seu resultado foi rejeitado pela Polícia Federal, que terminou por indiciar o dono da empresa por falsa comunicação de crime.
Um enredo tão rocambolesco só é possível em repúblicas bananeiras. Em que outro tipo de república um ministro do STF (Marco Aurélio Mello) se sentiria compelido a cuidados extraordinários para falar ao telefone sobre a herança de seu pai? Se é assim com ele, imagine cidadãos menos protegidos, mas cujas conversas possam interessar ou ao governo ou a criminosos.


*

Você já parou pra pensar da gravidade disto? É sério demais!
Para onde o Brasil está caminhando...

A QUEM INTERESSA?

Editorial da Folha de S. Paulo

Os criadores da nova norma que obriga as montadoras a embutir dispositivos antifurto nos veículos deram um golpe de mestre.
Conseguiram a um só tempo empurrar para todos os que comprarem carros a conta de um artefato que será usado apenas por alguns, e o ramo das seguradoras ainda tomou carona na lei para ampliar seu mercado potencial. A instalação do chip que permite a localização de automóveis roubados será obrigatória a partir de agosto de 2009 e constará do preço final do produto, mas o serviço que permite rastreá-los e bloqueá-los é um opcional pago, fornecido por empresas que operam em estreita cooperação com as seguradoras.
É o que as pessoas chamam de venda casada, e o Código de Defesa do Consumidor define como prática abusiva em seu artigo 39, incisos I e III.
É preciso tomar o cuidado de não confundir o dispositivo antifurto, aprovado por resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), com a placa eletrônica. Este outro chip (muito mais barato) também deverá um dia ser instalado nos veículos, mas serve para fiscalização -ou seja, tem, como as placas que lhe inspiraram o nome, uma função pública que o justifica.
A manobra que favorece seguradoras e atividades afins lembra muito o golpe do kit de primeiros-socorros, que todos os motoristas tiveram de portar entre janeiro de 1998 e abril de 1999. O patético conjunto de gaze, esparadrapo e luva de látex era inútil no caso de acidentes, mas fez a alegria dos fabricantes desses produtos, que venderam algo como R$ 480 milhões, em valores corrigidos pela inflação.
Espera-se que o dispositivo antifurto seja, a exemplo do kit de primeiros-socorros, fulminado o quanto antes. Cabe ao Contran disciplinar o trânsito, não criar oportunidades de negócios.


*

Mais uma "exigência" pra meter a mão no bolso do consumidor.
Recorrer a quem?

PRESIDENTE MANGALÔ

Cláudio Humberto

O corintiano Lula ganhou camiseta do Botafogo e o time desandou. Popó deu o cinturão e acabou, assim como Guga, que lhe deu uma raquete. A camiseta da Seleção que Roberto Carlos deu a Lula murchou a Copa. Ele ganhou a do Inter e o colorado foi desclassificado na Libertadores...

19 agosto 2007

FIDELIDADE INFIEL

DENIS LERRER ROSENFIELD

Só os "inocentes" podem acreditar que o atual governo e o PT estejam realmente preocupados em fazer uma reforma política

O governo, normalmente lento, apressou-se em fazer aprovar pela Câmara dos Deputados uma proposta de fidelidade partidária que termina legitimando o status quo. Desde o primeiro mandato, Lula e equipe têm fomentado a infidelidade partidária, com intuito de aumentar a base partidária de sustentação. Fizeram de vários partidos simples apêndices de seus fins particulares, desestruturando, ainda mais, a representação política. O propósito foi -e é- fazer do Legislativo uma mera caixa de ressonância do Palácio do Planalto.
Neste segundo mandato, o mesmo processo teve prosseguimento, com o enxugamento dos partidos de oposição em proveito de pequenos partidos que, assim, inflaram.
Diante desse descalabro, que se torna uma ameaça para as instituições republicanas, o TSE se posicionou contra a infidelidade partidária, atribuindo os mandatos parlamentares aos partidos, e não aos seus detentores individuais. Vingando essa posição, os parlamentares infiéis perderiam seus mandatos.
A decisão final está para ser proferida pelo STF. As indicações parecem sinalizar para uma confirmação da decisão tomada pelo TSE. Ora, perante essa nova situação, o governo, por intermédio do PR, um dos partidos favorecidos pela "inflação parlamentar", se apressou em fazer aprovar uma proposta de fidelidade partidária "flexível": uma verdadeira anistia.
Só os "inocentes" podem acreditar que o atual governo e o PT estejam realmente preocupados em fazer uma reforma política. Pelo contrário, tudo fizeram para que ela não ocorresse. Do ponto de vista público, no entanto, foi alardeado que a reforma política seria a "mãe" de todas as reformas, sua urgência sendo uma prioridade nacional.
Ora, ela não é mãe ou avó de nenhuma reforma, mas uma grande encenação que serve, demagogicamente, para mostrar que algo está sendo feito. A reforma tributária ou a trabalhista, por exemplo, não dependem minimamente da reforma política.
Contudo, nem tudo é uma mera distração para ocupar o espaço público. Primeiro, o foco deixa de ser as outras reformas. Enquanto a discussão sobre a reforma política persistir, as outras são transferidas para as calendas gregas. Segundo, enquanto a distração persistir, outros projetos políticos podem fazer o seu caminho, pois maior atenção não lhes será dada.
Dentre esses projetos, um merece particular destaque. O antigo Campo Majoritário e todas as mais importantes tendências petistas estão propondo uma assembléia constituinte exclusiva para a reforma política. O objetivo consiste em aprovar uma resolução no Congresso do PT, de modo que essa se torne uma posição oficial.
Ora, se nenhuma reforma política não foi feita nos últimos quatro anos e meio, é porque o governo e o PT simplesmente não a quiseram, pois tinham ampla margem partidária para isso, não necessitando dos votos dos partidos oposicionistas. Se faltassem, os mecanismos persuasivos da "infidelidade" estavam à disposição, como foram de fato usados.
Logo, podemos fazer uma singela pergunta: por que o súbito interesse em uma assembléia constituinte exclusiva para votar a reforma política? Não pode ser o objetivo alardeado de fazer enfim a "mãe" de todas as reformas. Isso simplesmente não faz o menor sentido. Coibir a corrupção tampouco o faz, pois o PT nem foi capaz de punir os seus elementos envolvidos nos vários escândalos. A sua comissão de ética tem tanta poeira quanto teias de aranha.
O seu propósito só pode ser partidário, o de encontrar uma fórmula que lhe possibilite preservar o poder.
O partido não tem, hoje, nenhum candidato competitivo para a próxima eleição presidencial. Isso não significa, evidentemente, que não possa criá-lo nos próximos anos. No entanto, dada a popularidade do presidente Lula, uma eventual reeleição, se fosse constitucionalmente permitida, seria uma grande probabilidade.
É nesse espaço que se insere a proposta de uma assembléia constituinte exclusiva para a reforma política. Ela poderia resolver facilmente o problema constitucional, alterando a Constituição graças a esse fórum especial.
A justificativa seria a de que assim o quis a vontade do povo, soberana para efetuar tal mudança. A mobilização partidária e dos ditos movimentos sociais apresentariam o enquadramento propriamente "popular", nos melhores moldes do ditador venezuelano de controle da participação política e dos cidadãos em geral.
Para um governo que acaba de ter um surto cubano com a deportação dos boxeadores, um surto chavista seria apenas uma conseqüência "natural", socialista.


*


O que será do Brasil?

O CAIXA TRÊS E O VOTO-CARNIÇA

NELSON MOTTA

Além dos milhões dos fundos partidários e dos horários eleitorais "gratuitos" -para eles, já que são pagos pelos contribuintes aos veículos, em forma de renúncia fiscal -, agora eles querem o "financiamento público" de suas campanhas: o caixa três.
Alguém acredita que a maioria dos políticos brasileiros respeitará os tetos de gastos e recusará ajudas "espontâneas" de correligionários e lobistas? Em muitas grandes democracias, as eleições têm financiamento privado, com regras e limites, e são limpas, fiscalizadas e equilibradas. As contribuições são rigidamente controladas e não interferem na alternância no poder. Por que eles conseguem e nós não?
Porque o problema não é o sistema, são os usuários. Aqui, a regra é não respeitar as regras: a impunidade parlamentar é a norma. Qualquer que seja o sistema, eles encontrarão sempre uma forma de driblar, com o jogo de cintura que os caracteriza, a lei e a ordem, em benefício próprio, mas sempre em nome do povo, do partido ou da causa.
Mas o maior dos atrasos, matriz de toda a perversão eleitoral, é o voto obrigatório. Alguém acredita que pessoas que votam à força, para evitar a multa ou perder a bolsa, possam escolher bons candidatos? Ou são esses que votam em qualquer um, ou nos piores, pela chateação de ter que ir à zona eleitoral?
Ninguém responde, só são contra e fazem contas: "isso vai favorecer a direita e as elites", ou então "isso beneficia a clientela da esquerda". É esse o nível da discussão. Todos disputam esses votos podres como urubus disputam carniças.
O voto-lixo é o que eles chamam de exercício da democracia, argumentando que, de tanto votar errado, o eleitor vai aprender a votar certo. É por isso que o Congresso está cada vez melhor.


*

O nosso voto tem sido voto-lixo?
Vamos refletir sobre isso.

ANTES DE NOVO DESASTRE

ELIANE CANTANHÊDE

Os maiores especialistas ainda não conseguem responder com segurança duas questões básicas: 1) a crise é grave e duradoura ou superficial e rápida?;
2) até onde pode atingir o Brasil?
A crise já ocupa as manchetes há uma semana, deixou claro que a expectativa de crescimento dos EUA vai cair e afetou as Bolsas e o dólar no Brasil, como, de resto, em todo o mundo, um mundo "globalizado", para o bem e para o mal.
Esse cenário não parece evoluir para recessão nos EUA e quebra de uma instituição de grande porte, gerando uma crise sistêmica, um castelo de cartas. O momento, porém, não é de tranqüilidade.
Aos trancos e barrancos, o Brasil aprendeu muito com quatro crises internacionais nos governos de FHC, as do México, da Ásia, da Rússia e da Argentina. Hoje, os indicadores macroeconômicos são mais sólidos e as reservas estão em US$ 160 bi. Mas há temor de reflexos no crescimento, nos investimentos e no comércio. Cerca de 30% das exportações são para os EUA. Se a economia americana cresce menos, o Brasil vende menos.
O que mais preocupa é a capacidade do governo Lula de gerir crises. Já imaginou se for com a mesma rapidez e competência do apagão aéreo? Até agora não se viu, ouviu ou leu sobre providências de Lula e da equipe econômica. Aliás, nem mesmo de meras reuniões de avaliação, algo elementar para evitar surpresas e correrias depois.
O Brasil soube todo o tempo da dimensão e dos solavancos da crise aérea, mas, dez meses e os dois maiores acidentes da história depois, o presidente da República declarou candidamente que não tinha noção da gravidade da situação.
Provavelmente, não tem televisão em casa.
Agora, o Brasil e o mundo estão sabendo e sentindo os solavancos da crise econômica. Espera-se que Lula não leve novamente dez meses para ver, ouvir, ler. Ou seja, para saber e agir antes de novo desastre.


*


Há desastre maior que a inércia de Lula?

UM PROBLEMA DE R$ 209 BI

CLÓVIS ROSSI

Do presidente Luiz Inácio Lula da Silva: "A turbulência americana não vai causar problemas ao Brasil".
Da consultoria Economática, conforme reprodução do site G1, das Organizações Globo: "As ações das grandes empresas brasileiras perderam 21% do seu valor, ou R$ 209 bilhões, nas últimas quatro semanas devido à crise no mercado financeiro internacional. Desde o dia 19 de julho, o valor das 316 maiores empresas da Bovespa caiu de R$ 1,003 trilhão para R$ 794 bilhões" (não inclui a queda de 2,5% de ontem).
Se o presidente acha que perdas de R$ 209 bilhões (e subindo) não são "problema", o que será que ele considera um problema?
Tem mais, sempre segundo a Economática/G1: "O Brasil foi o país que mais perdeu recursos entre os sete principais mercados da América Latina (México, Venezuela, Colômbia, Peru, Chile, Argentina e Brasil). Apesar de representar metade desse mercado, as empresas brasileiras respondem por dois terços (66%) das perdas acumuladas nesse período".
Como se vê, a "blindagem" da economia brasileira está sendo inferior à de economias muitíssimo menores e mais frágeis.
Menos mal que o presidente não é quem decide o que fazer na economia. Fia-se nos assessores, que, por sua vez, mostram regularmente que apenas seguem os tais mercados. Tanto que foram os mercados - e só eles - que fizeram o dólar primeiro cair bastante, a ponto de atrapalhar as exportações de alguns setores, e agora fazem o dólar subir.
O governo só espia.
Da inapetência do presidente para enfrentar problemas, dá prova (a milionésima, aliás) a frase sobre a crise aérea: "Acho que está resolvida em parte. Ele [o novo ministro da Defesa, Nelson Jobim] está há poucos dias no ministério, não dá para fazer tudo". Já Lula está há quatro anos, sete meses e 15 dias no cargo. Não viu o "problema"?


*

O pior cego é aquele que não quer ver.
Você está vendo o que está acontecendo?

EXERCÍCIO DE ADIVINHAÇÃO

FERREIRA GULLAR

Me pergunto se Lula está mesmo disposto a deixar o governo ao fim de seu segundo mandato


Ao contrário do PT, que só avaliza pesquisa de opinião quando ela o favorece, acredito que Lula conta mesmo com o apoio da maioria da população.
Houve um momento em que as pesquisas indicaram uma grande perda de prestígio do presidente da República. Foi no auge da crise do mensalão, quando o PT se cindiu e muitos petistas choraram no plenário da Câmara, envergonhados com o escândalo da compra de votos, dos dólares na cueca, das falcatruas no Banco do Brasil. A impressão que se tinha é que Lula e seu partido iam naufragar.
Não naufragaram. Embora as safadezas fossem evidentes e o próprio procurador-geral da República tenha apresentado denúncia ao Supremo Tribunal Federal, todos se safaram: Lula foi reeleito e o PT aumentou sua representação na Câmara Federal.
Não sei que conclusão tirar disso. As hipóteses são muitas e a pior delas é que o povo aceita a corrupção como fator inerente à política. É verdade, porém, que o eleitorado petista, fiel a seus líderes, confia neles cegamente e crê que todas as acusações são mentiras dos adversários.
Deve-se acrescentar a isso, especialmente no caso de Lula, o pesado investimento nos programas sociais, somado aos bons resultados da economia. O fenômeno se repetiu agora, após o apagão aéreo, que não abalou em um milímetro sequer o apoio do povo ao presidente. E com a agravante da tragédia que comoveu a nação, depois que Marta Suplicy e Guido Mantega tentaram fingir que a crise não existia. Parece verdade que, em Lula, nada pega.
Por isso mesmo, causou espanto a vaia no Maracanã, na abertura do Pan. Lula, convicto de sua popularidade, acusou o golpe, mas, imediatamente, os petistas levantaram a tese da conspiração, embora seja difícil acreditar que alguém possa levar 70 mil pessoas a vaiarem um presidente que elas amem. Lula e o PT sabem disso, mas não podem admiti-lo.
A tese da conspiração é conveniente, já que visa tornar ilegítima toda e qualquer manifestação popular contra Lula que, logo em seguida, forçando uma identificação com Vargas e Jango, sugeriu haver um golpe em marcha para pô-lo abaixo e ameaçou chamar o povão às ruas.
São fatos que causam preocupação. Confesso que estou sempre me perguntando se Lula está mesmo disposto a deixar o governo ao fim de seu segundo mandato. E não sou o único a se preocupar com isso. Quando o presidente era Sarney ou Itamar ou Fernando Henrique, ninguém supôs que eles armariam um golpe para continuar no poder. Mas Lula nos faz pensar nisso, por quê?
São várias as razões e a primeira delas é o fato de que ele se tem como o único verdadeiro representante do povo, vindo do povo, após 500 anos de história. Essa convicção contraria a hipótese de que tenha de deixar o governo. E para quê? Sair pelo mundo a fazer conferências não é a dele. Vai ficar em São Bernardo administrando as crises do PT? Ele deve se perguntar isso a cada noite, quando pousa a cabeça no travesseiro, antes de adormecer.
Aventam-se várias alternativas: Lula participaria da campanha para presidente em 2010, iria para os palanques com um candidato do PT ou, na ausência dele, apoiaria o nome de algum outro partido aliado, talvez do PMDB. Só que esse nome não existe, nem no PT nem nos outros partidos da base do governo. Marta se queimou e, se Nelson Jobim resolvesse o caos aéreo, Lula faria dele o candidato? Custa-me acreditar, e não creio que o PT aceite a vice-presidência em qualquer chapa que se monte. Digam o que disserem, o único partido em que Lula confia é o PT, no qual manda e desmanda. Só a eleição de um petista lhe garantiria a volta à presidência da República em 2014.
Se a situação é essa, como ficam ele e seu partido? Alguém imagina o PT e o Lula de novo na oposição, pregando bravatas e o respeito à ética? A cigana, quando leu para eles o futuro, nas cartas, só disse que um dia chegariam ao poder, mas não que teriam de deixá-lo.
Não posso adivinhar o que se passa na cabeça de Lula, mas não é de todo impossível que ele culpe a lei eleitoral por não contar com a vinda do salvador da pátria e, por isso, não permitir que ele se mantenha no poder indefinidamente. Em time que está ganhando não se mexe, dirá ele, valendo-se da filosofia futebolística, em que é doutor. Espero que não lhe dê na veneta chamar o povão às ruas para obrigar o Congresso a mudar a lei. Espero que se lembre de que treino é treino e jogo é jogo.


*

Lula no terceiro mandato?!
Pense nisso.

16 agosto 2007

EDUCAÇÃO PELA TV


Rosely Sayão


Uma leitora enviou um comentário a respeito dos roteiros das novelas. De forma resumida, ela diz que um tema onipresente são as tentativas de personagens centrais das tramas de prejudicar pessoas com quem convivem a fim de obter o que desejam. Esse não é um ótimo pretexto para pensarmos a respeito das influências da televisão na educação dos mais jovens? É inegável que a televisão produz efeitos importantes no comportamento de crianças e de jovens. Mas, em vez de demonizar o veículo, vamos pensar na amplitude desses efeitos para compreendermos melhor nossa tarefa de educadores.
Em primeiro lugar, precisamos reconhecer que tornamos a televisão um objeto indispensável na vida das crianças. Nós, que evitamos a todo e qualquer custo fazer imposições aos filhos, não titubeamos em tornar obrigatória a convivência deles com a programação da TV. Acreditamos que não haja escolha nessa questão, não é? Pois é bom ter clareza de que é uma escolha ter TV em casa ou não.
Mas julgamos que não ter é deixar os filhos em um mundo à parte, fora da realidade social e isolado dos colegas. Uma mãe que contou a um grupo de amigas que não tem televisão em casa causou perplexidade. Ou seja: os pais nem consideram mais a possibilidade de uma vida sem esse recurso. Esclarecido esse ponto inicial, podemos pensar em outro aspecto: como se dava a entrada dos mais novos no mundo adulto antes da presença da televisão como modo, talvez principal, de distração e de entretenimento em casa? De forma gradual e, principalmente, por narrativas e ensinamentos dos adultos e dos livros.
Cabia aos pais a tarefa de socializar os filhos, ou seja, prepará-los positivamente para a convivência social. Isso significava ensinar os bons modos, o respeito aos mais velhos, o cuidado com os mais novos, o uso delicado da linguagem, a obediência aos adultos, a discriminação entre o que é bom e o que não é, a solidariedade, o valor da verdade, as virtudes etc. Assim, o processo de formação já se encontrava em franco desenvolvimento quando os mais novos entravam em contato com características, digamos, menos nobres da humanidade. O mundo adulto já podia, portanto, ser julgado de acordo com as referências recebidas.
Hoje, a televisão introduz as crianças nos aspectos sórdidos do mundo adulto sem dó nem piedade. Desde cedo, antes de sua formação ter se tornado consistente, elas descobrem que pessoas usam a esperteza para se dar bem, que alguns políticos mentem e prevaricam, que o uso da virulência nas relações interpessoais é cada vez mais freqüente, que a busca do lucro é desmedida etc. E é assim, indefesos e sem condições de julgamento crítico, que os mais novos são socializados.
Isso só mostra a complexidade da tarefa dos educadores. Os adultos não podem ficar, como os mais novos, seduzidos e hipnotizados diante da televisão; precisam ser críticos e partilhar essa visão com os mais novos. Se a educação que a TV pratica é marcante, a nossa precisa ser mais.